quarta-feira, setembro 12, 2007

Reunião com os pais (2)












Quase um ano depois, a reunião com os pais revelou, mais uma vez, uma organização inadequada.

Na foto, o professor entrega os boletins aos pais em um espaço a serviço da desorganização. Quando lanço minhas críticas agudas, alguns se contorcem, porque erram demais.

São pais humildes, pessoas que recebem muito menos que um diretor de escola. Um diretor coloca no bolso, segundo informações, R$ 3,9 mil por mês, limpo, limpo, limpo.

Muitos pais recebem salário-mínimo ou salário mínimo. Alguns caminharam do Aeroporto Velho até a escola para receber as notas dos filhos e, quando chegaram à escola, um modelo de organização não acolhe os pais com atenção.

Eu, por exemplo, entreguei as notas depois das 11h25, isto é, após minha carga horária. Estava sozinho diante de pais impacientes por causa do relógio. Não pude dar atenção devida aos pais cujos filhos obtiveram notas ruins.

A escola, mais uma vez, não reconheceu diante de todos os bons alunos, jovens exemplares que se dedicam para não repetir os erros de seus pais. Edificar um novo destino.

Como servidor do estado do Acre há dez anos, entristeço-me com uma escola pública ainda desorganizada, com uma escola que revela sua incapacidade de qualificar até uma reunião com os pais.

Não deveria ser assim. Um diretor recebe bem e deveria ter o mínimo de inteligência e de sensibilidade para prestar um serviço ótimo a pessoas tão simples. Vontade de trabalhar, de suar a camisa.

Critico & proponho

Reunião não pode ser em dia de semana. O professor, como sabemos, não trabalha em um dia da semana - é o chamado dia de planejamento pedagógico, mas que nunca ocorre -, e esse dia, repito, sem trabalho, deveria ser transferido para sábado a fim de que houvesse a reunião entre pais e educadores.

Reunião não com todos os anos do ensino médio. Em um sábado, só com o primeiro ano. Em outro, só com o segundo. Em outro, só com o terceiro ano do ensino médio.

Em um sábado, por exemplo, no auditório da escola, reconhecer os bons alunos, jovens que são exemplos para outros. Para isso, alguém que saiba falar bem e que saiba expor palavras com firmeza de caráter e de ideais.

Se possível, premiá-los.

Em outro momento, um encontro entre professores de uma turma com os pais e com os filhos que não obtiveram boas notas e que não se comportam à altura. Para tanto, os conselhos de turma deveriam funcionar.

As idéias estão aí. No entanto, infelizmente, erros se alargam. Por que pessoas que se candidatam a gestor escolar não transformam o mundo a partir da escola? Porque isso exige disciplina, vontade de trabalhar. Isso exige a inteligência do sensível.

Antes de exigir do outro, exigir, primeiro, de si mesmo. Se quero meus professores às 7 horas em sala, eu, o diretor, devo chegar 15 minutos antes. Quem não sabe dar bons exemplos jamais terá bons imitadores, já dizia o velho Aristóteles.

No setor público, o salário deveria ser uma conseqüência de resultados. Não é. Candidatam-se alguns a gestor de escola para ter a chance de sair de sala, para ter a chance de ganhar por mês R$ 3,9 mil.

Se a mãe de uma aluna vende cachorro-quente na rua, se a mãe de uma aluna é faxineira, se a mãe de uma aluna recebe menos que um salário-mínimo, o gestor de escola, com quase R$ 4 mil no bolso, ri de nós.

Falta.
Falta.
Falta. Falta.
Falta.

Falta. Falta. Falta.


Falta a vontade alegre de transformar o mundo, e ele, eu sei, inicia-se em uma escola.

Reunião com os pais (1)














A foto revela como a direção escolar organizou a relação entre pais e professores no espaço físico para entregar as notas.

Isso ocorreu em dezembro de 2006. Cadeiras no corredor. A forma, inadequada.

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No blog Heloísa Mourão Marques, 21 de dezembro de 2006, escrevi na época:

Conversei com a professora-diretora Lúcia e como o coordenador de ensino, prof. Walmir, e disse-lhes sobre uma outra forma de organizar a reunião com os pais.

Penso que devemos dividir nota AZUL da nota VERMELHA.

