terça-feira, dezembro 08, 2009

Até quando eu retornar


A partir de hoje - a não ser em caso extraordinário -, não atualizarei este blogue até 30 de janeiro de 2010. As férias só permitem descanso, curtição, deixar rolar, preguiça, mãe, pai, amigos, primos, primas, mar, montanha. Mony.

Assim sendo, nesta última atualização deste ano, dedico meu texto a meus alunos, a esse pessoal que me suportou, que não teve preguiça em sala de aula, que teve preguiça, que se dedicou até o último momento, que não se dedicou ao último instante.

Estudar, sabemos, é árduo, porém também transformamos os estudos em uma brincadeira de gincana do conhecimento.

Muitos aceitaram o desafio de eu ser um (risível) obstáculo. Esses não desistem. Quanto mais dificuldades, mais se superaram. Outros, acarinhados pela preguiça, pelo desinteresse, pela falta de vontade, entregaram-se ao descaso, à derrota, esperando de minha parte o relaxamento, a facilitação ou um tipo de corrupção silenciosa que permitisse a aprovação de todos.

Enganaram-se. Há 20 anos, eu leciono e, até hoje, sou um tarado pela sala de aula. Podem falar tudo de mim, tudo, menos que eu não tenho a paixão indomável de lecionar. Já disse: leciono para não morrer. A sala, você viram, foi o espaço onde eu encenei a ordem e a desordem, a lucidez e a loucura, o sério e o cômico; foi o lugar onde sou mais humano, onde rio de mim, de ti, de nós. Mais tarde, após anos lecionando, eu descobri: a sala é o lugar sagrado e profano onde sou quem aprende primeiro.

Assistimos a "Jeca Tatu" para depois anotar três cenas e interpretá-las. Apreciamos "Tapete Vermelho". Refizemos textos. Lemos, mais e mais, interpretamos "O Navio Negreiro". Debruçamos nossos olhos sobre os versos de Cruz e Sousa. Entendemos a letra do Rappa e, no segundo momento, nós relacionamos à poesia de Castro Alves. A gramática só surgiu por causa da produção textual. Lemos "Auto da Compadecida".

Antes, lemos "Auto de São Sebastião" e, entendida a peça de José Anchieta, soubemos que no século 16 o poder da Igreja deformaca a cultura indígena. Lemos poesias. Aprendemos o poder da metáfora por meio do sensível filme "O carteiro e o poeta".

Busquei mostrar a vocês a beleza da cultura popular por meio do caipira, nossa identidade nacional. Lemos sobre o riso em um fragmento de texto do romance "O Nome da Rosa".

Faltei pouco. Falei muito. Repeti mais ainda: anote, anote, anote.

E quantos ótimos alunos o destino apresentou a meus olhos. Jovens humildes, problemas em suas casas, discriminados, mas com um espírito à altura da superação. Diante deles, preciso melhorar sempre. Sempre. São nomes que desejam mais saber. Alunos que sabem contestar. Inquietos.

Se eu pudesse ofertar a cada um de vocês um livro, ofertaria "Fernão Capelo Gaivota", de Richard Bach. Que o voo seja alto para que, quando você mergulhar, busque o peixe no fundo do mar, o melhor. Não se limite a comer o peixe que o pescador lança à superfície das águas. Não comam o que o bando come, porque a beleza da vida não está na superfície e muito menos no que os vulgares fazem. O melhor alimento habita no fundo, lugar onde poucos tocam.

Mas saiba que voar mais alto para chegar ao fundo exige esforço, erros, tentativas, porém é isso que nos eleva à condição de humanos. Supere-se! Seja melhor que seus pais e permita que seus filhos sejam melhores que você.

Navegamos melhores em mares revoltos. Em lagos, onde a água é calma, nada é exigido de nós, a não ser acomodação. Leia narradores que inquietam teus olhos, que perturbem a tua estabilidade. Proust. Lispector. Virgínia. Leminski. Raduan Nassar.

Leia bons livros. Releia-os. Assista a ótimos filmes. Ame as boas amizades, as que exigem de você o melhor de ti. Deixem a TV também no canal Cultura. Namorem para que possam ser melhores do que são. Amem!!! Aprendam que a Paixão não é algo passageiro - há 20 anos, sou apaixonado pelo ato inquietante de lecionar.

Leia Fernando Pessoa. Drummond. Mário Sá-Carneiro. Seja um leitor assíduo da vida. Afaste-se das palavras doentes das ruas. Leia o que eu não li. Obedeçam na hora certa. Desobedeçam na hora incerta. "A desobediência também tem seus direitos", grita André, protagonista de "Lavoura Arcaica".

Um beijo em seus destinos. Um abraço fraterno em suas vidas.

Sou apaixonado por vocês!!!

