terça-feira, dezembro 08, 2009

Até quando eu retornar


A partir de hoje - a não ser em caso extraordinário -, não atualizarei este blogue até 30 de janeiro de 2010. As férias só permitem descanso, curtição, deixar rolar, preguiça, mãe, pai, amigos, primos, primas, mar, montanha. Mony.

Assim sendo, nesta última atualização deste ano, dedico meu texto a meus alunos, a esse pessoal que me suportou, que não teve preguiça em sala de aula, que teve preguiça, que se dedicou até o último momento, que não se dedicou ao último instante.

Estudar, sabemos, é árduo, porém também transformamos os estudos em uma brincadeira de gincana do conhecimento.

Muitos aceitaram o desafio de eu ser um (risível) obstáculo. Esses não desistem. Quanto mais dificuldades, mais se superaram. Outros, acarinhados pela preguiça, pelo desinteresse, pela falta de vontade, entregaram-se ao descaso, à derrota, esperando de minha parte o relaxamento, a facilitação ou um tipo de corrupção silenciosa que permitisse a aprovação de todos.

Enganaram-se. Há 20 anos, eu leciono e, até hoje, sou um tarado pela sala de aula. Podem falar tudo de mim, tudo, menos que eu não tenho a paixão indomável de lecionar. Já disse: leciono para não morrer. A sala, você viram, foi o espaço onde eu encenei a ordem e a desordem, a lucidez e a loucura, o sério e o cômico; foi o lugar onde sou mais humano, onde rio de mim, de ti, de nós. Mais tarde, após anos lecionando, eu descobri: a sala é o lugar sagrado e profano onde sou quem aprende primeiro.

Assistimos a "Jeca Tatu" para depois anotar três cenas e interpretá-las. Apreciamos "Tapete Vermelho". Refizemos textos. Lemos, mais e mais, interpretamos "O Navio Negreiro". Debruçamos nossos olhos sobre os versos de Cruz e Sousa. Entendemos a letra do Rappa e, no segundo momento, nós relacionamos à poesia de Castro Alves. A gramática só surgiu por causa da produção textual. Lemos "Auto da Compadecida".

Antes, lemos "Auto de São Sebastião" e, entendida a peça de José Anchieta, soubemos que no século 16 o poder da Igreja deformaca a cultura indígena. Lemos poesias. Aprendemos o poder da metáfora por meio do sensível filme "O carteiro e o poeta".

Busquei mostrar a vocês a beleza da cultura popular por meio do caipira, nossa identidade nacional. Lemos sobre o riso em um fragmento de texto do romance "O Nome da Rosa".

Faltei pouco. Falei muito. Repeti mais ainda: anote, anote, anote.

E quantos ótimos alunos o destino apresentou a meus olhos. Jovens humildes, problemas em suas casas, discriminados, mas com um espírito à altura da superação. Diante deles, preciso melhorar sempre. Sempre. São nomes que desejam mais saber. Alunos que sabem contestar. Inquietos.

Se eu pudesse ofertar a cada um de vocês um livro, ofertaria "Fernão Capelo Gaivota", de Richard Bach. Que o voo seja alto para que, quando você mergulhar, busque o peixe no fundo do mar, o melhor. Não se limite a comer o peixe que o pescador lança à superfície das águas. Não comam o que o bando come, porque a beleza da vida não está na superfície e muito menos no que os vulgares fazem. O melhor alimento habita no fundo, lugar onde poucos tocam.

Mas saiba que voar mais alto para chegar ao fundo exige esforço, erros, tentativas, porém é isso que nos eleva à condição de humanos. Supere-se! Seja melhor que seus pais e permita que seus filhos sejam melhores que você.

Navegamos melhores em mares revoltos. Em lagos, onde a água é calma, nada é exigido de nós, a não ser acomodação. Leia narradores que inquietam teus olhos, que perturbem a tua estabilidade. Proust. Lispector. Virgínia. Leminski. Raduan Nassar.

Leia bons livros. Releia-os. Assista a ótimos filmes. Ame as boas amizades, as que exigem de você o melhor de ti. Deixem a TV também no canal Cultura. Namorem para que possam ser melhores do que são. Amem!!! Aprendam que a Paixão não é algo passageiro - há 20 anos, sou apaixonado pelo ato inquietante de lecionar.

Leia Fernando Pessoa. Drummond. Mário Sá-Carneiro. Seja um leitor assíduo da vida. Afaste-se das palavras doentes das ruas. Leia o que eu não li. Obedeçam na hora certa. Desobedeçam na hora incerta. "A desobediência também tem seus direitos", grita André, protagonista de "Lavoura Arcaica".

Um beijo em seus destinos. Um abraço fraterno em suas vidas.

Sou apaixonado por vocês!!!

Os referenciais da Secretaria de Educação

No dia 7, participei do encontro entre professores de Literatura (Língua Portuguesa) e não assinei o documento que aprova os referenciais porque eles não foram dicutidos no encontro. Há uma questão sobre historicismo, apresentada pelos professores da escola Glória Perez, que não entrou em questão.

Em uma próxima reunião, se houver esse debate, se houver certas considerações, o documento poderá ser assinado.

Semestralidade

No Acre, alguns jornalistas e o senso comum acreditam que o poder concentra-se em assmbleias legislativas ou em câmaras de vereadores, ou seja, acredita-se que o poder é físico, é matéria; manifesta-se em prédios ou encarna-se em deputados ou em vereadores.

Ainda pensamos o poder como se fosse a imagem visível de O Príncipe, de Maquiavel, pensamento de 1513. Longe dessa concepção de poder, a escola surge em Vigiar e Punir, de Michel Foucault, pensador que nos fala de outro poder que nos modela.

Hoje, conversando colegas de profissão, afirmei que a escola pública se põe acima de interesses corporativistas. Opondo-se à minha fala, uma professora afirmou com tom irônico que busco tanto o melhor para o aluno que defendi a semestralidade. Não entendi a relação; porém, ainda assim, esforçar-me-ei para explicar.

Semestralidade
Hoje, leciono em duas turmas na escola Heloísa Mourão Marques. Em uma, há 33 alunos; na outra, 30. No diário, há, entretanto, 50 nomes. Ao todo, corrijo 63 redações em sala por meio da refacção ou da reconstrução textual. Caso opte por duplas, são 31 redações.

Como eu reconstruo os textos de meus alunos (com eles) em sala de aula, melhor essa cansativa refacção com 31 redações. No entanto, sem semestralidade, seriam quatro turmas, isto é, 126 redações.

Sem semestralidade ou com semestralidade, a carga de Literatura (Língua Portuguesa) limita-se a 160 horas-aulas e, desde que saibamos colocá-la na semestralidade, a quantidade de aula é a mesma se fosse anual, se não houvesse semestralidade.

Defender a semestralidade é, portanto, qualificar o ensino-aprendizagem de produção textual para quem reconstrói texto em sala de aula com os alunos. Em 2010, com o fim da semestralidade, lecionarei para 126 alunos, não mais para 63. Uma solução, talvez, seja criar duplas para que produzam e reconstruam seus textos.

Sinceramente, professora, não entendi a sua colocação de tentar, talvez, me constranger diante de colegas de profissão. Penso que o caminho para melhorar o ensino público não seja jogar palavras inconsequentes e direcionadas a uma pessoa em momento inadequado.

Defenda ideias, professora, com raiva, com choro, com gestos intensos, gritando, socando a mesa, não importa a aparência, a forma, a maneira de defendê-las, mas defenda ideias. Defenda-as!!! para qualificarmos o ensino público e não para prolongarmos o feriado.

Tenho defendido ideias, eis algumas:

1. Conselho de disciplina;
2. Conselho de turma;
3. Atividades lúdicas na escola (gincana do conhecimento);
4. Alunos exemplares avaliarem os professores;
5. Coordenador assistir às aulas de professor;
6. Não é o professor que deve escolher a turma para lecionar, mas o aluno é quem deve escolher o professor com quem deseja estudar;
7. Se o professor lecionou para o primeiro ano do ensino médio, ele deve acompanhar essa turma até o terceiro ano;
8. Por mérito profissional reconhecido, as coordenações deveriam ter um professor de Língua Portuguesa e um de Matemática.

De forma clara, em uma reunião de professores, diante de todos, defenda ideias.

Professora, o que a senhora defende?

domingo, dezembro 06, 2009

Feijoada modernista














Em "Macunaíma", Mário de Andrade
pintou a iguaria como síntese das identidades nacionais

CARLOS ALBERTO DÓRIA
ESPECIAL PARA A FOLHA

Feijoada acaba com a gente. Por isso o dia é sábado, quando se pode jiboiar. Mas, dizem, foi inventada por escravos. O paradoxo: escravos trabalhavam de sol a sol, como criariam coisa indigesta por vontade própria?

Comiam mesmo o pão que o diabo amassou; não podiam contribuir para a dieta nacional. "Contribuição" supõe liberdade; sem ela não há criação literária ou culinária.

A feijoada deriva do "feijão gordo" enriquecido ao extremo, a ponto de se tornar prato único. Ela só é compreendida dentro do seu ritual: feijão preto e pertences, a caipirinha de cachaça (moeda líquida do tráfico negreiro) e a evocação histórica da nacionalidade. A minifeijoada de boteco na quarta-feira retroage, volta a ser feijão gordo.

No final do século 18 carioca, a alimentação dos escravos estava lastreada em feijão preto, farinha de mandioca, laranjas e bananas; além das carnes secas ou toucinhos que os próprios negros podiam comprar com o produto da venda das suas hortaliças. A origem deve ter sido essa.

Mas, um século depois, ela ainda não era um "prato completo", segundo o folclorista Câmara Cascudo [1898-1986], que sugere que ela se difundiu como tal em hotéis e pensões.

Foram os modernistas que projetaram a feijoada como prato nacional. Eles tinham necessidade enorme de novos signos para a brasilidade.

A questão estética e política era "acharmos a nossa expressão" em vários planos, e nada melhor do que o popular feijão, a evocação do cozido português, dos embutidos e pedaços de porco, além da couve.

Mário de Andrade, em "Macunaíma" (1928), desenhou uma cena imorredoura: a feijoada na casa do fazendeiro Venceslau Pietro Pietra. Uma alegoria da cozinha nacional e daqueles seres étnicos que o Brasil colocou em contato.

O festim é presidido por Venceslau (peruano, italiano, Piaimã), um demônio devorador de gente ou "comedor de identidades", conforme interpreta a crítica literária.

O tema da antropofagia, da deglutição cultural, esteve presente em toda a produção modernista, e a feijoada é um caso particular seu.

