terça-feira, dezembro 28, 2010

Quando chegarmos...

à Região dos Lagos.

Em Maricá, Rio de Janeiro, as ondas e as areias - menos em Ponta Negra - exibem imagem selvagem.

Em certos trechos, sentimos o cheiro da solidão. Gosto de suas praias por ficar diante do deserto do mar e no deserto da praia.

Igual a uma igreja, o silêncio de Maricá é sagrado. Limpa-me.

Muitas vezes, nessas praias, juramos Amor Eterno, mas nem o mar é eterno. Nada se eterniza no que é humano. Se você me disser que Abelardo e Heloísa, que Romeu e Julieta e que Tristão e Isolda são eternos, digo-lhe apenas que esses casais nunca viveram juntos o peso das horas.

O movimento romântico do século 19 os idealizou porque a morte os separou antes do convívio, antes de surgirem os erros, as decepções. Eles podem até atravessar a moldura do tempo, mas isso ainda não é eterno, até o Deus do Novo Testamento não é igual ao Velho.

Eu te decepcionei, mas você também me decepcionou. Somos mortais. Nesses anos, des-cobrimos nossas falhas, e o eterno tornou-se menor. Talvez agora, quem sabe, o Amor dê sinais de vida nesse espaço menor, tamanho dos erros humanos.

Será que seremos capazes? Será que pulsa em nós tamanha força? Me responda quando as ondas de Maricá molharem nosso cansaço.
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No dia 30 de janeiro, retornarei a este blogue. Que em 31 de dezembro, à meia-noite, você erga um brinde à vida recomeçada.

terça-feira, dezembro 21, 2010

Tenho de ir!

Última postagem deste ano. Quando retornarei, ainda não sei. A única verdade é que tenho de me ausentar por um longo tempo. Silêncio.

Mas, antes, deixo a teus olhos os versos de um poeta que me fascina pelo vigor desobediente de sua inquieta juventude. A poesia chama-se "Minha boêmia".

Lá ia eu, de mãos nos bolsos descosidos;
Meu paletó também tornava-se ideal;
Sob o céu, Musa, eu fui teu súdito ideal,
Puxa vida! a sonhar amores destemidos!

O meu único par de calças tinha furos.
- Pequeno Polegar do sonho ao meu redor
Rimas espalho. Albergo-me à Usa Maior.
- Os meus astros no céu rangem frêmitos puros.

Sentado, eu os ouvia, à beira do caminho,
Nas noites de setembro, onde senti qual vinho
O orvalho a rorejar-me a fronte em comoção;

Onde, rimando em meio a imensidões fantásticas,
Eu tomava, qual lira, as botinas elásticas
E tangia um dos pés junto ao meu coração!

Aprecio esses versos por causa de sua vertiginosa liberdade ("Albergo-me à Ursa Maior"). Sob estrelas, hospeda-se. Esse é o maior bem de um ser humano, a liberdade. Mas quem pensa que ela significa fazer o que bem entende... engana-se.

Somos livres para haver o encontro, porque, se muitas vezes não sabemos explicar, pelo menos sentimos na pele que o outro nos liberta. Penso que a liberdade só possui esse sentido. Quando estamos sozinhos, estamos presos a nós mesmos, angustiados por grades que não vemos.

É o outro que nos oferta o gozo. Rimos porque estamos com alguém. Rir sozinho é loucura. Ausência de liberdade implica o que o Espírito não pode realizar, e uma das maiores realizações é se comover no momento de um encontro. Ser afetado. Afetar alguém.

Mas, depois, no final de tudo, estaremos sozinhos. A velhice virá. A dor brotará em nós. Não se negocia com a morte. No final, sempre perdemos nas esquinas solitárias, nas multidões que não nos enxergam.

No leito de um hospital, sempre perdemos os amigos. Em nossa própria casa, perderemos nossa mãe. No final, já disse, sozinhos ficaremos diante da tevê ou da tarde chuvosa.

Mas que o fim não nos desanime. Se a liberdade nos deu os encontros que agora pulsam em nós como boas lembranças, deixemos nos lábios a doçura do sorriso porque tudo, tudo mesmo, foi liberdade.

Para conhecer melhor o autor dos versos de "Minha boêmia", assista ao filme "Eclipse de uma paixão". Arthur Rimbaud fascina.

Agora, tenho de ir para o silêncio de minhas lembranças.

segunda-feira, dezembro 20, 2010

Muita calma nesta hora

"Professor, queremos informar ao senhor que em seu pagamento deste mês haverá uma quantia menor", telefonou uma funcionária da Secretaria de Educação.

"Quanto?"

"Não sabemos."

Na sexta, vi meu contracheque. A secretaria depositou menos R$ 670.

Feliz Natal!

quinta-feira, dezembro 16, 2010

O Deus que ofertei aos olhos teus

Havia teus seios erguidos. Havia tua bunda sorrindo. Havia tua vulva escondida. Havia tuas coxas indo...

Mas a felicidade de um encontro mais íntimo não habita em tuas partes "sem-vergonhas". Eu desejava tão somente me erguer acima de teus montes firmes, de teu ventre suado, de tua relva úmida.

Eu desejava tão somente contemplar a paisagem de teu rosto. Era teu rosto que eu desejava, porque nele, naquele momento de transe, eu fixei a verdade de meus olhos nos teus para dizer...

abençoada seja a vida, meus Deus, nesta hora em que meu gozo me salva da vulgaridade do mundo.