Os referenciais da Secretaria de Educação

No dia 7, participei do encontro entre professores de Literatura (Língua Portuguesa) e não assinei o documento que aprova os referenciais porque eles não foram dicutidos no encontro. Há uma questão sobre historicismo, apresentada pelos professores da escola Glória Perez, que não entrou em questão.

Em uma próxima reunião, se houver esse debate, se houver certas considerações, o documento poderá ser assinado.

Semestralidade

No Acre, alguns jornalistas e o senso comum acreditam que o poder concentra-se em assmbleias legislativas ou em câmaras de vereadores, ou seja, acredita-se que o poder é físico, é matéria; manifesta-se em prédios ou encarna-se em deputados ou em vereadores.

Ainda pensamos o poder como se fosse a imagem visível de O Príncipe, de Maquiavel, pensamento de 1513. Longe dessa concepção de poder, a escola surge em Vigiar e Punir, de Michel Foucault, pensador que nos fala de outro poder que nos modela.

Hoje, conversando colegas de profissão, afirmei que a escola pública se põe acima de interesses corporativistas. Opondo-se à minha fala, uma professora afirmou com tom irônico que busco tanto o melhor para o aluno que defendi a semestralidade. Não entendi a relação; porém, ainda assim, esforçar-me-ei para explicar.

Semestralidade
Hoje, leciono em duas turmas na escola Heloísa Mourão Marques. Em uma, há 33 alunos; na outra, 30. No diário, há, entretanto, 50 nomes. Ao todo, corrijo 63 redações em sala por meio da refacção ou da reconstrução textual. Caso opte por duplas, são 31 redações.

Como eu reconstruo os textos de meus alunos (com eles) em sala de aula, melhor essa cansativa refacção com 31 redações. No entanto, sem semestralidade, seriam quatro turmas, isto é, 126 redações.

Sem semestralidade ou com semestralidade, a carga de Literatura (Língua Portuguesa) limita-se a 160 horas-aulas e, desde que saibamos colocá-la na semestralidade, a quantidade de aula é a mesma se fosse anual, se não houvesse semestralidade.

Defender a semestralidade é, portanto, qualificar o ensino-aprendizagem de produção textual para quem reconstrói texto em sala de aula com os alunos. Em 2010, com o fim da semestralidade, lecionarei para 126 alunos, não mais para 63. Uma solução, talvez, seja criar duplas para que produzam e reconstruam seus textos.

Sinceramente, professora, não entendi a sua colocação de tentar, talvez, me constranger diante de colegas de profissão. Penso que o caminho para melhorar o ensino público não seja jogar palavras inconsequentes e direcionadas a uma pessoa em momento inadequado.

Defenda ideias, professora, com raiva, com choro, com gestos intensos, gritando, socando a mesa, não importa a aparência, a forma, a maneira de defendê-las, mas defenda ideias. Defenda-as!!! para qualificarmos o ensino público e não para prolongarmos o feriado.

Tenho defendido ideias, eis algumas:

1. Conselho de disciplina;
2. Conselho de turma;
3. Atividades lúdicas na escola (gincana do conhecimento);
4. Alunos exemplares avaliarem os professores;
5. Coordenador assistir às aulas de professor;
6. Não é o professor que deve escolher a turma para lecionar, mas o aluno é quem deve escolher o professor com quem deseja estudar;
7. Se o professor lecionou para o primeiro ano do ensino médio, ele deve acompanhar essa turma até o terceiro ano;
8. Por mérito profissional reconhecido, as coordenações deveriam ter um professor de Língua Portuguesa e um de Matemática.

De forma clara, em uma reunião de professores, diante de todos, defenda ideias.

Professora, o que a senhora defende?

domingo, dezembro 06, 2009

Feijoada modernista














Em "Macunaíma", Mário de Andrade
pintou a iguaria como síntese das identidades nacionais

CARLOS ALBERTO DÓRIA
ESPECIAL PARA A FOLHA

Feijoada acaba com a gente. Por isso o dia é sábado, quando se pode jiboiar. Mas, dizem, foi inventada por escravos. O paradoxo: escravos trabalhavam de sol a sol, como criariam coisa indigesta por vontade própria?

Comiam mesmo o pão que o diabo amassou; não podiam contribuir para a dieta nacional. "Contribuição" supõe liberdade; sem ela não há criação literária ou culinária.

A feijoada deriva do "feijão gordo" enriquecido ao extremo, a ponto de se tornar prato único. Ela só é compreendida dentro do seu ritual: feijão preto e pertences, a caipirinha de cachaça (moeda líquida do tráfico negreiro) e a evocação histórica da nacionalidade. A minifeijoada de boteco na quarta-feira retroage, volta a ser feijão gordo.

