Na foto, ator Grande Otelo representa o personagem Macunaíma. A locadora Tenny Vídeo tem o filme.
De Aldo Nascimento
De Aldo Nascimento
No Acre, depois que o Partido dos Trabalhadores (PT) e o Partido Comunista do Brasil (PC do B) ocuparam o Executivo e o Legislativo, entronizou-se a imagem de Plácido de Castro como herói do povo acriano.
Entretanto, quando percebemos a realidade sociocultural desta terra, não vemos uma gente pisando o chão com os ideais militarizados desse mito, ou seja, entre o herói forjado por burocratas do Estado e o imaginário popular, desalinha-se o laço.
A cultura popular, sabemos, não se encontra em quartel, não usa farda, não tem patente, isto é, a força da imaginação popular não é obediente à hierarquia inventada pela classe dominante. Da marginalidade do negro, a ginga do samba germina para se opor à elite nacional, que dança minueto com indumentária à francesa em 1920.
Por meio do marginal Macunaíma, o homossexual Mário de Andrade materializou a força invisível de nossa brasilidade. Se Plácido de Castro é sério, Macunaíma quer rir; se o herói do Estado é “revolucionário”, Macunaíma quer brincar, desorganizar, carnavalizar.
O estrangeiro
Mas de quem Macunaíma ri? Ora, como encarnação da cultura popular, nosso anti-herói ri do colonizador, representado pelo gigante Venceslau Pietro-Pietra, industrial estrangeiro que explora a terra brasileira.
O gigante tem espírito prático, segundo Jorge de Lima. Começou como mascate, regatão nas águas amazônicas, e termina ricaço, com palacete na rua Maranhão e com influência política. Casado com uma Caapora nacional, esse estrangeiro tem duas filhas brasileiras.
Por isso, quando o mandavam trabalhar, Macunaíma, índio da tribo tapanhuma, que significa negro, exclamava: - “Ah! que preguiça!”. Negro-índio, cafuzo, Macunaíma, porque não se submete ao capital estrangeiro, desmascara, por meio de seu riso sarcástico, quem domina.
Por isso, esse herói do avesso quer de volta a muiraquitã, pedra roubada pelo gigante Venceslau. Uma vez com esse objeto sagrado, ela tem o poder de tornar respeitado quem a traz consigo.
São Paulo
Na narrativa de Mário de Andrade, Macunaíma, para chegar a São Paulo, cidade de padre José de Anchieta, do racionalismo cristão, transforma-se em homem branco com olhos azuis.
Assim, se as caravelas europeias aportaram em terras primitivas, agora o primitivo chega à civilização quatro séculos depois. Na cidade, longe da natureza, o negro-índio fica enfermo. A civilização adoece. Modelada pela esperança messiânica e pelo aparelhamento colonial político-religioso, a cidade de Anchieta é doente.
Macunaíma é personagem-mito contra a cristandade, “contra Anchieta cantando as onze mil virgens do céu, na terra de Iracema”, porque esse anti-herói sabe que, “antes dos portugueses descobrirem o Brasil, o Brasil tinha descoberto a felicidade”, escreveu Oswald de Andrade em seu Manifesto Antropofágico.
Um comentário:
Estou lendo Macunaíma, realmente fantástico.
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