quarta-feira, abril 04, 2007

SemaNa SanTa, mAriA
























Nesta semana, no centro de Rio Branco, Maria, de 42 anos, pediu-me dinheiro para comprar arroz.
Não tinha ido ainda ao banco e, na carteira magra como Maria, havia um real.
Mas, antes de dar a ela um Deu seja louvado na cédula, entrevistei-a na praça José de Melo.
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A senhora conhece o Programa de Aceleração do Crescimento, o PAC?
Não.
A senhora tem o que comer hoje?
Na panela de casa, tem feijão.
Por que pede dinheiro?
Para comprar arroz.
Não vai comer peixe na Semana Santa?
É muito caro, moço.

Dinheiro faz falta, não é?
Faz.
Por falar em dinheiro, a senhora sabia que salário de ex-governadores do Acre, assim como Deus, é eterno?
Não.
A senhora carrega no rosto os traços do povo. Dona Maria, a senhora sabia que o povo acreano fez uma revolução?
Não.

Por que existe pobreza no mundo?
Porque Deus quer assim.

Deus é justo?
Não sei, moço.

Dei-lhe o dinheiro, e, na Semana Santa, Maria partiu.

Do professor Gleidson

Interatividade... pra quê?

Globalização. Tecnologia. Às vezes, a modernidade serve para nos lembrar o quanto estamos “involuindo”. Assistindo à televisão, certo canal interativo local que reserva parte de sua tela para uma janela de bate-papo, ponderei: o uso dos avanços da era da informação está facilitando alguns aspectos de nossas vidas, porém dificultando outros. Como? Vou citar um exemplo: Dando aulas particulares, uma aluna comentou que havia perdido pontos em uma redação por escrever como em chats: “não” grafara como “naum”, e “que” apareceu apenas abreviadamente, “q”.
Não estou propondo aqui um movimento pela escrita correta. A forma rápida como se dá a comunicação em salas de bate-papo exige um léxico próprio. A questão é que nossos pobres alunos implementam tais vocábulos no cotidiano como no exemplo citado, sem se dar conta. E esta problemática puxa outra: a forma como se ensina a língua portuguesa.
Lemos e escrevemos todo o tempo. Deveria então ser comum o enfoque na redação por parte dos profissionais que lecionam a língua pátria. Vários desses, porém, pré-julgam a criatividade de seus alunos como precária, e não a estimulam para serem producentes. Estes, por conseqüência, acreditam que em sua carreira de escolha não terão que se preocupar com essa deficiência. Por isso, não raro encontramos acadêmicos já quase concludentes, mas com um vocabulário tão rico quanto o de alunos de 7ª série.
Outro ponto fundamental é o da interpretação. Cegueira é, no mínimo, o termo a ser utilizado para caracterizar a condição da maioria dos alunos quando têm de obter o sentido de um texto. Precisamos “traduzi-lo” tal qual alguém que sabe ler o faz para um completo analfabeto.
Minha parte nisso? Bem, acredito que qualquer área depende do bom uso do português. Em matemática, o problema maior é justamente a transição do texto de uma questão para o modelo matemático, pois a partir daí fica claro como água. Como conselho, digo aos meus aluno que leiam, leiam, leiam, mesmo que seja uma bula de remédio ou uma revista em quadrinhos (que, aliás, leio desde os quatro anos e não me arrependo, foi fundamental para a compreensão que tenho hoje). Algo que os faça tentar entender o contexto. Isso ajudaria, sobretudo, no avanço do conteúdo, que poderia prosseguir sem o entrave da má interpretação.
Sugiro que se faça um esforço em prol de valorizar a leitura, interpretação e criação de textos, visto serem fundamentais para boa formação do discente não só no português, mas em outras disciplinas e no seu futuro profissional. Do contrário, este será apenas um: o de professor da linguagem de salas de bate-papo, a comunicação dominante no processo “involutivo”.