No final do século 18 carioca, a alimentação dos escravos estava lastreada em feijão preto, farinha de mandioca, laranjas e bananas; além das carnes secas ou toucinhos que os próprios negros podiam comprar com o produto da venda das suas hortaliças. A origem deve ter sido essa.

Mas, um século depois, ela ainda não era um "prato completo", segundo o folclorista Câmara Cascudo [1898-1986], que sugere que ela se difundiu como tal em hotéis e pensões.

Foram os modernistas que projetaram a feijoada como prato nacional. Eles tinham necessidade enorme de novos signos para a brasilidade.

A questão estética e política era "acharmos a nossa expressão" em vários planos, e nada melhor do que o popular feijão, a evocação do cozido português, dos embutidos e pedaços de porco, além da couve.

Mário de Andrade, em "Macunaíma" (1928), desenhou uma cena imorredoura: a feijoada na casa do fazendeiro Venceslau Pietro Pietra. Uma alegoria da cozinha nacional e daqueles seres étnicos que o Brasil colocou em contato.

O festim é presidido por Venceslau (peruano, italiano, Piaimã), um demônio devorador de gente ou "comedor de identidades", conforme interpreta a crítica literária.

O tema da antropofagia, da deglutição cultural, esteve presente em toda a produção modernista, e a feijoada é um caso particular seu.

Esse festim de "Macunaíma" foi magnificamente carnavalizado no filme homônimo (1969), de Joaquim Pedro de Andrade.

E a graça da evocação continuou com Vinicius de Moraes ("Feijoada à Minha Moda"), que ensinou, em versos engordurados, como fazer uma feijoada sabática.

Ingredientes
O feijão é coisa quase universal. Mas, enquanto o preto e o rajado "igualam" as classes sociais, o fradinho e o jalo diferenciam preferências de ricos e pobres. Feijão preto é dominante somente no Rio de Janeiro e no Rio Grande do Sul. O tempero relevante da feijoada é a propriedade metonímica de reter o passado de escravidão na cor do feijão, subvertendo o seu sentido.

Dentro e no entorno, a feijoada congraça índios, negros e brancos, esquecendo que se comiam: uns foram dizimados, outros feitos escravos; outros, sempre colonizadores cruéis.

A feijoada, como alegoria, é o substrato alimentar da irmandade mística dos contrários -a nação mestiça-, desejada e vista como original do Brasil desde "Casa-Grande e Senzala" (1933), de Gilberto Freyre.

Coisa de intelectuais, estamos entendidos.

E nada mais "cabeça" do que a "Dialética da Feijoada" (1986), de Renato Pompeu, com o prato feito metáfora das relações de classe e da dependência diante do imperialismo.

Como ele escreveu, "consagrada pela intelectualidade influenciada pela industrialização, [ela] tem de enfrentar outros pratos simbólicos, e a sua afirmação como prato nacional-popular tem de ser considerada ainda um processo em andamento".

Joãosinho Trinta, o carnavalesco, poderia reformular sua frase célebre: "Quem gosta de pobreza, e da riqueza da feijoada, é intelectual".

Porque pobre celebra mesmo com churrasco de boi, a carne dos ricos, e cerveja. Assim, as classes sociais se devoram, de modo cruzado, à mesa. Da deglutição restam, incólumes, só os ossos do ofício e os do rabo do porco.

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CARLOS ALBERTO DÓRIA é sociólogo,
autor de "A Formação da Culinária Brasileira" (Publifolha), entre outros livros.

sábado, dezembro 05, 2009

A política de um âncora

Nada contra sua pessoa. Nada. Incomoda-me por ser uma questão pública. Vereador de Rio Branco, Astério Moreira desde 21 de setembro aparece como âncora do programa "Boa Tarde Rio Branco, da TV Rio Branco, transmitindo um misto de cenas policiais com encenações políticas.

Um âncora-vereador que surge todo dia nas casas de milhares de tele-eleitores. Trata-se de uma sutilíssima campanha politica. Nesse caso, o que importa é projetar a imagem diária, massificá-la, porque, depois, nas eleições, a imagem ressurge como candidata a deputado estadual. Urnas e audiência confundem-se.

Contra a lei? Não assisto a isso como sendo ético. Meu Brasil...

Mony, uma Viagem

Mony, 22 anos, uma jovem que o senhor Destino colocou em minha pele. Belíssimo ser humano que tem ofertado à minha idade a paz.

Quase cinco unidos e, entre nós, uma amizade amorosa que permite a mim viver. Sem ela, não haveria férias, tudo seria cansaço.

Começamos a preparar as malas. Viajar, mal sabe ela que a viagem é ela.

Mais uma vez, nossos corpos pousarão no Rio de Janeiro, cidade das balas perdidas, da favelização, das praias poluídas (menos Barra, Recreio e Grumari), a minha Cidade Maravilhosa.