Esse festim de "Macunaíma" foi magnificamente carnavalizado no filme homônimo (1969), de Joaquim Pedro de Andrade.

E a graça da evocação continuou com Vinicius de Moraes ("Feijoada à Minha Moda"), que ensinou, em versos engordurados, como fazer uma feijoada sabática.

Ingredientes
O feijão é coisa quase universal. Mas, enquanto o preto e o rajado "igualam" as classes sociais, o fradinho e o jalo diferenciam preferências de ricos e pobres. Feijão preto é dominante somente no Rio de Janeiro e no Rio Grande do Sul. O tempero relevante da feijoada é a propriedade metonímica de reter o passado de escravidão na cor do feijão, subvertendo o seu sentido.

Dentro e no entorno, a feijoada congraça índios, negros e brancos, esquecendo que se comiam: uns foram dizimados, outros feitos escravos; outros, sempre colonizadores cruéis.

A feijoada, como alegoria, é o substrato alimentar da irmandade mística dos contrários -a nação mestiça-, desejada e vista como original do Brasil desde "Casa-Grande e Senzala" (1933), de Gilberto Freyre.

Coisa de intelectuais, estamos entendidos.

E nada mais "cabeça" do que a "Dialética da Feijoada" (1986), de Renato Pompeu, com o prato feito metáfora das relações de classe e da dependência diante do imperialismo.

Como ele escreveu, "consagrada pela intelectualidade influenciada pela industrialização, [ela] tem de enfrentar outros pratos simbólicos, e a sua afirmação como prato nacional-popular tem de ser considerada ainda um processo em andamento".

Joãosinho Trinta, o carnavalesco, poderia reformular sua frase célebre: "Quem gosta de pobreza, e da riqueza da feijoada, é intelectual".

Porque pobre celebra mesmo com churrasco de boi, a carne dos ricos, e cerveja. Assim, as classes sociais se devoram, de modo cruzado, à mesa. Da deglutição restam, incólumes, só os ossos do ofício e os do rabo do porco.

----------------------------------------
CARLOS ALBERTO DÓRIA é sociólogo,
autor de "A Formação da Culinária Brasileira" (Publifolha), entre outros livros.

sábado, dezembro 05, 2009

A política de um âncora

Nada contra sua pessoa. Nada. Incomoda-me por ser uma questão pública. Vereador de Rio Branco, Astério Moreira desde 21 de setembro aparece como âncora do programa "Boa Tarde Rio Branco, da TV Rio Branco, transmitindo um misto de cenas policiais com encenações políticas.

Um âncora-vereador que surge todo dia nas casas de milhares de tele-eleitores. Trata-se de uma sutilíssima campanha politica. Nesse caso, o que importa é projetar a imagem diária, massificá-la, porque, depois, nas eleições, a imagem ressurge como candidata a deputado estadual. Urnas e audiência confundem-se.

Contra a lei? Não assisto a isso como sendo ético. Meu Brasil...

Mony, uma Viagem

Mony, 22 anos, uma jovem que o senhor Destino colocou em minha pele. Belíssimo ser humano que tem ofertado à minha idade a paz.

Quase cinco unidos e, entre nós, uma amizade amorosa que permite a mim viver. Sem ela, não haveria férias, tudo seria cansaço.

Começamos a preparar as malas. Viajar, mal sabe ela que a viagem é ela.

Mais uma vez, nossos corpos pousarão no Rio de Janeiro, cidade das balas perdidas, da favelização, das praias poluídas (menos Barra, Recreio e Grumari), a minha Cidade Maravilhosa.

Mas ficaremos do outro lado, Niterói, praias limpas (menos as que ficam na Baía da Guanabara), por exemplo, praia de Itacoatiara. Para ser mais exato, ficaremos em Maricá, perto de Saquarema. Neste ano, conduzirei minha amada a outros ares, Araruama, Arraial do Cabo, Cabo Frio, Búzios; em outro momento, Parati e Petrópolis.

Viajar com quem amamos... bem-estar, hummmm!!! Mas o Rio de Janeiro não se reduz a montanhas ou a praias. Mony assistirá a ótimos filmes e a peças de teatro,

e eu assistirei à Mony.

sexta-feira, dezembro 04, 2009

Mala para a Viagem














Começo a preparar as malas. Nela, levarei Cinzas do Norte, de Milton Hatoum; Caim, de Saramago; e um ensaio que ainda não escolhi. Também colocarei roupas.

Abraçarei minhas férias como se abraça um amigo.

quinta-feira, dezembro 03, 2009

Blogue ao Márcio Chocorosqui

"Bem, caro Aldo, tenho lido o seu blogue. Belas palavras são ditas aqui. Mas não deixo de fazer uma ressalva a essa postagem, quando você cita a Profª. Laélia. Não a vejo tão defensora da história da literatura. Com ela conversei mais sobre estética da recepção, entre outras coisas. Outra ressalva: José Guilherme Merquior, que você também cita, escreveu o livro “De Anchieta a Euclides — Breve história da literatura brasileira”, de 1977. Talvez ele tenha mudado de ideia."

Márcio, antes de mais nada, quebrei todos os espelhos de minha casa. Todos. Não preservo nem a minha imagem. Neste espaço virtual, onde minha liberdade é lida, defendo ideias, e elas não são refletidas em espelhos.

Citei a professora-doutora Laélia por ser parte de uma elite que deveria problematizar a literatura na educação pública por meio de inquietantes artigos publicados, por exemplo, em um blogue. Assim como outros, ela formou professores segundo uma concepção de literatura, no caso, Márcio, historicismo literário.

Digo-lhe isso com toda propriedade, porque, antes de "ser exilado" da Faculdade de Letras da Universidade Federal do Acre, recolhi todos os planos de curso do corpo docente de Literatura. Todos. A professora-doutora Laélia deixou as marcas do historicismo literário em seus planos. Estão lá.

"Com ela conversei mais sobre estética da recepção", você escreveu. Se você conversou, bem, estética da recepção, eu li em minha graduação, 1986, mas a Teoria Literária segue outros passos em 2009. O relógio biológico da professora atrasou-se.

Não digo que a estética da recepção encontra-se superada, longe disso, mesmo porque a Nova Crítica ou o Formalismo Russo podem orientar o professor de Literatura em uma escola pública; digo-lhe que, se a professora-doutora Laélia conversou sobre estética da recepção com você, mais uma vez, na condição de intelectual, ela não se antecipou ao tempo. Hoje, em 2009, a Teoria Literária se pensa de outra forma.

Quanto a José Guilherme Merquior, Márcio, esse pensador brasileiro publicou em 1977 De Anchieta a Euclides - breve história da literatura brasileira - para se contrapor aos livros didáticos da época embora tenha mantido uma história linear em suas páginas, mas o livro é profundo, problematiza. Ainda que submeta a literatura à história linear, Merquior supera o historicismo.

No Rio de Janeiro, no lugar do livro didático tradicional, já se lia no final dos anos 70 esse livro de Merquior. Acredito que você ironizou sem conhecimento de causa. Merquior, diferente de nós, foi precoce, um gênio. Em 1975, ele escreveu em Os Cadernos da PUC-RJ (primeiro encontro nacional de professores de literatura) um ensaio com o título "Comentário a 'Considerações sobre o Estudo e o Ensino de Literatura Brasileira''', onde critica o historicismo literário.

Sabe, Márcio, a tese de doutorado da professora Laélia encontra-se sepultada em uma biblioteca. Lê-la depende de uma exumação. Não digo isso para depreciar sua tese, entenda, não é isso, se fosse, eu escreveria, digo isso para afirmar que Altino Machado, que não é doutor, sem nível superior, intervém mais na realidade social do que certos doutores. Seu blogue incomoda. A palavra em seu blogue vive, circula. A tese de um professor de Literatura representa um título, às vezes, indiferente à realidade da escola pública.

Precisamos incomodar o poder (se é que isso é possível). Precisamos apresentar outras falas, outros textos. Como diz Marcelo D2, "vamos fazer barulho, porra". Certos doutores não fazem. As teses não circulam entre nós. Quem fará a exumação?

Conflito de ideias em águas rasas

Na segunda-feira, a Secretaria de Educação do Estado do Acre proporcionará um encontro entre professores de Literatura e de Língua Portuguesa para que os referenciais curriculares sejam refeitos, legitimados e aprovados.

Nas escolas públicas, o corpo docente reuniu-se para concordar e/ou discordar a respeito. Com dois colegas de profissão, um professor discrepou quando escreveu que “o texto deixa margem para uma interpretação de ensino historicista de literatura, não deixando claro que a ênfase deve ser na produção de sentido, ao invés da simples listagem das características dos estilos literários”.

Para sua justificativa, retirou este trecho dos Cadernos de Orientação Curricular da Secretaria de Educação: “Leitura, análise e comparação de textos com função literária, considerando contextos de produção em espaços e épocas distintos (Idade Média, Humanismo e Classicismo / Barroco, Modernismo e Contemporaneidade):”

Retirar um pedaço de um todo textual para afirmar que “o texto deixa margem para uma interpretação de ensino historicista de literatura, não deixando claro que a ênfase deve ser na produção de sentido, ao invés da simples listagem das características dos estilos literários” é, repito, mutilar o todo.

O trecho retirado dos cadernos não se encontra isolado, ou seja, o trecho retirado não “deixa margem para uma interpretação de ensino historicista” porque não se trata de “texto”, mas de um fragmento do texto. Retalham o texto e, a parte retalhada, os senhores a chamam de “texto que deixa margem”. Ora, não se trata de “texto”, mas de um pedaço do texto.

A coisa em-si disse pelo todo textual. Um trecho isolado passou-se como todo. A parte é o todo. Ora, senhores, quem leu o todo, o texto, não a parte como o todo, sabe que os Cadernos de Orientação Curricular da Secretaria de Educação sepultaram o historicismo literário. As partes entrelaçadas, ou seja, o todo, explicitam isso. Texto não é parte isolada, mas partes que se combinam, formando, aí então, o todo.

Não leram o texto, por isso a parte lida arvora-se de todo. A folha fala como se fosse árvore.

Sou apaixonado pela estética Barroca. Belos versos estes de Gregório de Matos e Guerra:

O todo sem a parte não é todo,
A parte sem o todo não é parte.
Mas se a parte o faz todo, sendo parte,
Não se diga, que é parte, sendo todo
.

A maioria, o todo, concorda com o “texto deixa margem”. Eu, a parte, discordo. A gestora diz que a parte deve se submeter ao todo no dia 7 de dezembro.