E, quando minha carne se alargou mais ainda sobre a tua, no momento-luz de meu libertário gemido, arregalei minha visão para, em meu êxtase, evocar o nome do meus Deus na cama.

Deve haver algo de Espírito Santo no orgasmo de quem se ama.

Aprendi contigo que o que menos importa na cama é o corpo. Era teu rosto que eu desejava para ofertar o meu Deus aos olhos teus.







quarta-feira, dezembro 15, 2010

"O Pequeno Príncipe"

Ficou tão fácil transar. As ofertas, muitas. Tantos corpos no mercado. A demanda, imensa. Nesses tempos de vulgaridade alegre, falta aquele ser humano único.

Ficou tão fácil transar. Difícil ficou “entrelaçar”. Ficou difícil “criar laços”.

Porque sempre estão à sua caça, ela foge dos humanos. Mas fugir aqui significa mais do que não ser apanhada; representa não ser tocada. Assim, para fugir, a caça despista os caçadores, engana-os. Mente para viver. Sua liberdade, portanto, é não se expor ao outro.

Até que...

"O Pequeno Príncipe" surge para ela. Inicia-se um dos mais belos diálogos para crianças, jovens e adultos.

- Tu não és ainda para mim senão um garoto inteiramente igual a cem mil outros garotos. E eu não tenho necessidade de ti. E tu também não tens necessidade de mim. Não passo a teus olhos de uma raposa igual a cem mil outras raposas. Mas, se tu me cativas, nós teremos necessidade um do outro. Serás para mim único no mundo. E eu serei para ti única no mundo...

Como ser único? de que forma ser para o outro o incomum? como não ser igual a cem mil outros?

- Minha vida é monótona. Eu caço as galinhas e os homens me caçam. Todas as galinhas se parecem e todos os homens se parecem também. E isso me incomoda um pouco", e a raposa dá a resposta definitiva. "Mas, se tu me cativas, minha vida será como que cheia de sol. Conhecerei um barulho de passos que será diferente dos outros. Os outros passos me fazem entrar debaixo da terra. Os teus me chamarão para fora da toca, como fossem música. E depois, olha! Vês, lá longe, os campos de trigo? Eu não como pão. O trigo para mim não vale nada. Os campos de trigo não me lembram coisa alguma. E isso é triste! Mas tu tens cabelos dourados. Então será maravilhoso quando me tiveres cativado. O trigo, que é dourado, fará com que eu me lembre de ti. E eu amarei o barulho do vento no trigo...

A única resposta dada pela raposa: cativar. Transar ficou tão fácil. Difícil é "criar laços", isto é, cativar, ser cativante.

Dessa forma, o Pequeno Príncipe, o ser que cativou, será, por causa de seu cabelo dourado, recordado quando a raposa olhar o campo de trigo.

Última...

Ontem, por meio da fotógrafa Talita, conheci as palavras do blogue "Confraria dos Últimos Românticos". Gostei. É uma juventude que sabe pensar. Em tempos de crise do romantismo, esse blogue escreve sua própria fragilidade.

Recomendo aos que não são vulgares.

terça-feira, dezembro 07, 2010

De volta ao futuro [da escola]

Ontem, ao colocar os pés na escola, alunos colocaram em mim seus afetos. Escola. Há 20 anos, dedico minhas palavras a ela como um sacerdote prega a palavra em uma igreja, só que eu sou uma comunhão entre o sagrado e o profano, a obediência e a desordem.

Hoje, após tantos anos, aprendi a contragosto que a igreja ensina mais [e pior] do que a escola. Se no templo o preconceito contra homossexuais é questão de fé, a escola não sabe educar para que o homossexualismo seja humanizado. Escola pública é lugar onde não se aprende.

Aprende-se na igreja. O fanatismo nos educa. A Bíblia é nosso único livro. Na escola, não se lê; só os pastores [ sem muita ilustração] leem e seduzem a massa de fiéis à ignorância.

A vida, que é absurdo, não passa de inutilidade. Somos como Sísifo: estamos condenados a carregar a pedra ao topo do monte para deixar a pedra rolar, para levá-la outra vez ao topo do monte.

A vida, tamanho de pedra, não tem sentido; Albert Camus, no entanto, nos ensina que, embora seja pedra, devemos dar a ela sentido. Quando levamos a pedra, nesse momento, devemos dar sentido ao nosso ato.

Por isso, recebo o afeto de meus alunos porque, nesses 20 anos, ainda consigo dar sentido à palavra que pulsa na sala de aula. Confesso, contudo, que minhas palavras andam cansadas de mim.

Elas querem ir embora de minha alma. Confesso que restam poucas forças para mantê-las em mim. Algumas partiram em uma noite fria, chovia. Outras se mataram com o punhal da descrença nos homens. Sinto que não posso salvá-las.

Sinto que, sem elas, morro aos poucos. Mas ainda tenho afetos de meus alunos. Afetos, palavra que ainda permanece viva, não foi embora.

Professor Josenir Calixto

Ontem, na Secretaria de Educação, eu soube que o atual diretor do ensino médio, professor Josenir Calixto, poderá lecionar em 2011 na escola Heloísa Mourão. Mais: poderá se candidatar a gestor da escola.

O que penso sobre isso?

Bem, se eu não cometer suicídio antes, se eu não pedir licença-prêmio antes, se eu não pedir afastamento sem ônus antes ou se eu não ir embora do Acre antes, o professor Josenir Calixto terá meu irrestrito apoio, e olha que eu consigo alguns votos.

Espero que ele venha.