Mas ficaremos do outro lado, Niterói, praias limpas (menos as que ficam na Baía da Guanabara), por exemplo, praia de Itacoatiara. Para ser mais exato, ficaremos em Maricá, perto de Saquarema. Neste ano, conduzirei minha amada a outros ares, Araruama, Arraial do Cabo, Cabo Frio, Búzios; em outro momento, Parati e Petrópolis.

Viajar com quem amamos... bem-estar, hummmm!!! Mas o Rio de Janeiro não se reduz a montanhas ou a praias. Mony assistirá a ótimos filmes e a peças de teatro,

e eu assistirei à Mony.

sexta-feira, dezembro 04, 2009

Mala para a Viagem














Começo a preparar as malas. Nela, levarei Cinzas do Norte, de Milton Hatoum; Caim, de Saramago; e um ensaio que ainda não escolhi. Também colocarei roupas.

Abraçarei minhas férias como se abraça um amigo.

quinta-feira, dezembro 03, 2009

Blogue ao Márcio Chocorosqui

"Bem, caro Aldo, tenho lido o seu blogue. Belas palavras são ditas aqui. Mas não deixo de fazer uma ressalva a essa postagem, quando você cita a Profª. Laélia. Não a vejo tão defensora da história da literatura. Com ela conversei mais sobre estética da recepção, entre outras coisas. Outra ressalva: José Guilherme Merquior, que você também cita, escreveu o livro “De Anchieta a Euclides — Breve história da literatura brasileira”, de 1977. Talvez ele tenha mudado de ideia."

Márcio, antes de mais nada, quebrei todos os espelhos de minha casa. Todos. Não preservo nem a minha imagem. Neste espaço virtual, onde minha liberdade é lida, defendo ideias, e elas não são refletidas em espelhos.

Citei a professora-doutora Laélia por ser parte de uma elite que deveria problematizar a literatura na educação pública por meio de inquietantes artigos publicados, por exemplo, em um blogue. Assim como outros, ela formou professores segundo uma concepção de literatura, no caso, Márcio, historicismo literário.

Digo-lhe isso com toda propriedade, porque, antes de "ser exilado" da Faculdade de Letras da Universidade Federal do Acre, recolhi todos os planos de curso do corpo docente de Literatura. Todos. A professora-doutora Laélia deixou as marcas do historicismo literário em seus planos. Estão lá.

"Com ela conversei mais sobre estética da recepção", você escreveu. Se você conversou, bem, estética da recepção, eu li em minha graduação, 1986, mas a Teoria Literária segue outros passos em 2009. O relógio biológico da professora atrasou-se.

Não digo que a estética da recepção encontra-se superada, longe disso, mesmo porque a Nova Crítica ou o Formalismo Russo podem orientar o professor de Literatura em uma escola pública; digo-lhe que, se a professora-doutora Laélia conversou sobre estética da recepção com você, mais uma vez, na condição de intelectual, ela não se antecipou ao tempo. Hoje, em 2009, a Teoria Literária se pensa de outra forma.

Quanto a José Guilherme Merquior, Márcio, esse pensador brasileiro publicou em 1977 De Anchieta a Euclides - breve história da literatura brasileira - para se contrapor aos livros didáticos da época embora tenha mantido uma história linear em suas páginas, mas o livro é profundo, problematiza. Ainda que submeta a literatura à história linear, Merquior supera o historicismo.

No Rio de Janeiro, no lugar do livro didático tradicional, já se lia no final dos anos 70 esse livro de Merquior. Acredito que você ironizou sem conhecimento de causa. Merquior, diferente de nós, foi precoce, um gênio. Em 1975, ele escreveu em Os Cadernos da PUC-RJ (primeiro encontro nacional de professores de literatura) um ensaio com o título "Comentário a 'Considerações sobre o Estudo e o Ensino de Literatura Brasileira''', onde critica o historicismo literário.

Sabe, Márcio, a tese de doutorado da professora Laélia encontra-se sepultada em uma biblioteca. Lê-la depende de uma exumação. Não digo isso para depreciar sua tese, entenda, não é isso, se fosse, eu escreveria, digo isso para afirmar que Altino Machado, que não é doutor, sem nível superior, intervém mais na realidade social do que certos doutores. Seu blogue incomoda. A palavra em seu blogue vive, circula. A tese de um professor de Literatura representa um título, às vezes, indiferente à realidade da escola pública.

Precisamos incomodar o poder (se é que isso é possível). Precisamos apresentar outras falas, outros textos. Como diz Marcelo D2, "vamos fazer barulho, porra". Certos doutores não fazem. As teses não circulam entre nós. Quem fará a exumação?

Conflito de ideias em águas rasas

Na segunda-feira, a Secretaria de Educação do Estado do Acre proporcionará um encontro entre professores de Literatura e de Língua Portuguesa para que os referenciais curriculares sejam refeitos, legitimados e aprovados.