Antes, lerei Nelson Rodrigues.

quarta-feira, dezembro 02, 2009

O Haiti é aqui















Presos do pavilhão J dizem que foram torturados

De Nayanne Santana

Os detentos que cumprem pena no pavilhão J enviaram aos jornais uma carta que denuncia maus-tratos no presídio Francisco D’Oliveira Conde

Segundo a carta, enviada à reportagem da TRIBUNA digitada, os detentos estão reivindicando a visita do diretor do presídio e de representantes dos direitos humanos para contarem o que passam no local.

“Constantemente, somos vítimas das mais variadas agressões de alguns agentes penitenciários. Alguns deles veem trabalhar embriagados e até drogados. Chegando aqui, eles nos espancam, sendo fato diário e ainda se apossam de pertences deixados por nossas famílias. Há médico e dentista, mas não há medicamentos”, relatam os detentos.

Os detentos revelam na carta que vivem momentos de terror e que, depois de serem aconselhados por um policial militar, decidiram constituir uma comissão formada por 20 detentos que estão no pavilhão J para conversar com o diretor, mas, antes de chegarem à sala, eles passaram por maus-tratos.

“Ao nos apresentarmos como membros da comissão, fomos levados para um corredor (corredor polonês) onde nos aguardavam vários agentes penitenciários. Neste lugar, passamos por uma sessão de tortura por mais de uma hora. Socos, chutes, cassetetes, cuspe na cara, pancadas na cabeça e nos testículos e choque elétrico. Alguns estão gravemente feridos com costela quebrada e o corpo tomado por hematomas”, contam os presos.

Na carta, eles revelam que a informação de que teriam cometido um motim na segunda-feira, dia 30, foi forjada para justificar as marcas de torturas que sofreram no “corredor polonês”.

“Aqui, têm pessoas gravemente feridas devido à sessão de tortura e de espancamento a que foram submetidas. Para evitar que nossos familiares e a sociedade tomem conhecimento de tal fato, nos proibiram de receber visitas e ainda nos acusam mentirosamente de motim e de tentativa de fuga para, quando o fato se tornasse público, ter um argumento para justificar a tortura e o espancamento, os hematomas e os ossos quebrados em nossos corpos”, denunciam.
Por fim, eles pedem que as autoridades locais tomem providências em relação ao caso.

“Pedimos socorro às autoridades, Ministério Público, Direitos Humanos. Somos seres humanos e, como qualquer pessoa, cometemos erros e, por isso, estamos aqui. Queremos cumprir a nossa pena de acordo com a lei. Pedimos socorro às autoridades para que medidas sejam tomadas, para que possamos ter um tratamento, se não for digno, pelo menos mais humano. Nos ajudem!”, clamam os detentos do pavilhão J.

O outro lado
A reportagem da TRIBUNA entrou em contato ontem, à noite, com o diretor do Instituto Penitenciário do Acre (Iapen), Leonardo Carvalho, que disse desconhecer as denúncias.

“Estou sabendo dessas informações agora, mas posso garantir que, se houver algum tipo de tortura dentro do complexo, nós vamos averiguar”, certificou Carvalho.

Para ouvir as denúncias sobre as torturas de agentes penitenciários, a reportagem tentou entrar em contato com o presidente do Sindicato dos Agentes Penitenciários do Acre (Sindap), Adriano Marques, mas o telefone do representante da categoria não foi encontrado. A informação que a reportagem recebeu foi que o presidente do Sindap estaria de plantão na penitenciária, por isso não era possível contato.

A Finlândia não é aqui

"Não!", interrompeu Alfons Tallgreen, 13 anos, ao ouvir que o finlandês, sua língua materna, tinha raízes semelhantes às da língua russa.

"O estoniano, o húngaro e o finlandês são línguas correlatas. Aconteceu assim: primeiro, o finlandês começou a ser usado no sul da Finlândia e, aos poucos, foi ganhando o norte do país", conta o menino ruivo, aluno da 7ª série da Itäkeskus, em Helsinque, capital da Finlândia.

Apesar de já conhecer a história de sua língua, Alfons quer, no futuro, estudar as propriedades de plantas e micro-organismos. Pausadamente, explica que sua vontade inicial era ser dentista - a mãe o demoveu da ideia. Porém, já estava interessado em biologia nessa época.

"Estava pesquisando a floresta aqui do lado da escola. Mas infelizmente as árvores serão cortadas para a construção de casas de madeira no lugar", diz.

A escola em que Alfons estuda tem o foco específico em línguas. Ali, os alunos têm a opção de estudar diversos idiomas. É o caso de seu colega, Muaad Hussein, cuja família tem ascendência libanesa. Com a mesma idade de seu colega, o menino já conhece cinco línguas: árabe, sueco, italiano, francês e finlandês, além de entender também um pouco de espanhol.

"É claro que nem todos os alunos se interessam assim. Alguns não querem nem ouvir os professores. Não pensam no futuro", desabafa.

Muaad tem razão. Ali, na Finlândia, os meninos e meninas são iguais a todos os outros no mundo: não gostam de escola, adoram o videogame, o computador, andam de skate em praças e passeiam em grupos pelos shoppings. O que leva, então, o país a ser sucessivamente o primeiro colocado nas avaliações do Pisa? Na última edição, que avaliou ciências, a média finlandesa foi de 563 - o Brasil alcançou 390 (52º de 56 países).

Um documento do próprio Ministério da Educação, criado para apresentar o sistema educacional finlandês a estrangeiros, começa a responder à pergunta. Logo no começo, há uma advertência: o sucesso só pode ser explicado em função de uma conjugação de fatores, e não por uma única ação.

A primeira razão, diz, é que a sociedade finlandesa valoriza a educação e, portanto, tem uma atitude muito favorável à área. Os números dão subsídio à frase que, aparentemente, não diz muito: aproximadamente 75% dos adultos entre 25 e 64 anos têm diploma de ensino superior. Na Finlândia, o ensino é obrigatório dos 7 aos 16 anos - em outras palavras, cursa o ensino médio quem quer. Mas apenas 1% dos estudantes da chamada escola "compreensiva" (equivalente ao nosso ensino fundamental) não continua os estudos.

Ser professor
Muito dessa atitude favorável à educação provém de uma cultura desconhecida em terras brasileiras. Na Finlândia, o professor é visto com respeito - profissionalismo e responsabilidade envolvem a profissão. Há um componente histórico nessa valorização: há cem anos, quando o país ainda se configurava como nação, a pobreza reinava, principalmente no interior.

Ali, quem tinha um diploma de professor era tratado como se fosse rei. Foi esse o relato de um membro do Conselho Nacional de Educação Finlandês, Reijo Laukkanen, em entrevista à Educação na edição 150.

Hoje, é menos reverenciado, pois divide o conhecimento com profissionais de outras áreas. Mas nas ruas de Helsinque é possível perceber a atmosfera positiva que o envolve. Enquanto espera em frente à famosa loja de departamento Stockmann, Sari Nummila, 41, mãe de dois filhos, é categórica: "o que posso dizer? Nós precisamos deles. Ficaria feliz se um dos meus filhos se tornasse professor", diz.

Lea Itoonen, 56, mãe de três filhos e voluntária da Cruz Vermelha Internacional, diz estar satisfeita com a educação que recebem na escola. Só tem uma reclamação: antigamente, os professores tinham personalidade mais forte. "Gostaria que eles não apenas fossem um agrupamento excelente, mas tivessem mais atitude, enfrentassem os pais e o governo por melhores salários", relata. Mas, de qualquer maneira, diz: "é uma profissão bonita para se ter aqui".

Mesmo entre os mais jovens, a percepção não se altera. Annette Backman, 21 anos, tem inclusive uma amiga que quer ser professora. "Eles são competentes e ela gosta da profissão", relata.

O fato de o professor ter autonomia para trabalhar em sua sala de aula também colabora com a visão social tão positiva. Há um currículo nacional básico, que dita as linhas gerais do que deve ser ensinado, mas o docente pode escolher os métodos, os livros, o tipo de didática e inclusive optar ou não pelo uso da tecnologia.

"O currículo não é sobre o que se ensina. É sobre o que os alunos devem aprender. Ele define as capacidades e habilidades que os estudantes devem ter quando terminarem seus estudos", explica Heljä Misukka, secretária de Estado da Educação. Na Finlândia, antes de aprenderem os conteúdos, os alunos têm experiências práticas que auxiliarão no seu entendimento futuro. Um exemplo: na escola Itäkeskus, estudantes de 10 anos têm aulas de culinária. Mas, ao assistir a uma aula, percebe-se o motivo da intervenção dos professores quando eles explicam a reação do fermento em água quente e em água fria. Além disso, os alunos aprendem a economizar energia e água. É através dos saberes cotidianos, como fazer uma receita, que os pequenos estudantes já apreendem conceitos para, mais tarde, aprenderem o conteúdo. Tudo é muito bem amarrado.

Formação
Heljä lembra outro aspecto da profissão docente: os professores são altamente qualificados. Para começar, a concorrência nas universidades de pedagogia é enorme. Dados do Ministério da Educação dão conta de que, na última primavera, havia 6 mil candidatos para 800 vagas. Após ser aceito, o aluno deve completar o mestrado para poder lecionar em qualquer nível educacional (veja mais sobre formação de professores na próxima edição de Educação). "Nós realmente podemos escolher os melhores", coloca.

Não é difícil encontrar pelas escolas docentes cujo sonho de ser professor foi realizado. É o caso de Lejeune Hannele, 42 anos, que leciona apenas para alunos com dificuldade de aprendizagem na escola Itäkeskus.

"Queria ser professora desde os 8 anos. Estudei seis anos para conseguir. Sempre gostei de estar com crianças", conta.

Lejeune passou seis anos no curso superior porque estudou letras durante quatro anos e teve um ano extra para ser docente e outro para ser professora de crianças com necessidades especiais. É importante notar que há um facilitador para a qualidade docente: os alunos já vêm com repertório e formação consolidada para a universidade, adquiridos durante o ensino fundamental e médio.

Aliás, eis outro aspecto digno de nota: os ensinos fundamental é obrigatório e de graça para todos os alunos. Isso inclui materiais escolares, merenda, atendimento médico, atendimento dentário e transporte. No ensino médio, só fica a cargo do aluno o material escolar.

Liberdade e liberdade
O modelo de gestão educacional na Finlândia também é diferenciado. O Ministério da Educação não tem as mesmas funções que o MEC brasileiro. Responsável pela elaboração de políticas públicas e de legislação, ele as propõe ao Parlamento, que pode aprová-las ou não. É um órgão de caráter menos executivo.

