QUANDO ESCOLA E POLÍTICOS IGNORAM A PRÓPRIA
ESCOLA
Quando
políticos acrianos falam de educação, a palavra não pesa. Assim, sem peso, a
palavra pertence ao mundo da doxa, da
opinião, oposto, portanto, ao profundo. A única coisa que sabem de educação é
que ela tem oito letras, não sendo mais cérceos porque desconheço radículas
mais rentes do que as de capim. No entanto, em todo
Acre, são eles os únicos que dão à palavra educação dimensão pública. Semelhante
ao mito de Roland Barthes, a escola acriana, por meio deles, é fala roubada.
Em 2012, a deputada federal do PC do B Perpétua Almeida e o
senador do PT Jorge Viana, com a permissão da escola Heloísa Mourão Marques,
agendaram seus dias para falar aos alunos. Embora a instituição escolar seja responsável
por promover o senso crítico, isto é, a capacidade de julgar o que se adéqua
melhor ao corpo discente, a escola não selecionou o único tema de seu próprio interesse,
qual seja, a educação, concedendo-lhes, no lugar de reflexões concernentes à
escola, discursos conforme interesses partidários.
Para que partidos políticos discursem perante alunos, a
escola pública admite um modelo de democracia que se caracteriza pela liberdade
de falar, quer dizer, como não há nessa liberdade limite ou critério, fala-se o
que quiser segundo o interesse de candidaturas, e não o interesse da escola ou
da educação. Dessa forma, a escola, em nome de uma liberdade estranha à própria
escola, permite que políticos falem de tudo, de tudo, de tudo na escola, menos
de qualidade de ensino. Ora, se afirmei antes ser essa liberdade estranha à
escola, é porque o político pode falar, por exemplo, de seu projeto contra a
violência urbana ou a favor de mais verba à construção de presídios, como se
qualquer e todo tema fosse de vital importância à educação, o que não é. Lanço
dúvidas de que o político falará conforme seu interesse perante juízes,
médicos, advogados, engenheiros. A liberdade democrática da escola pública,
portanto, significa a escola não possuir a liberdade de pensar ou de pesar suas
próprias palavras, quais sejam: a qualidade de ensino.
No lugar de políticos agendarem o tema
que quiserem para a educação, a escola deveria saber que, na democracia, a
liberdade não é falar o que quiser, porque falar o que quiser não fundamenta o sentido
ou a direção da liberdade. A liberdade terá sentido caso fale conforme a
qualidade do que se fala. Quando a liberdade do indivíduo comete um crime, ou
seja, quando não qualifica sua escolha, ele é preso, pois, quando livre, não
soube escolher o melhor para ele e, como consequência, o melhor para o Outro.
Foi preso por ter cometido um crime, mas o crime, aqui, significa, repito, que,
quando livre, não percebeu que a liberdade exige qualidade de escolha do que se
fala. Prende-se pelo fato de a liberdade do indivíduo não ter escolhido o
melhor, não podendo, pois, conviver com o Outro. Somos livres para a
(con)vivência e, para que o (con)viver se sustente, não se fala qualquer coisa,
mas se escolhe o melhor para ser falado dentro de um contexto social, sabendo
que falar já é um agir ou um ato. A liberdade, enfim, implica escolher a
qualidade da palavra para que pulse o melhor agir da (con)vivência.
Os políticos, se desejam falar aos
alunos, deveriam ser alertados pela escola pública de que eles não falarão como
se fala diante de câmeras de televisão, emitindo a mesma palavra indiferente a
pessoas e a classes sociais. Na escola, contexto social específico, eles
deveriam falar conforme o interesse dos ouvintes, no caso, dos professores e
dos alunos.
Comum na cultura escolar acriana, essa
relação bizarra entre políticos e educação publica evidencia que, em seu
próprio espaço, a escola não é sequer pensada por homens públicos, porque, em
seu próprio espaço, a escola se permite a ser roubada pelo discurso político.
Diante da presença de um senador ou de uma deputada federal, a escola pública
se constrange, impedindo, por meio de uma democracia estranha à própria escola,
que professores, alunos e políticos pensem a educação pública no espaço
escolar.