Nas escolas públicas, o corpo docente reuniu-se para concordar e/ou discordar a respeito. Com dois colegas de profissão, um professor discrepou quando escreveu que “o texto deixa margem para uma interpretação de ensino historicista de literatura, não deixando claro que a ênfase deve ser na produção de sentido, ao invés da simples listagem das características dos estilos literários”.

Para sua justificativa, retirou este trecho dos Cadernos de Orientação Curricular da Secretaria de Educação: “Leitura, análise e comparação de textos com função literária, considerando contextos de produção em espaços e épocas distintos (Idade Média, Humanismo e Classicismo / Barroco, Modernismo e Contemporaneidade):”

Retirar um pedaço de um todo textual para afirmar que “o texto deixa margem para uma interpretação de ensino historicista de literatura, não deixando claro que a ênfase deve ser na produção de sentido, ao invés da simples listagem das características dos estilos literários” é, repito, mutilar o todo.

O trecho retirado dos cadernos não se encontra isolado, ou seja, o trecho retirado não “deixa margem para uma interpretação de ensino historicista” porque não se trata de “texto”, mas de um fragmento do texto. Retalham o texto e, a parte retalhada, os senhores a chamam de “texto que deixa margem”. Ora, não se trata de “texto”, mas de um pedaço do texto.

A coisa em-si disse pelo todo textual. Um trecho isolado passou-se como todo. A parte é o todo. Ora, senhores, quem leu o todo, o texto, não a parte como o todo, sabe que os Cadernos de Orientação Curricular da Secretaria de Educação sepultaram o historicismo literário. As partes entrelaçadas, ou seja, o todo, explicitam isso. Texto não é parte isolada, mas partes que se combinam, formando, aí então, o todo.

Não leram o texto, por isso a parte lida arvora-se de todo. A folha fala como se fosse árvore.

Sou apaixonado pela estética Barroca. Belos versos estes de Gregório de Matos e Guerra:

O todo sem a parte não é todo,
A parte sem o todo não é parte.
Mas se a parte o faz todo, sendo parte,
Não se diga, que é parte, sendo todo
.

A maioria, o todo, concorda com o “texto deixa margem”. Eu, a parte, discordo. A gestora diz que a parte deve se submeter ao todo no dia 7 de dezembro.

Antes, lerei Nelson Rodrigues.

quarta-feira, dezembro 02, 2009

O Haiti é aqui















Presos do pavilhão J dizem que foram torturados

De Nayanne Santana

Os detentos que cumprem pena no pavilhão J enviaram aos jornais uma carta que denuncia maus-tratos no presídio Francisco D’Oliveira Conde

Segundo a carta, enviada à reportagem da TRIBUNA digitada, os detentos estão reivindicando a visita do diretor do presídio e de representantes dos direitos humanos para contarem o que passam no local.

“Constantemente, somos vítimas das mais variadas agressões de alguns agentes penitenciários. Alguns deles veem trabalhar embriagados e até drogados. Chegando aqui, eles nos espancam, sendo fato diário e ainda se apossam de pertences deixados por nossas famílias. Há médico e dentista, mas não há medicamentos”, relatam os detentos.

Os detentos revelam na carta que vivem momentos de terror e que, depois de serem aconselhados por um policial militar, decidiram constituir uma comissão formada por 20 detentos que estão no pavilhão J para conversar com o diretor, mas, antes de chegarem à sala, eles passaram por maus-tratos.

“Ao nos apresentarmos como membros da comissão, fomos levados para um corredor (corredor polonês) onde nos aguardavam vários agentes penitenciários. Neste lugar, passamos por uma sessão de tortura por mais de uma hora. Socos, chutes, cassetetes, cuspe na cara, pancadas na cabeça e nos testículos e choque elétrico. Alguns estão gravemente feridos com costela quebrada e o corpo tomado por hematomas”, contam os presos.

Na carta, eles revelam que a informação de que teriam cometido um motim na segunda-feira, dia 30, foi forjada para justificar as marcas de torturas que sofreram no “corredor polonês”.

“Aqui, têm pessoas gravemente feridas devido à sessão de tortura e de espancamento a que foram submetidas. Para evitar que nossos familiares e a sociedade tomem conhecimento de tal fato, nos proibiram de receber visitas e ainda nos acusam mentirosamente de motim e de tentativa de fuga para, quando o fato se tornasse público, ter um argumento para justificar a tortura e o espancamento, os hematomas e os ossos quebrados em nossos corpos”, denunciam.
Por fim, eles pedem que as autoridades locais tomem providências em relação ao caso.