O Conselho Nacional de Educação age mais efetivamente na implementação das leis. Um exemplo: o Ministério opta pela existência de um currículo mínimo nacional. O Conselho, então, fica responsável pelo desenho desse currículo. Abaixo dele, estão os chamados escritórios estaduais, cuja função na prática é a elaboração de estatísticas sobre determinadas regiões. Quem realmente executa são os municípios.

O material didático usado por eles não é inspecionado pelo Ministério desde 1990, quando o processo de autonomia se consolidou (ver texto na página 62). Os municípios e as escolas têm liberdade para escolher o material didático mais adequado às suas realidades. Geralmente, os municípios que estão localizados no interior do país e têm menos condição financeira recebem um repasse de verba do governo central - algo em torno de 42% do orçamento municipal.

Helsinque não recebe nenhum tipo de ajuda do gênero. Todo orçamento provém dos impostos municipais. "As pessoas dizem que gostariam de pagar mais impostos, já que consideram a escola um serviço muito importante. Eles são altos, mas eles têm retorno do governo", aponta Heljä.

O documento do Ministério da Educação ressalta a existência de um sistema educacional que oferece oportunidades iguais a todos, independente mente da região em que moram, do sexo, da situação econômica, da língua ou das origens culturais. A maioria dos imigrantes que residem na Finlândia é composta por russos, estonianos, chilenos e chineses. Eles vão para as escolas regulares, onde aprendem o finlandês e a sua língua materna. Por trás dessa iniciativa está a intenção de que as raízes culturais não se esvaiam.

"Se você não sabe sua própria língua, é muito difícil aprender outras", coloca Heljä Misukka. A secretária de Estado enxerga alguns grandes desafios pela frente. Um deles é a discussão do número de alunos por sala. Quando assumiu o cargo, fez um mapeamento desse número em todos os municípios - o que não foi bem recebido nas cidades. Como as escolas são autônomas, há salas de 8 alunos e de 36, o máximo registrado. "Demos 16 milhões a eles neste ano e daremos mais 30 milhões no próximo ano para que deixem suas salas menores", diz.

Outra questão, a formação continuada dos professores, toca num ponto importante: tecnologia. Mais uma vez, a rede autônoma cria sistemas paralelos. Algumas escolas, como a Itäkeskus, usam lousa digital. Mas os municípios que sofrem com problemas financeiros não podem arcar com esse custo.

Heljä diz que ter medo da tecnologia não é uma atitude correta. Lembrando que a Nokia é finlandesa, afirma que grande parte dos alunos do 1º ano já tem celular. "Se vão à escola e lá não há nenhum tipo de tecnologia, a escola vira um museu. Se o professor quer ensinar como um aluno deve se comportar no universo on-line e a escola não puder lidar com isso, temos um problema", levanta.

Há um projeto-piloto no país que usa a tecnologia com crianças que têm necessidades especiais. Elas aprendem a ler e a escrever primeiro no computador, e depois vão para o papel. "É mais fácil para eles e não há nada errado com isso. Há diferentes tipos de aprendizes e diferentes soluções pedagógicas para eles", afirma.

*A jornalista Beatriz Rey viajou a Helsinque a convite da Embaixada da Finlândia no Brasil e do Ministério das Relações Exteriores da Finlândia

o Estado e a Literatura

Ontem, como em outros tantos dias, jornalistas, a maioria, escrevinharam sobre assassinato em um bairro qualquer, sobre drogas apreendidas, sobre alguma superficialidade do que é insignificante.









No Acre, por causa de governo e de proprietários de jornais, as pautas, além de iguais, enfadonhas, agridem a inteligência de um cão sem raça.

Escrever sobre referenciais curriculares não se nivela a informar que a Polícia Militar prendeu mais um traficante; porém, como dono de jornal e repórteres não têm boas referências, os traficantes nos pautam. Que importância existe em um encontro na Secretaria de Educação sobre referenciais curriculares? Traficantes, repito-me, sempre nos pautam, menos a educação pública.

No dia 7 de dezembro, estarei para reconhecer avanços e criticar atrasos nesse encontro. Os referenciais de Literatura e de Língua Poortuguesa da Secretaria de Educação do Acre alegraram-me. Gostei muito. Pensei em publicar um artigo na TRIBUNA sobre isso; porém, por falta de um tempo largo, estou impossibilitado. Ainda sim, destaco uma breve consideração.

Historicismo
Finalmente, após anos e anos, a secretaria apresenta o fim do historicismo literário, essa maldição defendida, por exemplo, pela professora Laélia, da Universidade Federal do Acre. A Faculdade de Letras, até ontem, concebia esse historicismo na graduação.

Em 1975, nos cadernos da PUC-RJ, professores como José Guilherme Merquior já criticavam os estudos de literatura segundo uma concepção de história. Registra-se no referencial da secretaria:

"É importante ressaltar ainda outro ponto importante: o ensino de literatura, que efetivamente deve acontecer no Ensino Médio, deve dar-se de modo articulado às práticas de leitura (PCNEM, 2000) e contemplar a experiência literária do aluno através de propostas que permitam não apenas verificar sua capacidade geral de leitura, mas também avaliar as particularidades do texto literário, sem com isso exigir um domínio de conteúdos específicos (datas, autores, Escolas Literárias, entre outros) trabalhados de forma descontextualizada."

Essa Literatura tornou-se mais complexa, menos tola ou menos fácil para o professor lecionar e, por causa disso, esse professor deverá ser outro, também menos tolo. Somente em 2009, o Estado do Acre aponta um caminho desalienado para a Literatura. Chegou muito atrasado mas chegou.

No entanto, sair de uma tradição congelada no tempo para, em um segundo momento, de repente, quebrar esse gelo com o novo, convenhamos, representa uma transição, os percalços são inevitáveis. A confusão instalou-se entre nós. As incertezas nos desorientam.

Aprecio o novo, a sua natureza me seduz; mas, mesmo assim, não viro as costas para a tradição. Nesse momento, sou prudente - opto pelos dois caminhos para a literatura na escola pública até que a transição passe.

domingo, novembro 29, 2009

Jesus Cristo não paga imposto










Leia este texto sobre as facilidades de abrir uma igreja neste país. A lei protege Jesus para que o Senhor, por meio de seus fiéis, não pague, por exemplo, IPTU. A lei dos homens permite que Jesus sonegue impostos.

Boa leitura!
______________________________

Bastam R$ 418 para criar igreja e se livrar de imposto
Após fundar igreja, reportagem da Folha
abre conta bancária e faz aplicação isenta de IR

Além de vantagens fiscais, ministros religiosos
têm direito a prisão especial e estão dispensados de prestar serviço militar

HÉLIO SCHWARTSMAN
DA EQUIPE DE ARTICULISTAS

Bastaram dois dias úteis e R$ 218,42 em despesas de cartório para a reportagem da Folha criar uma igreja. Com mais três dias e R$ 200, a Igreja Heliocêntrica do Sagrado EvangÉlio já tinha CNPJ, o que permitiu aos seus três fundadores abrir uma conta bancária e realizar aplicações financeiras livres de IR (Imposto de Renda) e de IOF (Imposto sobre Operações Financeiras).

Seria um crime perfeito, se a prática não estivesse totalmente dentro da lei. Não existem requisitos teológicos ou doutrinários para a constituição de uma igreja. Tampouco se exige um número mínimo de fiéis.

Basta o registro de sua assembleia de fundação e estatuto social num cartório. Melhor ainda, o Estado está legalmente impedido de negar-lhes fé. Como reza o parágrafo 1º do artigo 44 do Código Civil: "São livres a criação, a organização, a estruturação interna e o funcionamento das organizações religiosas, sendo vedado ao poder público negar-lhes reconhecimento ou registro dos atos constitutivos e necessários ao seu funcionamento".

A autonomia de cada instituição religiosa é quase total. Desde que seus estatutos não afrontem nenhuma lei do país e sigam uma estrutura jurídica assemelhada à das associações civis, os templos podem tudo.

A Igreja Heliocêntrica do Sagrado EvangÉlio, por exemplo, pode sem muito exagero ser descrita como uma monarquia absolutista e hereditária. Nesse quesito, ela segue os passos da Igreja da Inglaterra (anglicana), que tem como "supremo governador" o monarca britânico.

Livrar-se de tributos é a principal vantagem material da abertura de uma igreja. Nos termos do artigo 150, VI, b da Constituição, templos de qualquer culto são imunes a impostos que incidam sobre o patrimônio, a renda e os serviços, relacionados com suas finalidades essenciais.

Isso significa que, além de IR e IOF, igrejas estão dispensadas de IPTU (imóveis urbanos), ITR (imóveis rurais), IPVA (veículos), ISS (serviços), para citar só alguns dos vários "Is" que assombram a vida dos contribuintes brasileiros. A única condição é que todos os bens estejam em nome do templo e que se relacionem a suas finalidades essenciais -as quais são definidas pela própria igreja.

O caso do ICMS é um pouco mais polêmico. A doutrina e a jurisprudência não são uniformes. Em alguns Estados, como São Paulo, o imposto é cobrado, mas em outros, como o Rio de Janeiro e Paraná, por força de legislação estadual, igrejas não recolhem o ICMS nem sobre as contas de água, luz, gás e telefone que pagam.

Certos autores entendem que associações religiosas, por analogia com o disposto para outras associações civis, estão legalmente proibidas de distribuir patrimônio ou renda a seus controladores. Mas nada impede -aliás é quase uma praxe- que seus diretores sejam também sacerdotes, hipótese em que podem perfeitamente receber proventos.

A questão fiscal não é o único benefício da empreitada. Cada culto determina livremente quem são seus ministros religiosos e, uma vez escolhidos, eles gozam de privilégios como a isenção do serviço militar obrigatório (CF, art. 143) e o direito a prisão especial (Código de Processo Penal, art. 295).

Na dúvida, os filhos varões dos sócios-fundadores da Igreja Heliocêntrica foram sagrados minissacerdotes. Neste caso, o modelo inspirador foi o budismo tibetano, cujos Dalai Lamas (a reencarnação do lama anterior) são escolhidos ainda na infância.

Voltando ao Brasil, há até o caso de cultos religiosos que obtiveram licença especial do poder público para consumir ritualisticamente drogas alucinógenas.

Desde os anos 80, integrantes de igrejas como Santo Daime, União do Vegetal, A Barquinha estão autorizados pelo Ministério da Justiça a cultivar, transportar e ingerir os vegetais utilizados na preparação do chá ayahuasca -proibido para quem não é membro de uma dessas igrejas.

