terça-feira, março 13, 2007

Alunos, os meus

























Novos rostos. Mais um ano letivo escreve-se na lousa de uma escola pública.
São quase 20 anos lecionando e ainda entro em sala como se eu pudesse mudar não o mundo, mas a vida de alguns. São poucos, nunca gostei das multidões.
Entro em sala para ofertar aos meus alunos o melhor de mim, e esse melhor é afeto e exigência; disciplina e desobediência; ordem e caos. Entro em sala ainda com paixão e leciono por um único motivo: não desejo morrer.
Sim, se eu não lecionasse, já não estaria mais aqui, porque, entre quatro paredes, vivo o que a realidade me retira: sonhos, outras possibilidades, por exemplo, ele: o amor, e seu gesto pulsa na narrativa que lerei para os meus alunos às segundas-feiras, entregue ao silêncio em um teatro de escola.
Por mim e por eles, um livro lido para que a vida seja outra em nossas particularidades, em nossas intimidades. Assim, nossos olhos irão se debruçar sobre Lavoura Arcaica, de Raduan Nassar, para que, por meio da leitura - eu sei, ler cansa -, possamos renomear o amor, a paixão, a noção de ordem - valores que a realidade da rua desconhece.
Buscarei, tal qual um sacerdote, teatralizar o texto sagrado da ficção para que percebam a vida relida, mais vida entendida, sempre vida contada, muita vida acima da vulgaridade e da pobreza que nos cercam.
Quando o ano letivo chegar ao fim, só desejo que esses rostos nunca mais se esqueçam de mim, porque para isso também fomos feitos: ofertar a recordação de um homem apaixonado por sua profissão.