“Pedimos socorro às autoridades, Ministério Público, Direitos Humanos. Somos seres humanos e, como qualquer pessoa, cometemos erros e, por isso, estamos aqui. Queremos cumprir a nossa pena de acordo com a lei. Pedimos socorro às autoridades para que medidas sejam tomadas, para que possamos ter um tratamento, se não for digno, pelo menos mais humano. Nos ajudem!”, clamam os detentos do pavilhão J.

O outro lado
A reportagem da TRIBUNA entrou em contato ontem, à noite, com o diretor do Instituto Penitenciário do Acre (Iapen), Leonardo Carvalho, que disse desconhecer as denúncias.

“Estou sabendo dessas informações agora, mas posso garantir que, se houver algum tipo de tortura dentro do complexo, nós vamos averiguar”, certificou Carvalho.

Para ouvir as denúncias sobre as torturas de agentes penitenciários, a reportagem tentou entrar em contato com o presidente do Sindicato dos Agentes Penitenciários do Acre (Sindap), Adriano Marques, mas o telefone do representante da categoria não foi encontrado. A informação que a reportagem recebeu foi que o presidente do Sindap estaria de plantão na penitenciária, por isso não era possível contato.

A Finlândia não é aqui

"Não!", interrompeu Alfons Tallgreen, 13 anos, ao ouvir que o finlandês, sua língua materna, tinha raízes semelhantes às da língua russa.

"O estoniano, o húngaro e o finlandês são línguas correlatas. Aconteceu assim: primeiro, o finlandês começou a ser usado no sul da Finlândia e, aos poucos, foi ganhando o norte do país", conta o menino ruivo, aluno da 7ª série da Itäkeskus, em Helsinque, capital da Finlândia.

Apesar de já conhecer a história de sua língua, Alfons quer, no futuro, estudar as propriedades de plantas e micro-organismos. Pausadamente, explica que sua vontade inicial era ser dentista - a mãe o demoveu da ideia. Porém, já estava interessado em biologia nessa época.

"Estava pesquisando a floresta aqui do lado da escola. Mas infelizmente as árvores serão cortadas para a construção de casas de madeira no lugar", diz.

A escola em que Alfons estuda tem o foco específico em línguas. Ali, os alunos têm a opção de estudar diversos idiomas. É o caso de seu colega, Muaad Hussein, cuja família tem ascendência libanesa. Com a mesma idade de seu colega, o menino já conhece cinco línguas: árabe, sueco, italiano, francês e finlandês, além de entender também um pouco de espanhol.

"É claro que nem todos os alunos se interessam assim. Alguns não querem nem ouvir os professores. Não pensam no futuro", desabafa.

Muaad tem razão. Ali, na Finlândia, os meninos e meninas são iguais a todos os outros no mundo: não gostam de escola, adoram o videogame, o computador, andam de skate em praças e passeiam em grupos pelos shoppings. O que leva, então, o país a ser sucessivamente o primeiro colocado nas avaliações do Pisa? Na última edição, que avaliou ciências, a média finlandesa foi de 563 - o Brasil alcançou 390 (52º de 56 países).

Um documento do próprio Ministério da Educação, criado para apresentar o sistema educacional finlandês a estrangeiros, começa a responder à pergunta. Logo no começo, há uma advertência: o sucesso só pode ser explicado em função de uma conjugação de fatores, e não por uma única ação.

A primeira razão, diz, é que a sociedade finlandesa valoriza a educação e, portanto, tem uma atitude muito favorável à área. Os números dão subsídio à frase que, aparentemente, não diz muito: aproximadamente 75% dos adultos entre 25 e 64 anos têm diploma de ensino superior. Na Finlândia, o ensino é obrigatório dos 7 aos 16 anos - em outras palavras, cursa o ensino médio quem quer. Mas apenas 1% dos estudantes da chamada escola "compreensiva" (equivalente ao nosso ensino fundamental) não continua os estudos.

Ser professor
Muito dessa atitude favorável à educação provém de uma cultura desconhecida em terras brasileiras. Na Finlândia, o professor é visto com respeito - profissionalismo e responsabilidade envolvem a profissão. Há um componente histórico nessa valorização: há cem anos, quando o país ainda se configurava como nação, a pobreza reinava, principalmente no interior.

Ali, quem tinha um diploma de professor era tratado como se fosse rei. Foi esse o relato de um membro do Conselho Nacional de Educação Finlandês, Reijo Laukkanen, em entrevista à Educação na edição 150.

Hoje, é menos reverenciado, pois divide o conhecimento com profissionais de outras áreas. Mas nas ruas de Helsinque é possível perceber a atmosfera positiva que o envolve. Enquanto espera em frente à famosa loja de departamento Stockmann, Sari Nummila, 41, mãe de dois filhos, é categórica: "o que posso dizer? Nós precisamos deles. Ficaria feliz se um dos meus filhos se tornasse professor", diz.