Se a Lei Geral das Religiões, já aprovada pela Câmara e aguardando votação no Senado, se materializar, mais vantagens serão incorporadas. Templos de qualquer culto poderão, por exemplo, reivindicar apoio do Estado na preservação de seus bens, que gozarão de proteção especial contra desapropriação e penhora.

O diploma também reforça disposições relativas ao ensino religioso. Em princípio, a Igreja Heliocêntrica poderá exigir igualdade de representação, ou seja, que o Estado contrate professores de heliocentrismo.
______________________________
Colaboraram os bispos CLAUDIO ANGELO, editor de Ciência,
e RAFAEL GARCIA, da Reportagem Local

sexta-feira, novembro 27, 2009

O 14º salário e o planejamento

O processo é gradual, lento, consequência de uma mistura entre críticas e resitências. A Secretaria de Educação, administrada pela Frente Popular, vem alterando aos poucos o cotidiano escolar. Escrevi neste blogue que a secretaria comete erros há anos, porém eu prefiro esses erros àqueles antes de a Frente Popular chegar ao poder.

Voltemos. Uma alteração recente diz respeito ao planejamento pedagógico do corpo docente, não de indivíduos isolados. Se um membro não se mexe, não faz o que tem de fazer, o corpo fica comprometido. Até 30 de novembro, o corpo docente deveria apresentar ao coordenador pedagógico um parecer. O único dia para reunir os professores, 28 de novembro, dia do pagamento. Não houve reunião.

Há reunião para alongar feriado, entretanto não há reunião para planejamento. Como o corpo docente ausentou-se, como o todo não planejou, o meu 14º salário não cairá em minha conta. Dependo de outros para receber mais um pouco. Meu trabalho depende de outros, da boa vontade de outros.

A secretaria, nesse ponto, está correta.

quinta-feira, novembro 26, 2009

Paixão

Os clássicos são sábios quando pensam sobre a paixão. Em A República, de Platão, sinônimo de paixão é cólera, isto é, doença. E, dessa forma, como toda doença, a razão não domina o que o corpo sente. O corpo sofre por ter sido afetado, eis o afeto por alguém.

Já não somos senhores, mas objetos e, como tais, manipulados pelo capricho do tempo, pela ausência absoluta de autodomínio. Por causa disso, em versos árcades, os amantes, curados da doença, não se apaixonam. O arcadismo é frio porque a emoção foi exilada por ordem da razão.

Cessada a chama, sobram as cinzas, a quietude. Inicia-se o Amor.

quarta-feira, novembro 25, 2009

Boa música com boa letra

Ponty

Há pensadores que me seduzem. Um deles é Nietzsche, um dos maiores escritores do século 19. Em Assim falou Zaratustra, sua filosofia lírica empobrece o Evangelho de Cristo. Não é o conteúdo do pensar que me seduz, mas a forma como o conteúdo se apresenta.

Em 2003, quem me seduziu foi Maurice Merleau-Ponty, Fenomenologia da Percepção. Semelhante a Nietzsche, Ponty é poético, lírico. Sob teus olhos, eis alguma palavras desse fascinante escritor.

Na parte sobre O Corpo...

"Aquilo que procuramos possuir não é portanto um corpo, mas um corpo animado por uma consciência e, como o diz Alain, não se ama uma louca, exceto se já a amássemos antes de sua loucura."

terça-feira, novembro 24, 2009

O Mal

"O princípio do mal não é moral; é um princípio de desequilíbrio e de vertigem, princípio de complexidade e de estranheza, de sedução, de incompatibilidade."

De A Transparência do Mal, Jean Baudrillard

segunda-feira, novembro 23, 2009

Quantidade X Qualidade

Projeto de lei quer limitar número de alunos por sala
Especialistas afirmam que a medida pode melhorar o aprendizado, principalmente para alunos que têm dificuldades

De Danilo Venticinque

Qual é o número ideal de alunos em uma sala de aula? Durante muito tempo, a pergunta foi motivo de discussão entre educadores. Agora, os senadores também entrarão no debate. Um projeto de lei que tramita no Congresso pretende estabelecer limites para o número de alunos por professor nas diferentes faixas etárias do ensino público. Em setembro, a Câmara dos Deputados aprovou a proposta. No Senado, ela aguarda o parecer do relator Flávio Arns (PSDB-PR) antes de ser votada na Comissão de Educação.

ATENÇÃO
Além de ser mais silenciosas, salas menores permitem que o professor conheça melhor as dificuldades de cada aluno Se for aprovado, o projeto tornará obrigatórias as recomendações do Ministério da Educação (MEC), definidas em 1999 nos Parâmetros Nacionais de Qualidade da Educação Infantil. “Apesar de estabelecer os parâmetros, o MEC não tem poder constitucional para forçar os Estados e municípios a reduzir as turmas”, afirma Maria do Pilar Lacerda, secretária de Educação Básica do MEC.

Embora as médias nacionais estejam próximas dos parâmetros do MEC, alguns Estados têm médias superiores às recomendadas. Em Alagoas, por exemplo, turmas da 6ª à 9ª série têm quase 37 alunos – sete a mais do que o recomendado para a faixa etária. No Amazonas, a diferença é ainda maior: as salas de aula da 1ª à 5ª série do ensino fundamental têm em média 34,7 alunos, enquanto o MEC recomenda apenas 25.

Limitar o número de alunos por sala de aula pode ser uma maneira eficiente de melhorar o aprendizado e diminuir as diferenças de conhecimento dentro da mesma turma. Em outubro, a Universidade de Chicago fez uma pesquisa com 11 mil alunos do jardim da infância à 3ª série nos Estados Unidos. Os resultados comprovaram que classes com 13 a 17 alunos têm desempenho melhor do que turmas maiores em todas as disciplinas, com destaque para ciências e literatura.

Segundo os pesquisadores, os mais beneficiados foram os estudantes que tinham dificuldades de aprendizado nessas duas áreas. Nas salas menores, todos os alunos se saíram melhor, mas a diferença entre as maiores e as menores notas diminuiu muito. A longo prazo, a distância entre os melhores e os piores alunos tende a ser ainda menor.

Especialistas brasileiros ouvidos por ÉPOCA dizem que os resultados da pesquisa se aplicam ao sistema de ensino do Brasil. “Em salas muito grandes, o aluno carrega a dificuldade ao longo do ano. Às vezes o professor até percebe, mas não tem condições de ajudar”, afirma a professora Ângela Soligo, coordenadora do curso de pedagogia da Unicamp. As especialistas afirmam que as salas de aula com menos alunos são mais silenciosas, o que ajuda na concentração dos alunos. As tarefas fora da sala de aula também são beneficiadas com as turmas menores. “Com menos alunos por sala, há momentos de atenção mais individualizada”, diz a pesquisadora da Letícia Nascimento, da Universidade de São Paulo. Os professores têm mais tempo para se dedicar à correção de cada trabalho ou prova, podendo conhecer melhor as deficiências de cada estudante.

Confira abaixo os limites previstos pelo MEC para os diferentes níveis da educação básica:

Jardim da infância (de 3 a 4 anos)
Até 15 alunos por sala

Pré-escola (de 4 a 5 anos)
Até 20 alunos por sala

Ensino fundamental (1ª à 5ª série)
Até 25 alunos por sala

Ensino fundamental (6ª à 9ª série)
Até 30 alunos por sala

Ensino médio
Até 35 alunos por sala

domingo, novembro 22, 2009

A escola pública do PSDB e do PT

Para os veículos de comunicação de massa do Acre, a escola pública nunca entra em pauta, a não ser quando existe ocorrência de violência ou de droga. Diferente daqui, a revista VEJA publicou uma entrevista interessante sobre educação pública.

No Acre, nenhuma notinha nos jornais sobre a entrevista que o secretário de Educação de São Paulo, sr. Paulo Renato (PSDB), concedeu à revista no dia 28 de outubro. Entretanto, após quase um mês, não quis deixar em branco meus comentários sobre a escola pública segundo essa entrevista.


"Contra o corporativismo" é o título da entrevista e, nas primeiras linhas, o ex-ministro da Educação declara que, "sem meritocracia, não haverá avanços em sala de aula". Leciono há 12 anos na rede pública do Estado do Acre e, até hoje, não senti o aroma do mérito. Nas escolas públicas acrianas, se o professor lecionar melhor, seu salário permanece o mesmo. A Secretaria de Educação não reconhece o mérito.


Os cursos
Serei específico. Nos últimos anos, a Secretaria de Educação do Acre promove cursos para professores do ensino médio, lembro-me de um deles: letramento. Eu não assisti a todas aulas e, por causa disso, não recebi da secretaria um certificado que comprova o tempo devido dedicado ao curso.

Sem esse certificado, o meu décimo quarto salário ficou comprometido. Todavia, quem recebeu o certificado do curso de letramento e submeteu-se ainda a outras exigências da Secretaria da Educação receberá seu décimo quatro salário.

Letramento
Pergunto: receber certificado do curso de letramento representa qualidade de ensino na sala de aula? Se o professor aprendeu algo no curso, quem constata esse aprendizado em sala de aula? Conheço colegas de profissão - eu disse colegas - que receberam o certificado de letramento, mas não o aplicam em sala de aula.

Ora, se não aplica, se o aprendizado não retorna à sala de aula, se a secretaria não tem formas para conferir se o professor emprega o letramento em sala de aula, isso significa dinheiro público desperdiçado.

A Secretaria de Educação emite certificados, mas ignora o que ocorre em sala de aula, porque não possui meios para examinar o que acontece entre professor e alunos. Ora, para examinar, a secretaria depende também de quem administra a escola. E aí Paulo Renato diz:

"As boas escolas são comandadas por diretores com uma visão moderna de gestão, coisa raríssima no país. Não existe no Brasil nada como um bom curso voltado para treinar esses profissionais a liderar equipes ou cobrar resultados, o básico para qualquer um que se pretende gestor."

Em São Paulo, o Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB), no lugar de oferecer cursos, criou a Escola do Magistério, ideia que o PT acriano deveria copiar.

Contra a isonomia
Antes, o governo do PT propagava que o professor acriano recebia o maior salário do Brasil. Depois que salários dos estados e do Distrito Federal foram publicados - este blogue divulgou, houve o silêncio. Em São Paulo, onde o custo de vida é menor, o salário do professor chega a R$ 3 mil, com um só contrato.

Outra diferença. Enquanto o PT acriano põe fé na isonomia salarial, o PSDB de São Paulo prefere a diferença.

"Nós limitamos o número de promoção por ano: não mais do que 20% dos profissionais poderão subir de nível. É um teto razoável: evita um rombo no orçamento e, ao mesmo tempo, promove uma bem-vinda competição. Demandará mais empenho e estudo dos professores - o que não lhes fará mal."

