sexta-feira, novembro 12, 2010

Uma troca literária entre dois professores

Gleyson Moura, professor da escola estadual Leôncio Carvalho, realiza um projeto literário nesse espaço escolar, em Rio Branco, Acre. Ele pediu para eu comentar sobre o projeto depois de ler a matéria no sítio ac24horas. Li e questionei o projeto.

Depois, meu colega de profissão enviou algumas apreciações. Vamos a elas com meus comentários.

Há tanto por dizer que nem sei se caberá nesse espaço. Vamos, então, ao bom e velho sistema de enumeração.

1. Sempre gostei de um bom debate sobre literatura. Respeito as suas idéias e inteligência, por isso as provocações;

Gosto muito de uma boa provocação para que, neste caso, a realidade literária na escola seja repensada.

2. Concordo que o grau de teorização sobre literatura em nossas escolas é muito baixo, existem degraus pelos quais é preciso ascender. Mas, para isso, é necessário pensar estratégias que desenvolvam nos alunos o gosto pelo texto literário. Trazer para a sala de aula pessoas apaixonadas por literatura para compartilhar conosco dessa paixão, falar sobre seus textos (consagrados ou não), suas relações com nosso espaço vivido e sobre o processo de composição, pareceu-me uma boa estratégia. É um começo.

A leitura na escola acriana inexiste, professor não lê para seus alunos. Há anos, desde quando lecionava no Rio de Janeiro, de 1990 a 1992, eu lia bons romances para meus alunos. Após 20 anos de sala de aula, aprimorei minha forma de lecionar literatura. Hoje, realizo uma comunhão entre ótimos filmes e ótimos textos literários. E para isso, Gleyson, não basta só a paixão, é fundamental uma sólida e flexível base teórica.

Toinho Alves e outros que se acham escritores podem ser apaixonados, mas isso não basta, é pouco. Sem leitura de autores básicos, como Roland Barthes, Blanchot, Iser, Deleuze, Antônio Cândido, Anazildo Vasconcelos, Luís Costa Lima e outros, a paixão é vazia.

Imagine Toinho falar sobre medicina ou direito, imaginou? Se ele não está credenciado para falar sobre direito, por que estaria para literatura?

Outra questão. Para aluno apreciar a leitura, alguém deve ler para ele, é preciso haver uma referência. Para muitas classes sociais, a única referência como leitor é o pastor da igreja. Além de o professor ler em sala, em uma lugar adequado, ele deve partir de alguma escolas ou escolas literárias para manter sua interpretação.

Na escola Heloísa Mourão Marques, eu leio no auditório, onde existe o conforto do silêncio. Se desejamos despertar nos alunos paixão por leitura, por exemplo, ficcional, a escola deve exercitar a leitura em sala, e não alguns escolhidos de forma não muito criteriosa falarem sem base teórica sobre literatura.

Por que a Secretaria de Educação não realiza seminário entre autores consagrados e alunos? Toinho Alves faz parte do poder, é amigo do poder, ele poderia viabilizar isso, mas... Agora entenda: realizar encontros bienais.

3. Nesse ponto, pergunte aos seus alunos o que eles pensam a esse respeito.

Posso saber o que pensam, mas eu queria que a SEE possibilitasse escritores nacionais na escolas públicas. Construir viadutos custa mais caro.

4. Aliás, se estiver na cidade, gostaria de contar com sua participação, em nosso projeto, como avaliador, entre outros avaliadores que estou convocando (data provável em 06 de dezembro, ainda por definir); Senão, como visitante. Também gostaria de levar dois ou três grupos para apresentar para os seus alunos, como uma forma de treino;

Olha, deveria entrar, na avaliação escolar, apresentação de filmes relacionados à literatura. Depois, debates entre alunos e professores. A escola poderia ser um espaço para o cinema-livro. Quanto à minha participação, não sou o mais indicado. Quanto a meus alunos receberem algum grupo, tudo bem.

5. Obviamente, uma interpretação subjetiva deve ser apoiada por argumentos que a comprovem, e isso não tem deixado de acontecer no projeto que estou ajudando a coordenar;

Você diz mas creio que tais não têm base teórica. Li o que Toinho Alves fala de poesia, e eu só lamento.

6. Não se trata de nivelar ou de banalizar a literatura. Trata-se da fruição do texto literário, independente do autor pertencer ou não à grande literatura. Como disse Octávio Paz, "as redes de pescar palavras são feitas de palavras.";

Só pesca bem quem sabe pescar. Precisamos pescar, primeiro, teóricos literários para depois fisgar as palavras corretas, adequadas, apropriadas.

7. É necessário primeiramente conhecer o texto, para só então poder-se avaliar seu mérito ou desmérito. Seu valor literário independe da maneira como foi publicado;

É preciso haver o reconhecimento nacional para colocar tais autores no currículo escolar. Para eu conhecer o Acre, não preciso de pseudoescritores acrianos; posso entender o Acre por meio de Mário de Andrade, de Ariano Suassuna, de Milton Hatoum.

8. Sobre Gilles Deleuze, ainda estou lendo "A ilha deserta". depois falaremos sobre isso;

Não li "A ilha deserta". Sobre literatura, li alguns livros dele, por exemplo, "Proust e os signos".

9. Por fim, concluo que está na hora de ter o meu próprio blogue e parar de ocupar tanto espaço nos blogue dos outros.

Nada disso. Penso ser muito bom você colocar suas experiências profissionais. Quando ele estiver pronto, me avise para eu colocar no meu blogue.

Depois de minhas críticas, saiba que penso ser positiva a sua ideia. Discordo, mas respeito muito a sua iniciativa. Embora Toinho Alves não seja a pessoa mais indicada para falar de literatura para alunos, ainda sim, é válido.

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