sexta-feira, maio 23, 2008

Teatro Giramundo



De Aldo Nascimento

As Relações Naturais”, de Qorpo Santo

Li e reli o belíssimo texto da professora-doutora Maria do P. Socorro Calixto Marques, publicado no jornal A TRIBUNA, em 18 de maio. Profundo e muito bem-escrito, a professora faz jus ao seu título de doutora, dominando com habilidade os signos lingüísticos que compõem o texto ficcional As Relações Naturais. Como intelectual do Departamento de Letras da Universidade Federal do Acre, Socorro Calixto cumpre sua missão de refletir sobre o que se manifesta na sociedade, nesse caso, uma peça de teatro.

Por causa dessa publicação, motivei-me a assistir à peça As Relações Naturais, escrita por José Joaquim de Campos Leão (auto-apelidado de Qorpo Santo, de 1829 a 1883), representada pelo grupo de teatro Giramundo. Não me atrevo ser profundo como a doutora, mas, nessa breve coluna, escrevinharei em parte sobre o que assisti, repito, em parte, porque, em poucas linhas, algo fugirá entre meus dedos.

Autor-personagem
À mesa, ao lado esquerdo do palco, de frente para a platéia, surge um boneco, é Qorpo Santo. Do que falou, ouço ainda o tempo em que ele se situa, 14 de maio de 1866; tempo situado em Porto Alegre, capital da Província de São Pedro do Sul. Para muitos, Império do Brasil. “É isto uma verdadeira comédia”, ri o homem que no final do século 19 viveu parte de sua vida no hospício. Qorpo Santo encontra-se em seu próprio texto ficcional

Após seu riso, ele mesmo deixará de ser sério, colocando no rosto uma máscara de truão. José Joaquim de Campos Leão se entregará à comédia absurda, ao exagero, à devassidão. Ele, um fanfarrão. "Vou, portanto, vestir-me e sair para depois rir-me e concluir este meu útil trabalho.” Pouco depois, a luz se apaga nele para iluminar sua imaginação em uma casa de marionetes.

O escritor, nesse momento, também é marionete, personagem que troca palavras com Consoladora. Ela sabe que ele deseja mulheres fogosas e deixa-o ir embora. Logo depois, uma adolescente de 16 anos, com vestido branco, entra em cena para se opor aos desejos carnais do autor-personagem.

Sempre entendo que a mulher como o homem é um ente que ser por todos respeitado, como a segunda primorosa obra do Criador; e que, assim, não sendo, só milhares de males e transtornos se observarão na marcha geral da humanidade!”, repreende a garota.

Ela sai de cena e logo retorna com asas para voar como anjo. E parte. Nesse momento, evidencia-se no texto ficcional que o sagrado se ausentará das relações naturais.

Ordem e desordem
Sem anjo, a casa pertence a uma família: três filhas, três filhos, pai e mãe. Há também um criado, o Inesperto. No terceiro ato, cena primeira, ele surge para dizer que limpa a casa, mas a família a suja. A casa, portanto, é ambígua, porque, em suas relações naturais, ordem (limpeza) e desordem (sujeira) confundem-se, misturam-se. A mãe abençoa os três filhos, vai à igreja com as três filhas; contudo, elas se prostituem, e uma delas é travesti. Esposa do judeu Malherbe, a mãe usa um vestido vermelho, semelhante a uma cafetina. Mildona, uma das filhas, mantém relações sexuais com o pai. “O Sr. Não reparou bem, eu não sou a sua encantadora filha; mas a jovem a quem o Sr., em vez de amizade, sempre há confessado tributar amor!”, diz ao seu genitor.

Ora, sem anjo, sem o sagrado - sugiro a leitura de O sagrado e o profano, de Mircea Eliade, da Martins Fontes -, a casa só poderia cair no inferno, por isso pega fogo, por isso sua destruição segundo disse a garota de forma angelical antes de partir: “E que, assim, não sendo, só milhares de males e transtornos se observarão na marcha geral da humanidade!".

Assim, onde pulsa a obsessão da carne, da devassidão; onde o desejo carnal não encontra limites e expulsa o sagrado, mãe e filhas sentenciam: “Enforquemos tudo quanto é autoridade que nos quer estorvar de gozar, como se estivéssemos em um paraíso terreal.” Após o enforcamento, o pai é esquartejado pelo criado.

A Gazeta

Em de maio deste ano, o jornal A Gazeta publicou a seguinte legenda na capa:

"Carlos Franco, professora Margarida, professor Pascoal e Olinda concorrem à vaga na reitoria da Universidade."

A questão é essa “vaga” e esse "na". Este não determina qual vaga, podendo concorrer à vaga de secretário, por exemplo. Aquele é termo inadequado para a função. Melhor teria sido “concorrem ao cargo de reitor”.

Esse "na" é semelhante a Sindicato dos Trabalhadores na Educação. O "na" não determina que esses trabalhadores são da educação.