Segundo Paulo Renato, é consenso entre especialistas do mundo que aumentos concedidos a uma categoria inteira, desprezando as diferenças de desempenho entre profissionais, não têm impacto relevante no ensino. O PSDB defende a ideia de que o que faz a diferença é conseguir premiar os que se saem melhor em sala de aula. "A isonomia é uma bandeira velha", critica o secretário de Educação de São Paulo.

Não voto no PSDB. Só aprecio boas ideias.

sexta-feira, novembro 20, 2009

Blogue Aberto a Edvaldo Sousa

No Acre, não há um articulista que saiba com equilíbrio tecer críticas a certos programas da tevê acriana. Nossa programação local age livre e impune. Neste blogue, critiquei o programa Gazeta Alerta, não foi um texto profundo, admito, mas a crítica houve. Soube que Edvaldo Sousa, o âncora do programa, não gostou.

Hoje, feriado, quando trocava o canal de televisão, ouvi a voz de Edvaldo Sousa no jornal Gazeta em Manchete, o que estranhei, porque seu horário é outro. Parei para ouvi-lo. Era uma matéria sobre a miséria de um idoso de 94 anos que mora em um barco.

Não era mais o Edvaldo Sousa do programa Gazeta Alerta. Sua fala de jornalista emocionou-me por não ter aqueles clichês de seu programa. Com essa matéria, ele revelou a função grandiosa de ser repórter.

Depois, a âncora Mara Rocha disse que o poder público retirou o idoso do local para dar condições dignas a ele. A matéria de Edvaldo Sousa mudou a vida desse humilhado homem.

Penso que o Gazeta Alerta deveria ser outra forma de programa para transmitir um Edvaldo Sousa com outra função social, com outra capacidade de abordar a violência. Hoje, o Gazeta Alerta, por causa de sua forma, é muito pouco para Edvaldo Sousa.

Parabéns, cara!

quinta-feira, novembro 19, 2009

Pastores e a religião negra

Em 20 de novembro, o Sol nasce negro. A aurora é negra. Dia da Consciência Negra. Quem não tem consciência são alguns pastores que sujam a Bíblica com as fezes de suas palavras preconceituosas. Pastores falam muita merda. Em verdade, não são pastores. Não passam de elementos que vagam à margem da ética, do bom senso; marginais que atiram contra a consciência negra.

Esses fanáticos com ensino médio incompleto satanizam a religião da cultura negra. Deveria ser crime. Deveriam estar orando e obrando atrás das grades. Só um escroque estúpido seria capaz de, em seus cultos incultos, espalhar o mau hálito de suas verborreias contra a umbanda, contra o candomblé.

Esses são embusteiros de um Deus cego, surdo e branco, porque esse Deus, reinventado por eles, é contra a diferença cultural. Em verdade, tais marginais da fé são filhos da discórdia, da incompreensão, da intolerência, ou seja, párias do demônio, de satã, de lúcifer, do diabo que os carregue.

Onde se prega a verdade absoluta, acredite!, aí reina o Mal. O demônio, meu amigo, também prega a verdade.

terça-feira, novembro 17, 2009

Os alunos e o caipira

Neste semestre, meus alunos leram textos relacionados a personagens marginais no Rappa, em Castro Alves, em Ferreira Gullar, em Cruz e Sousa, em Graciliano Ramos, em Ariano Suassuna, sem falar nos filmes "Jeca Tatu", "Tapete Vermelho" e "Auto da Compadecida".

Por meio desses textos, apresentei a eles o oposto ao senso comum. No caso dos filmes, destaquei a importância do caipira como oposição ao caubói. Pedi a eles uma crítica à cultua da Expo-Acre, lugar onde se sepulta a cultura do caipira.

Evidente que certos alunos não estão nem aí sobre qualquer assunto, mas, havendo minoria, eu leciono. Penso em outro momento retornar com a temática cultura popular, encarnada na imagem do caipira.

A Expo-Acre é um processo de aculturação da cultura caipira, por isso apresentei a eles as marcas desse homem rural na literatura e no cinema.

domingo, novembro 15, 2009

Tesão e direitos humanos


Ex-diretor da Capes, filósofo diz que opinião pública ignora a questão central no caso da aluna da Uniban: a esfera do desejo

RENATO JANINE RIBEIRO
ESPECIAL PARA A FOLHA

A universitária do microvestido conseguiu um milagre: juntou todo o mundo, da UNE à direita, na defesa dela e na condenação aos alunos que a insultaram e, depois, à universidade que quis puni-la. Mas há um viés na abordagem que me preocupa. O que atraiu a sociedade para o caso foi seu lado sexual. É o chamariz, tanto que a Folha levou uma atriz [vestida com minissaia] a quatro universidades do centro de São Paulo para ver se seus alunos são diferentes dos da periferia.

Mas, lançada a isca, a imprensa não fica à sua altura e vai opinar de maneira legalista. O sexo é chamariz, mas não é estudado. Já a educação é uma grande (outra) questão, mas também não é aprofundada. Começando pelo fim: a educação proporcionada pela Uniban está sendo questionada a partir desse caso, e não em sua qualidade. Que ela é criticada faz tempo, sabe-se. Mas está melhorando?

Por coincidência, como diretor que fui da Capes [Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior], responsável pela avaliação da pós-graduação brasileira, vi avanços da Uniban nos seus mestrados e no único doutorado. Não sei de sua graduação. Seria preciso avaliar se ela está melhorando ou piorando, em vez de ler generalidades que não respondem a essa pergunta central.

O outro aspecto é o cerne do caso. Uma vez deflagrada a polêmica, sumiu de cena o que a causou -o microvestido. Vi o advogado da aluna, de terno, defendendo seu direito de vestir-se como quiser. Foi uma síntese perfeita das contradições que o caso traz à luz. Para defender uma moça que gosta de mostrar o corpo, recorre-se à linguagem formal (e à roupa idem) da profissão jurídica. Fala-se dela como se fosse perseguida por ser judia, negra, comunista ou ter uma síndrome.

O sexo perturba
Só que ela não foi ofendida no fluxo dessas discriminações tradicionais, e sim porque gosta de mostrar o corpo. Por que essa questão central se perde na vagueza das fórmulas ("cada um é livre para fazer o que quiser", "para ir e vir" etc.)? Defendo essas liberdades. Mas, quando entra o sexo, ele as perturba.

No dia 22 de outubro, na Uniban de São Bernardo do Campo (SP), ela e centenas de jovens foram perturbadíssimos pelo sexo. Não adianta tentar, agora, abafar o assunto com generalidades legais -belíssimas, sim, fulcro de nossa civilização, mas pré-freudianas. Ou melhor: adianta.

É por isso que da esquerda à direita há um acordo geral. Um grande acordo para abafar o pequeno monstro. O monstro começa pelo desejo - que parece ser mais comum nas mulheres- de ser vista, admirada, desejada. A moça fez por isso. Não sabia o quanto estava despertando o monstro. Quando percebeu, deve ter-se assustado. Sorte, pelo menos, que ninguém foi machucado (ela não foi).

Mas o fato é que vimos o nervo exposto de algo que é mais atávico e forte que um preconceito contra judeus, negros ou, mesmo, mulheres. Entraram em cena uma sexualidade provocante e respostas, masculinas e femininas, a ela. Quer dizer que os rapazes tinham razão em xingá-la? Qualquer alfabetizado entenderá que não. Não tinham esse direito. Mas, que foram mexidos, foram. Que ela queria mexer com eles, queria. O que ela desejava de fato, ela provavelmente não sabe (Freud não saberia). Talvez, depois de tudo por que passou, não saiba mais. Nem eles, depois de expostos na mídia, saibam mais o que queriam.

Id e ego
De todo modo, a imprensa não se preocupou em saber como foi, nas cabeças de centenas de jovens que estavam lá, aquela noite. Alunos da Uniban mal foram entrevistados. Como as alunas que apareceram na TV discordavam da manifestação da UNE "em favor delas", a imprensa preferiu não aprofundar o assunto. Não dá para reduzir esse assunto à pauta dos direitos em geral ou das discriminações contra a mulher.

Não tem nada a ver com mulher não ser presidente ou CEO de empresa. Até porque nesse campo, o do desejo que o homem sente só por ver uma mulher bonita, ela tem um poder que ele não tem. Faz bem a universidade, em que o abscesso se rompeu, em discutir esse assunto à luz da cidadania? É essencial. Mas gostaria que não ficasse no genérico dos direitos humanos (que eu defendo, nem preciso repetir). Espero que saiba devolver à cena a questão importante que irrompeu naquela noite terrível: a questão do sexo em face da liberdade, da cidadania e tudo o mais. A questão do id em sua negociação com o ego. É uma grande questão, pouco tratada.

Mas não acredito muito. Falar na generalidade dos direitos humanos não afetará o âmago das pessoas, portanto é mais fácil. Não obrigará a discutir como lidar de maneira racional (a grande conquista da civilização, que inclui os direitos humanos) com o que é mais irracional em nós, sobretudo os mais jovens -um desejo desabrido a desafiar valores, interditos, tudo. Os rapazes podiam ser preconceituosos. Mas pareciam estar tarados por ela. A tara poderia vencer -ou reiterar- o preconceito. Como mudar o final do jogo, seu resultado? Eis a questão.
Como o tesão se relaciona com os direitos humanos? Dá para repetir o mantra de que uma mulher poderosa, desejável, ciente do que desperta nos homens, é ao mesmo tempo um sujeito racional capaz de deliberar em sã consciência se quer ou não um deles?

Dá para acreditar que um homem, assim excitado, facilmente aceite a decisão da mulher de negar-se a ele? O estupro é inadmissível, mas dizer que esses controles são fáceis é iludir a sociedade. [O sociólogo alemão] Norbert Elias entendeu bem a questão. Ele disse, décadas atrás: ao contrário do que se imagina, quando se exibe mais o corpo, sobretudo o feminino, exige-se mais -e não menos- autocontrole. Porque se requer do espectador que não ataque aquele corpo desejado.

Essa exigência é necessária? É. Mas é fácil? Não. Veja-se um baile funk. Vejam-se as publicidades na TV.

Um direito e um problema
Essa história tem sido lida como uma parábola do moderno e do reacionário. Moderno é a moça fazer o que quer com o corpo, inclusive mostrá-lo. Reacionário é ser contra isso.
Mas a atualidade intensa do conflito é que ele não tem essa temporalidade moderna, que é dos demais direitos humanos. Pois, por um lado, mexe com a libido, que tem fortíssima base natural e uma temporalidade muito mais lenta.