Lea Itoonen, 56, mãe de três filhos e voluntária da Cruz Vermelha Internacional, diz estar satisfeita com a educação que recebem na escola. Só tem uma reclamação: antigamente, os professores tinham personalidade mais forte. "Gostaria que eles não apenas fossem um agrupamento excelente, mas tivessem mais atitude, enfrentassem os pais e o governo por melhores salários", relata. Mas, de qualquer maneira, diz: "é uma profissão bonita para se ter aqui".

Mesmo entre os mais jovens, a percepção não se altera. Annette Backman, 21 anos, tem inclusive uma amiga que quer ser professora. "Eles são competentes e ela gosta da profissão", relata.

O fato de o professor ter autonomia para trabalhar em sua sala de aula também colabora com a visão social tão positiva. Há um currículo nacional básico, que dita as linhas gerais do que deve ser ensinado, mas o docente pode escolher os métodos, os livros, o tipo de didática e inclusive optar ou não pelo uso da tecnologia.

"O currículo não é sobre o que se ensina. É sobre o que os alunos devem aprender. Ele define as capacidades e habilidades que os estudantes devem ter quando terminarem seus estudos", explica Heljä Misukka, secretária de Estado da Educação. Na Finlândia, antes de aprenderem os conteúdos, os alunos têm experiências práticas que auxiliarão no seu entendimento futuro. Um exemplo: na escola Itäkeskus, estudantes de 10 anos têm aulas de culinária. Mas, ao assistir a uma aula, percebe-se o motivo da intervenção dos professores quando eles explicam a reação do fermento em água quente e em água fria. Além disso, os alunos aprendem a economizar energia e água. É através dos saberes cotidianos, como fazer uma receita, que os pequenos estudantes já apreendem conceitos para, mais tarde, aprenderem o conteúdo. Tudo é muito bem amarrado.

Formação
Heljä lembra outro aspecto da profissão docente: os professores são altamente qualificados. Para começar, a concorrência nas universidades de pedagogia é enorme. Dados do Ministério da Educação dão conta de que, na última primavera, havia 6 mil candidatos para 800 vagas. Após ser aceito, o aluno deve completar o mestrado para poder lecionar em qualquer nível educacional (veja mais sobre formação de professores na próxima edição de Educação). "Nós realmente podemos escolher os melhores", coloca.

Não é difícil encontrar pelas escolas docentes cujo sonho de ser professor foi realizado. É o caso de Lejeune Hannele, 42 anos, que leciona apenas para alunos com dificuldade de aprendizagem na escola Itäkeskus.

"Queria ser professora desde os 8 anos. Estudei seis anos para conseguir. Sempre gostei de estar com crianças", conta.

Lejeune passou seis anos no curso superior porque estudou letras durante quatro anos e teve um ano extra para ser docente e outro para ser professora de crianças com necessidades especiais. É importante notar que há um facilitador para a qualidade docente: os alunos já vêm com repertório e formação consolidada para a universidade, adquiridos durante o ensino fundamental e médio.

Aliás, eis outro aspecto digno de nota: os ensinos fundamental é obrigatório e de graça para todos os alunos. Isso inclui materiais escolares, merenda, atendimento médico, atendimento dentário e transporte. No ensino médio, só fica a cargo do aluno o material escolar.

Liberdade e liberdade
O modelo de gestão educacional na Finlândia também é diferenciado. O Ministério da Educação não tem as mesmas funções que o MEC brasileiro. Responsável pela elaboração de políticas públicas e de legislação, ele as propõe ao Parlamento, que pode aprová-las ou não. É um órgão de caráter menos executivo.

O Conselho Nacional de Educação age mais efetivamente na implementação das leis. Um exemplo: o Ministério opta pela existência de um currículo mínimo nacional. O Conselho, então, fica responsável pelo desenho desse currículo. Abaixo dele, estão os chamados escritórios estaduais, cuja função na prática é a elaboração de estatísticas sobre determinadas regiões. Quem realmente executa são os municípios.

O material didático usado por eles não é inspecionado pelo Ministério desde 1990, quando o processo de autonomia se consolidou (ver texto na página 62). Os municípios e as escolas têm liberdade para escolher o material didático mais adequado às suas realidades. Geralmente, os municípios que estão localizados no interior do país e têm menos condição financeira recebem um repasse de verba do governo central - algo em torno de 42% do orçamento municipal.

Helsinque não recebe nenhum tipo de ajuda do gênero. Todo orçamento provém dos impostos municipais. "As pessoas dizem que gostariam de pagar mais impostos, já que consideram a escola um serviço muito importante. Eles são altos, mas eles têm retorno do governo", aponta Heljä.

O documento do Ministério da Educação ressalta a existência de um sistema educacional que oferece oportunidades iguais a todos, independente mente da região em que moram, do sexo, da situação econômica, da língua ou das origens culturais. A maioria dos imigrantes que residem na Finlândia é composta por russos, estonianos, chilenos e chineses. Eles vão para as escolas regulares, onde aprendem o finlandês e a sua língua materna. Por trás dessa iniciativa está a intenção de que as raízes culturais não se esvaiam.

