Em
29 de abril deste ano, o confronto entre policias e professores da rede
estadual de ensino do Paraná completou um ano. Na Praça Nossa Senhora de
Salete, no Centro Cívico, em Curitiba, Língua Portuguesa, Filosofia, História, Física,
Química, Sociologia, enfim, as disciplinas escolares fecharam seus livros para
lutar na rua contra o governo de Beto Richa, do PSDB.
Livros
foram lidos na faculdade durante anos para que, uma vez formado, o professor
enfrentasse policiais muito bem armados em um campo de batalha. O professor que
se formou em Sociologia, por exemplo, paralisou a escola para dizer na rua que
“a luta continua”.
Médicos
jamais saíram às ruas para gritar palavras de ordem e muito menos para apanhar
de policiais militares, mesmo porque o conceito de greve se encaixa perfeito no
hospital. Se uma unidade hospitalar para de funcionar, o sofrimento se
materializa rapidamente, causando colapso na sociedade. Esse colapso ocorre
porque o médico, bem diferente do professor, não vive da palavra, ou seja, não
vive da abstração. Sendo assim, o conceito de greve é muito adequado, visto que
a natureza do trabalho em hospital materializa-se no corpo, não em ideias. E
mais: caso pare sua atividade profissional, o médico não precisará repor suas
consultas.
Uma
pergunta: será que o professor pode chamar de “greve da educação” sabendo que
suas aulas serão repostas? Não seria mais lógico chamar de “férias
antecipadas”? Mais uma pergunta: se o ato de falar em sala de aula se distingue
do ato de agir em um consultório médico, pode a palavra de um professor parar a
cidade? Ora, quando o médico para de examinar seus pacientes, ele consegue
parar a cidade; no entanto, quando o professor para a escola, sua palavra não
causa nenhum colapso na cidade. E nós sabemos que a origem do conceito de
greve, que é anarquista, tem como finalidade última parar a cidade.
Dois
representantes do pensamento anarquista que executaram muito bem o conceito de
greve foram Mahatma Gandhi (1869-1948) e Martin Luther King (1929-1968). Com
esses dois exemplos históricos, um nos Estados Unidos e outro na Índia, o
professor, antes de paralisar suas atividades escolares, deveria abrir livros
sobre a história do pensamento anarquista para aprender que paralisar uma
escola não é fazer greve. Paralisar uma escola é, antes e acima de tudo,
antecipar as férias para depois ainda ter de repor o tempo das férias antecipadas.
No
caso dos professores do Paraná, houve ainda um adicional: apanharam feio de
policiais. O que houve há um ano com esses profissionais não representa nenhum
exemplo de luta pelo motivo de essa luta estar completamente errada como luta
da educação. O corpo docente encontra-se muito doente por causa do “parasita
sindical”. Esse corpo precisa se curar primeiro dele; precisa recuperar sua
força original de pensar a natureza de seu trabalho. Assim, uma vez curado desse parasita, o corpo
docente deve se levantar para que seus movimentos criem formas apaixonantes de
intervenções inteligentes e sensíveis no espaço urbano.
Aldo Bourdieu (língua.portuguesa@uol.com.br) é professor de Filosofia, de Sociologia, de Literatura, de Religião e de Língua Portuguesa.
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