Por outro lado, a mulher se exibir o quanto queira é conquista recente. O homem não saber lidar com isso também é um dado acentuado recentemente. Há um elemento natural, há um confronto hipermoderno. A reação "conservadora" também é hipermoderna. O que não dá é para dizer que a moça se exibir não é problema, é direito. É direito, sim, mas só interessa a ela porque é problema. Alguém acha que [a apresentadora] Sabrina Sato imitaria a aluna se os homens não babassem por ela (Sabrina ou Geisy, não importa)?

É esse efeito que se quer produzir. É ele que, produzido, incomoda muita gente. E é esse incômodo -a consciência, o reconhecimento de que há um incômodo, um problema quase sem solução, o que Kant chamaria de uma antinomia- que incomoda muito mais.

O que devemos é enfrentar o incômodo, reconhecer sua originalidade. Desse ponto de vista, temos uma oportunidade ímpar, justamente porque difícil, de reflexão e de proposição.
-------------------------------
RENATO JANINE RIBEIRO é professor titular de ética e filosofia política na USP.

Obrigado!

"Há tempos gostaria de parabenizá-lo pelo seu blog. Tenho-o visitado diariamente e considero esse um ótimo blog pois é um misto de relato pessoal, opinião inteligente a respeito das questões do nosso tempo, em especial sobre a educação, e, ainda, tem se tornado um espaço de debate sobre linguagem, cultura e sociedade. Tudo isso, com uma boa dose de humor e sensibilidade. Parabéns, professor. Sei que o senhor não precisa de tais vaidades, mas um pouco de reconhecimento é essencial."

Gleyson

sexta-feira, novembro 13, 2009

Um dos melhores blogues do Brasil

Minha amada Mony colocou este blogue para ser avaliado e o resultado apareceu. Não sei ainda o porquê de LÍNGUA ter sido selecionado como um dos melhores blogues do Brasil. Irei procurar saber, talvez tenha sido engano.

VejaBlog
Seleção dos Melhores Blogs/Sites do Brasil!
http://www.vejablog.com.br

Parabéns pelo seu Blog!!!

Você está fazendo parte da maior e melhor
seleção de Blogs/Sites do País!!!
- Só Sites e Blogs Premiados -
Selecionado pela nossa equipe, você está agora entre
os melhores e mais prestigiados Blogs/Sites do Brasil!

O seu link encontra-se no item: Blog

http://www.vejablog.com.br/blog

- Os links encontram-se rigorosamente
em ordem alfabética -

Pegue nosso selo em:
http://www.vejablog.com.br/selo


Um forte abraço,
Dário Dutra

http://www.vejablog.com.br

Ronda Escolar

Corpo de jovem apodrece em escola estadual
De Aldo Nascimento

Há dias, um corpo em avançado estado de putrefação pode ser visto na escola Humberto Soares, situada em Rio Branco, capital. O cheiro é insuportável. Trata-se de um cadáver feminino. Os mais estranho é que professores, alunos e direção, até hoje, não chamaram a polícia.

Testemunhas afirmaram que viram quando um homem alto, mole, lesado e sem ânimo para viver esfaqueou a vítima em sala de aula perante o professor de Literatura e dos alunos. Um minuto antes do intervalo da manhã, às 10 horas, a tragédia ocorreu.

"Pelas características do assassino, mole, sem ânimo, só pode ser o homem que sempre anda pela escola todo dia, deve ser o sr. Preguiça", disse uma aluna do ensino médio.

Sobre a vítima, sabe-se apenas que era uma jovem de 15 anos e se chamava Aula. Quando a reportagem do blogue Língua perguntou à diretora sobre o corpo em decomposição na escola, ela foi indiferente.

"A minha filha estuda em escola particular, por isso eu não tô nem aí se na escola pública estudantes matam Aula."

Comenta-se que o assassino Preguiça matou a jovem a mando da diretora. Por causa disso, segundo fontes, a escola Humberto Soares tem dispensado seus alunos bem antes do horário correto e, dessa forma, mata-se uma Aula por semana. É uma chacina.

quinta-feira, novembro 12, 2009

Redação. Presente.

Há quase 20 anos lecionado Literatura e Língua Portuguesa, acredito que eu tenha aprendido algo sobre produção textual, assunto que chegou aos meus ouvidos em 1986. De lá para cá, erros e acertos, leituras e releituras para aprender e, depois, lecionar menos pior.

Nesses anos, nunca... jamais reclamei de meus alunos. Sempre me queixei de mim, de meus limites, de uma sensação incômoda de ser incompleto para eles. Na minha cabeça, quem deve sempre aprender primeiro sou eu.

Nesses anos, portanto, aprendi com eles a lecionar produção textual e, dessa forma, criei meu método conforme a realidade da sala de aula. Desde agosto, meus alunos da escola Heloísa Mourão Marques, rede estadual acriana, reescrevem seus textos, no caso, para iniciar, só a INTRODUÇÃO.

Que batalha! Muitos me dizem que nunca reescreveram seus textos em sala, nunca. Por causa dessa ausência de "refazer a escrita", eles chegam ao segundo ano do ensino médio sem noção - que absurdo ! - de ponto contínuo. Quem foram seus professores no ensino fundamental?

Muitos são os problemas. Só não posso reclamar de meus alunos, olhar para suas redações e reclamar, reclamar, reclamar, reclamar, reclamar, reclamar, reclamar, reclamar. Um médico não reclama quando doentes e mais doentes chegam ao hospital. Se sou professor, se me escolhi para lecionar, não posso reclamar de minha escolha.

Diante de meus olhos, erros e mais erros, consequência de professores indiferentes à produção textual em sala de aula.

Com aulas de redação só às terças-feiras, iniciamos uma longa procissão textual, caminhando com o Enem de 2005, um dos mais difíceis.

Evidente que outras atividades houve, mas a maioria voltada para a organização interna ou para a retomada de ideias. Penso ser grave não haver organização textual no segundo ano do ensino médio.

Exercícios escritos adequados e gincana do conhecimento para esse tipo de problema foram criados. Hoje, observando os textos após 16 aulas, vejo que há transformações, houve algum tipo de melhora. Outros escritas avançaram mais.

Meus alunos podem falar mal de mim, eles só não podem falar que eu não dou aula e que não exijo, sem reclamar.






quarta-feira, novembro 11, 2009

Dica & Dica & Dica & Dica

Alunos, sempre digo a seus ouvidos que assistir a ótimos filmes e a ótimos programas amplia nossa compreensão da vida, das relações humanas. Deixe as novelas de lado e assista à TV Cultura. Um bom programa ajudar a ter ideias para uma redação escolar.

Lygia Fagundes Telles estreia série sobre grandes nomes da literatura brasileira

A escritora Lygia Fagundes Telles estreia a série "Autor por Autor", que pretende traçar perfis de grandes nomes da literatura em programas de 52 minutos. Produzida pela TV, a série estreia nesta quarta-feira (11), às 22h, na TV Cultura

terça-feira, novembro 10, 2009

Bom apetite!

Notas sobre o casamento
A obra de Nan Goldin revela-nos o caráter sagrado da repetição

Francisco Bosco

















Numa entrada de 18/11/1956, Susan Sontag anuncia em seu diário o projeto de escrever "Notas sobre o Casamento". Não conheço muito de sua obra, tendo lido apenas um punhado de ensaios de sua autoria, logo não sei se ela levou adiante o projeto. Em entradas anteriores e posteriores do primeiro volume de seus Diários - 1947-1963 (Companhia das Letras, 2009), entretanto, há algumas observações que deveriam constar dele.

Com base nelas - faz parte da admiração intelectual herdar o desejo do outro -, tomo para mim, aqui, a tarefa de escrever algumas notas sobre o casamento. É oportuno esclarecer que as observações de Sontag que vou comentar (servindo-me delas apenas como ponto de partida para outras percepções que lhes são independentes) dizem respeito à experiência da autora com Philip Rieff, com quem se casou aos 16 anos (e de quem se separaria seis anos depois), e, o que é mais importante, num momento de confusão e angústia com a própria sexualidade.

Apesar de estar vivendo no Estado mais liberal da Califórnia, esse momento de sua adolescência situa-se nos anos 1950, portanto antes da explosão da revolução sexual, e fica claro que Sontag ainda lutava consigo mesma contra a estigmatização da homossexualidade. Acredito que a unilateralidade de seus julgamentos, cujo pessimismo incorre quase sempre em generalizações e reducionismos, deva-se decisivamente aos tormentos psicossociais que estão no cerne de sua resolução intempestiva de realizar um casamento heterossexual. Resolução assim relatada em seu diário (3/1/1950): "Casei com P. com plena consciência + medo de minha própria vontade apontada para a autodestrutividade".

As observações de Sontag sobre o casamento convergem para dois juízos principais: o de que o casamento se resume a um movimento inercial, preso a uma lógica da repetição, e o de que ele, em vez de aguçar, embota os sentimentos. Esses dois aspectos podem ser conferidos na entrada de 4/9/1956: "Quem inventou o casamento foi um torturador astuto. É uma instituição destinada a embotar os sentimentos. Toda a questão do casamento se resume na repetição. O melhor que ele almeja é a criação de dependências fortes e mútuas". Um pouco adiante, na entrada de 18/11/1956, Sontag prossegue no registro veemente: "Casamento se baseia no princípio da inércia. Proximidade sem amor". Para mim, contudo, Sontag não poderia estar mais equivocada.

Há uma obra da fotógrafa norte-americana Nan Goldin que me ajudará a argumentar em outro sentido. Essa obra, Heartbeat, apresenta-se como cinco séries de fotos que, projetadas sobre uma tela, vão dispondo, cada uma, dezenas de instantâneos, à maneira de um filme drasticamente ralentado. Cada série leva o nome dos membros do casal que a protagoniza e um subtítulo (que é um comentário de Nan Goldin sobre o que ela considera a experiência desse casal: por exemplo, Joanne et Aurelie - French Kiss). As fotos, trazendo o olhar característico de Nan Goldin, mostram cenas banais da intimidade, do cotidiano dos casais. Em composição com elas, e duplicando o fluxo temporal em que elas vão se sucedendo, ouve-se uma magnífica - solene, pungente, pode-se dizer mesmo sacra - canção interpretada por Björk. À medida que as fotos vão passando, ocorre uma verdadeira (aqui lamento o trocadilho) revelação.