"Se você não sabe sua própria língua, é muito difícil aprender outras", coloca Heljä Misukka. A secretária de Estado enxerga alguns grandes desafios pela frente. Um deles é a discussão do número de alunos por sala. Quando assumiu o cargo, fez um mapeamento desse número em todos os municípios - o que não foi bem recebido nas cidades. Como as escolas são autônomas, há salas de 8 alunos e de 36, o máximo registrado. "Demos 16 milhões a eles neste ano e daremos mais 30 milhões no próximo ano para que deixem suas salas menores", diz.

Outra questão, a formação continuada dos professores, toca num ponto importante: tecnologia. Mais uma vez, a rede autônoma cria sistemas paralelos. Algumas escolas, como a Itäkeskus, usam lousa digital. Mas os municípios que sofrem com problemas financeiros não podem arcar com esse custo.

Heljä diz que ter medo da tecnologia não é uma atitude correta. Lembrando que a Nokia é finlandesa, afirma que grande parte dos alunos do 1º ano já tem celular. "Se vão à escola e lá não há nenhum tipo de tecnologia, a escola vira um museu. Se o professor quer ensinar como um aluno deve se comportar no universo on-line e a escola não puder lidar com isso, temos um problema", levanta.

Há um projeto-piloto no país que usa a tecnologia com crianças que têm necessidades especiais. Elas aprendem a ler e a escrever primeiro no computador, e depois vão para o papel. "É mais fácil para eles e não há nada errado com isso. Há diferentes tipos de aprendizes e diferentes soluções pedagógicas para eles", afirma.

*A jornalista Beatriz Rey viajou a Helsinque a convite da Embaixada da Finlândia no Brasil e do Ministério das Relações Exteriores da Finlândia

o Estado e a Literatura

Ontem, como em outros tantos dias, jornalistas, a maioria, escrevinharam sobre assassinato em um bairro qualquer, sobre drogas apreendidas, sobre alguma superficialidade do que é insignificante.









No Acre, por causa de governo e de proprietários de jornais, as pautas, além de iguais, enfadonhas, agridem a inteligência de um cão sem raça.

Escrever sobre referenciais curriculares não se nivela a informar que a Polícia Militar prendeu mais um traficante; porém, como dono de jornal e repórteres não têm boas referências, os traficantes nos pautam. Que importância existe em um encontro na Secretaria de Educação sobre referenciais curriculares? Traficantes, repito-me, sempre nos pautam, menos a educação pública.

No dia 7 de dezembro, estarei para reconhecer avanços e criticar atrasos nesse encontro. Os referenciais de Literatura e de Língua Poortuguesa da Secretaria de Educação do Acre alegraram-me. Gostei muito. Pensei em publicar um artigo na TRIBUNA sobre isso; porém, por falta de um tempo largo, estou impossibilitado. Ainda sim, destaco uma breve consideração.

Historicismo
Finalmente, após anos e anos, a secretaria apresenta o fim do historicismo literário, essa maldição defendida, por exemplo, pela professora Laélia, da Universidade Federal do Acre. A Faculdade de Letras, até ontem, concebia esse historicismo na graduação.

Em 1975, nos cadernos da PUC-RJ, professores como José Guilherme Merquior já criticavam os estudos de literatura segundo uma concepção de história. Registra-se no referencial da secretaria:

"É importante ressaltar ainda outro ponto importante: o ensino de literatura, que efetivamente deve acontecer no Ensino Médio, deve dar-se de modo articulado às práticas de leitura (PCNEM, 2000) e contemplar a experiência literária do aluno através de propostas que permitam não apenas verificar sua capacidade geral de leitura, mas também avaliar as particularidades do texto literário, sem com isso exigir um domínio de conteúdos específicos (datas, autores, Escolas Literárias, entre outros) trabalhados de forma descontextualizada."

Essa Literatura tornou-se mais complexa, menos tola ou menos fácil para o professor lecionar e, por causa disso, esse professor deverá ser outro, também menos tolo. Somente em 2009, o Estado do Acre aponta um caminho desalienado para a Literatura. Chegou muito atrasado mas chegou.

No entanto, sair de uma tradição congelada no tempo para, em um segundo momento, de repente, quebrar esse gelo com o novo, convenhamos, representa uma transição, os percalços são inevitáveis. A confusão instalou-se entre nós. As incertezas nos desorientam.

Aprecio o novo, a sua natureza me seduz; mas, mesmo assim, não viro as costas para a tradição. Nesse momento, sou prudente - opto pelos dois caminhos para a literatura na escola pública até que a transição passe.