De Aldo Nascimento
Se colocarmos um microscópio nas câmaras de vereadores e na Assembleia Legislativa, correremos o risco de não encontrar uma inteligência que saiba falar, por exemplo, de educação pública.
Ainda assim, a imprensa acriana, quando publica suas superficialidades sobre o ensino dos pobres, só ouve os políticos. Nos programas de entrevista, onde entrevistador e entrevistado cometem o milagre do monólogo, a presença desses homens públicos predomina como se a inteligência acriana estivesse encarnada neles.
Onde se encontra então nossa inteligência?
Evidente que os jornais
Página 20,
A Tribuna,
O Rio Branco e
A Gazeta pautam-se pela inteligência, por isso, por meio deles, tomamos ciência de que as datas mudam. A maior função social de nossos jornais é registrar datas.
Onde se encontra a inteligência acriana?
Se o tema de uma revista é educação pública, a inteligência pulsa nas universidades, nas escolas. Na Universidade Federal do Acre, a inteligência habita nos livros de uma
Olinda Batista Assmar, de uma
Maria de Nazaré Cavalcante, de um
João Carlos de Carvalho, de um
Carlos Alberto Alves de Sousa e de tantos outros.
Mas não só eles. É preciso registrar falas de nomes que vivem à margem do poder, do conhecimento institucional; pessoas que recebem salário mínimo e reinventam a vida em bairros esquecidos, em lugarejos isolados do conforto institucional. A inteligência acriana encontra-se em quem sofre.
“Visões... O governo edita uma felicidade coletiva que não existe na casa de Eunice Maria. O jornal, semelhante a papagaio de pirata, repete o que o dono manda. O entrevistador e o entrevistado monologam na TV. O político, o oráculo da imprensa, acredita pensar o Acre. Há anos, sinto o fedor de uma paralisia mental.
Acima de interesses partidários, de interesses pessoais, acima de verbas públicas, muito acima de políticos que falam bem de escola pública, mas matriculam seus filhos em escolas particulares, precisamos (pro)vocar a felicidade coletiva, precisamos despenar o papagaio sem voz própria, precisamos promover o diálogo entre entrevistador e entrevistado, precisamos questionar o oráculo da imprensa, porque eu acredito, como outros acreditam, que nesta cegueira que nos confunde exista clareza de “
Visões Amazônicas”.
Como aprecio a desobediência de um
Altino Machado. Como entendo as contradições de um
Antonio Stélio. Como me encanto com as palavras selvagens de
Leila Jalul. Como aprecio o humanismo de um
Guilherme da Silva Cunha. Como leio as inquietudes de um
Cláudio Porfiro. Como a simplicidade de uma
Toinho Alves questiona.
Por causa deles e de outros, justifica-se a circulação de uma revista que reflita de maneira irônica, sarcástica, profunda, desobediente, lúcida. Existe um Acre que não é burro e muito menos adulador.
...
Amazônicas”
O professor-doutor Carlos Alberto chamou-me para pensar uma revista. “
Visões Amazônicas”, Carlos deu o nome. O que penso sobre ela?
1. 52 páginas. Seu tamanho e sua imagem devem atrair o leitor. Diagramação deve ser absurdamente criativa e audaz. O texto deve estar a serviço da imagem. Tamanho de
Caras e papel de
CUT. Quero ver o texto dos doutores Carlos Alberto e de Olinda Batista em um salão de beleza, entre
pédicure e
manucure; em uma clínica de estética, entre limpeza de pele e drenagem linfática; em uma biblioteca pública ou no terminal urbano;
2. Fotos simétricas e assimétricas. Misturar regularidade com irregularidade. Harmonia de cores. Brincar com imagens;
3. Textos acadêmicos (populares) convergem com textos jornalísticos. Dados, números, gráficos. Matérias trabalhadas, pesquisadas. Textos objetivos com traços subjetivos. Textos com jornalismo literário, quem souber escrever. Ensaios. Artigos. Misturar gêneros textuais em um único texto. Entrevistas que não sejam monólogos. Resenhas. Poesia.;
4. Sem ser situação ou oposição, entrevistar homens públicos para provocá-los com inteligência, com ética, nada de insultá-los. PC do B e DEM, o mesmo peso. Tratá-los com respeito, provocá-los com respeito. (Des)cobrir vereadores, deputados. (Des)cobrir as câmaras e a Assembleia. Os homens públicos não importam, o que importa são suas ideias, se existirem;
5. Ouvir os que vivem à margem do poder. Ouvir os nativos. Ouvir os marginais. Ouvir os homens rurais, a vida acriana legítima das matas. Ouvir o interior do Acre. Ramais dizem mais que viadutos;
6. Refazer matérias de jornais, expondo precariedade, superficialidade. Matérias com breves artigos. Ouvir os que pensam nas universidades e nas escolas. Ouvir o poder para questioná-lo sempre. Sempre;
7. Uma revista autocrítica e, depois, crítica. Uma revista insatisfeita com o rebanho. Uma revista que não pasta. Inquieta como a insolência. Solene, só o inconformismo. Nada nos conforta, a não ser desobedecer ao conformismo de ideias prontas.
Passos iniciais foram dados. A temática, educação pública. Quando virá a revista? Antes de o messias chegar e antes de o governo da Frente Popular transformar o Acre no melhor lugar para você e eu morarmos, porque esperar muito cansa.