A sucessão dos instantâneos não produz uma narrativa para a frente, no tempo, mas sim para baixo, fazendo surgir outra dimensão, de uma profundidade vertiginosa, profundidade que também não se situa no espaço. Mais precisamente, do eixo horizontal da narrativa emana um eixo vertical cuja dimensão, nem temporal nem espacial, é, justamente, aquela da experiência amorosa no casamento. Esse eixo vertical é característico da experiência do casamento porque resulta da repetição unida à intimidade. Assim, a verdadeira consequência da repetição, no casamento, é produzir uma diferença de radicalidade muito maior do que as diferenças que se situam em seu plano horizontal, e que ele, pode-se dizer, até certo ponto barra ou dificulta. A repetição, assim, gera e sustenta um eixo vertical e vertiginoso que é a um tempo o lugar da salvação e do trágico.

Tentemos compreender isso. Toda relação erótica configura uma passagem. O verso do poeta emerge de uma abertura do mundo à sua linguagem (ou, talvez mais exatamente, dentro dela), assim como o desejo sexual é um canal aberto que conduz uma pessoa à outra. Eros se deixa reconhecer (também) por essa passagem. Mas o eixo vertical a que me refiro é outra coisa. Sua existência depende, seguramente, de manter-se aberta uma passagem, mas o que caracteriza seu ser não é o desimpedimento, a liberdade da passagem, e sim seu poder gravitacional, sua força que impele para baixo. Esse "para baixo", é preciso compreendê-lo num sentido ontológico (não importa que ilusório): sua gravidade alivia-nos da leveza insustentável de nossa condição ontológica, de seu absurdo irredimível (é esse também o sentido do romance de Kundera). É, portanto, a meu ver o amor, e não o erotismo, o que nos ilude de nossa descontinuidade fundamental, para usar o conceito de Bataille.

Eros, como disse, é, sim, uma passagem - mas que leva, um a outro, por uma súbita abertura, dois seres descontínuos, sem que sua descontinuidade essencial seja abolida por essa passagem. É somente no eixo vertical da experiência amorosa, nessa sua dimensão específica, que o outro se revela como capaz de doar um sentido, uma espécie de gravidade ontológica, atando o ser, que é solto, a algo que o transcende e justifica. É a isso que creio que Guimarães Rosa se referia ao dizer que o amor "é um descanso na loucura".

E é à luz disso que se deve entender, num sentido não neurótico, a dependência produzida pelo casamento, a que Sontag se refere. A dependência não tem necessariamente caráter neurótico, tampouco reduz-se ao problema da redistribuição libidinal (tópica freudiana do luto). A dependência tem a ver, numa instância superior, com o trágico: perder o ser amado é perder essa gravidade ontológica sem a qual imediatamente nos transformamos em uma espécie de astronautas da terra - flutuando, sem "descanso", no infinito da existência.

Um casamento sem Eros, ou com Eros debilitado, deve, apesar de tudo, ser desfeito. Eros, é claro, não se reduz ao sexo; sua presença verifica-se em tudo que, no outro, pelo outro, nos vitaliza, contribui para o aumento de nossas potências. O contrário de Eros é a neurose, a repetição sem diferença, sem transformação, a manutenção de laços paralisantes, a dependência, em suma, por covardia existencial.

Voltando à obra de Nan Goldin, nela um único verso, insistente, é entoado por Björk: " Lord, Jesus Christ, son of God, have mercy upon me". Ouvimo-lo repetidamente, enquanto vemos as fotos. Seu sentido está ligado ao trágico da experiência amorosa (e a um deleuziano modo de ser atravessado por forças maiores do que se pode aguentar), à possibilidade de perda do outro. A obra de Nan Goldin, em tempos de superficialidade e anestesia afetivas, revela-nos, para dizer de forma quase obscena - e certamente cafona -, o que significa, ou significou, morrer de amor.

Significa, justamente, a perda desse fundamento ontológico que se torna o outro. " Have mercy upon me": a mercê de Cristo é tanto a doação do amor quanto a súplica para que não nos seja retirado. Barthes, ao perder a mãe (com quem, e só com quem, foi, de certo modo, casado), imprecava: "Quem foi o Lúcifer que inventou o amor e a morte ao mesmo tempo?". Mas, talvez, sem a morte não houvesse o amor: os anjos têm amor pelos mortais, não por outros anjos.

14º salário desde que com mérito

Comissão de Educação do Senado aprova 14º salário para professor
Da Redação*
Em São Paulo

A Comissão de Educação, Cultura e Esporte do Senado aprovou nesta terça-feira (10) um projeto de lei que institui o 14º salário para profissionais da educação básica da rede pública de ensino. A proposta seguirá para análise da Comissão de Assuntos Econômicos e depois, para a Comissão de Assuntos Sociais.

Se for aprovada nas duas próximas comissões, será enviada para a análise da Câmara dos Deputados.

A medida é de autoria do senador Cristovam Buarque (PDT-DF) e teve como relator o senador Marconi Perillo (PSDB-GO), autor do substitutivo que obteve a aprovação.

De acordo com o projeto, para ter direito ao 14º salário em dezembro, os profissionais da educação básica pública precisam elevar o Índice de Desenvolvimento da Educação Básica de sua escola em pelo menos 50%.

O benefício também será pago aos profissionais que alcançarem o Ideb igual ou superior a sete. O projeto ainda estabelece que o pagamento do 14º salário deverá ocorrer até o final do semestre subsequente ao da publicação dos resultados do Ideb.

Na discussão do projeto, Cristovam explicou que a medida não cria competição entre os professores, pois serão beneficiados todos os docentes da escola que cumprir a exigência de elevação do Ideb.

"O que vai ocorrer é uma cobrança de uns professores sobre os outros", disse, citando como exemplo a pressão que deverá ocorrer sobre professores que faltam muito e que, com esse comportamento, poderão prejudicar os demais.

* Com informações da Agência Senado

segunda-feira, novembro 09, 2009

Violência chique. VLG

Hoje, à noite, a loja VGL Sport foi assaltada em Rio Branco. Um segurança morreu. Moro neste Estado há quase 18 anos e nunca soube de tantos assaltos. A riqueza material - prédios, lojas, vitrines, carros, estradas - confunde-se com progresso, desenvolvimento.

Rio Branco deixou de ser calma. Ela, hoje, assusta-me.

"Suíça do Norte", disse um político sobre o Acre. Ele tem razão, a violência é fria, sem os Alpes.

Por que não colocamos nossos filhos em escola pública

Hoje, procurei uma escola particular para a minha filha estudar em 2010. Estou insatisfeito com a atual. Cheguei ao estabelecimento de ensino por volta das 10 horas. "Por favor, a professora irá atendê-lo para falar da escola, da mensalidade", disse-me a simpática atendente.

Após alguns minutos, conduziram-me à sala da professora. Sentei-me à mesa, e ela iniciou sua exposição sobre a escola. "Nosso ensino é tradicional", sentenciou logo de cara. "Aqui, meninas não usam batom, não pintam o rosto, não usam brinco porque nós não aceitamos modismo."

Alunos não usam celular, não há festas para datas comemorativas. Não existem reuniões com pais. Caso haja algum problema, o responsável é chamado para uma conversa particular. Se o aluno não conluir o dever de casa, ficará após o término das aulas para terminá-lo.

Ordem. Paga-se caro para que filhos sejam submetidos à ordem.

sexta-feira, novembro 06, 2009

Alunos, leiam...


Fernão Capelo Gaivota, esse pássaro-protagonista que representa o ser humano que voa muito além da multidão, do bando. Todo dia, gaivotas se alimentam com os restos de peixes que pescadores jogam ao mar.

Por que comer as sobras que outros nos dão? Por que não comer peixes frescos?

Capelo precisa voar mais alto e, para tanto, precisa voar melhor, porque, se não for assim, ele não pegará os peixes que estão no fundo do mar.

Lemos bons livros para perder a condição de tolos. Alunos, não se acomodem com o que dão aos seus destinos. Superem seus limites, sabendo que, para superá-los, os obstáculos são necessários. Não fortalecemos os músculos com pesos leves como os pesos da acomodação.

Inquietem-se!



quinta-feira, novembro 05, 2009

Tiago vai a Brasília

O pai trabalha como mestre de obra e a mãe, em serviços gerais. Por mês, a renda não ultrapassa os R$ 800. As dificuldades, entretanto, não modelaram o espírito de Tiago Araújo de Sousa, de 17 anos, terceiro ano do ensino médio. Ele foi além. Entre estudantes do Acre, o primeiro.

Está preparando as malas para pousar em Brasília porque foi premiado. Ele representará o Acre por ter elaborado um projeto de lei que torna obrigatória a arborização de vias, de praças e de centros urbanos das grandes cidades do país.

"Irei a Brasília para conhecer o funcionamento do Senado, da Câmara dos Deputados e os representantes de cada Estado", disse o jovem.

Em uma escola onde não havia norma, regras, é uma ironia do destino um aluno da Heloísa Mourão Marques receber um prêmio por causa de um projeto de lei.

Parabéns, rapaz!

quarta-feira, novembro 04, 2009

Condenação Fatal

De Cruz e Sousa [1861-1898]













Ó mundo, que és o exílio dos exílios,
um monturo de fezes putrefato,
onde o ser mais gentil, mais timorato
dos seres vis circula nos concílios;

Onde de almas em pálidos idílios
o lânguido perfume mais ingrato
magoa tudo e é triste, como o tato
de um cego embalde levantando os cílios;

Mundo de peste, de sangrenta fúria
e de flores leprosas da luxúria
de flores negras, infernais, medonhas.

Oh! como são sinistramente feios
teus aspectos de fera, os teus meneios
pantéricos, ó Mundo, que não sonhas!

terça-feira, novembro 03, 2009

Zangado

As pessoas mal-humoradas possuem uma inteligência mais afiada segundo um estudo realizado por um cientista australiano e publicado na última edição da revista científica Australasian Science, informou hoje a rádio ABC.

"A tristeza e o mau humor melhoram a capacidade de julgar os outros e também aumentam a memória", assegura o professor Joseph Forgas, da Universidade de Nova Gales do Sul, em Sydney.

O mau humor melhora a atenção e proporciona prudência, segundo o artigo

"Enquanto um estado de ânimo positivo facilita a criatividade, a flexibilidade e a cooperação, o mau humor melhora a atenção e facilita um pensamento mais prudente", explica o artigo.

"Nossa pesquisa sugere que a tristeza melhora as estratégias para processar a informação em situações difíceis", acrescenta.

Forgas ressaltou que as pessoas com um estado de ânimo mais decaído possuem maior capacidade de argumentar suas opiniões por escrito, pelo que concluiu que "não é bom estar sempre de bom humor".