AZUL - O boletim deve ser dado antes ao representante do Conselho de Turma para que ele leve esse boletim aos professores, por exemplo, da turma 2B. Dessa forma, eles conversarão entre si para que o corpo docente dessa turma - e não um indivíduo - apresente-se para os pais e reconheça, diante de todos, o mérito de cada aluno-filho, que, sobretudo, luta para ultrapassar limites sociais; e

VERMELHO - O mesmo procedimento deve ocorrer com os alunos que obtiveram notas ruins. Deve haver, por outro lado, maior comprometimento dos professores para que esse aluno não seja reduzido à nota baixa. É preciso dar apoio à família, dar motivação, cumplicidade a fim de que esse aluno supere seus problemas pessoais, a fim de que seja ouvido, a fim de que ultrapasse seus limites sociais. Esse aluno merece atenção redobrada.

Encontro com cada série - Essa sugestão foi dada pela professora-diretora Lúcia. Não é boa a idéia de haver um único encontro envolvendo todas as séries;

O aluno deve estar com os pais - Menor de idade ou não devem estar com os responsáveis. Caso não compareçam ou o pai não compareça, o boletim de N1 deverá ser entregue em N2; e

Penso que a professora-diretora Lúcia e o prof. Walmir devem, com o corpo docente, possibilitar uma nova ordem interna na escola pública.

Prof. Aldo Nascimento

Obrigado!!!

Professor, sou a favor de sua candidatura à direção da Escola Heloísa Mourão Marques. Se aceitasse voto de ex-aluno, com certeza votaria no senhor. Um abraço e tenho certeza de que o senhor fará um belo trabalho na direção dessa escola.

José Pinheiro,
Acadêmico de Comunicação Social/Jornalismo - UFAC.

Matéria de Josafá Batista

Esta matéria não foi publicada nos jornais acreanos por questões óbvias. Os blogs cumprem a função de expor o que a imprensa oculta. Os blogs são desobedientes, alguns.
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Mais de mil acreanos perdem
o direito à moradia no Bahia Velha

A lei: “São direitos sociais a educação, a saúde, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança... a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição.”

A prática: a Justiça, com o apoio da Segurança Pública, ordena a retirada de 1.060 famílias de uma área improdutiva do bairro Bahia Velha. Famílias pobres. Desamparadas.

Foi na quinta-feira passada. A Tropa de Choque da Polícia Militar, imponente, ostentava cacetetes e escudos novos. Imposto bem aplicado, pena que ali não houvesse bandidos. Impasse irrelevante. Rápidos, oficiais de Justiça exibiram a ordem (mandado de reintegração de posse) bem clara para qualquer entendedor. No papel, a sentença: a terra tinha dono.

E o dono mandou expulsar os invasores o mais rápido possível. E a polícia, consciente de seu papel policiador, cumpriu o dever. E na última quinta-feira, primeiro dia do feriadão prolongado para a imprensa, véspera do Dia da Pátria, cacetetes e escudos habilmente manejados puseram-se em ação.

E o cipó de aroeira voltou no lombo de quem mandou dar. Termina o feriado. Ontem, na área ainda ocupada pelos sem-teto, o pai não capinava a terra para plantar ou criar galinhas. A mãe não cozinhava macaxeira e feijão. As famílias uniram forças para reconstruir barracos desmontados no ardor do zelo policial.

Ao ver o repórter, a filha, cinco anos, abandona o naco de pão. Agarra-se à saia da mãe, chorosa, e grita:

- Mãe, olha o homem!

A mulher vira o rosto, que se fecha. Os braços descem. E arrebatam a filha do chão.

- Não é da polícia! - grita o repórter, ainda longe, meio surdo com o martelar da madeira. Gesticula com os braços e repete a frase, enquanto lembra o que havia lido, na sexta-feira, no blog de outro repórter, o Altino Machado (que trabalhara no feriado).

- Onde estará a Deusa Bárbara?

A má impressão se desfaz. Gente começa a se reunir, muita gente. Enxada ao ombro, chapéu de palha, camisa de campanha eleitoral, eles contam a mesma história com personagens diferentes. A mesma história, a mesma essência: desrespeito ao direito de quem nunca teve direito algum.

Medo, o amigo

As famílias podem receber a visita da polícia a qualquer momento. E temem isso. No acampamento do Bahia Velha, a noite não é só uma noite. Em cada acampado acampa-se também o medo.

“Dormimos rezando para que não nos retirem a terra, que antes da gente era improdutiva e não tinha uso algum. De repente, devido a uma questão de herança muito mal explicada, podemos perder tudo e ainda de forma humilhante. Não é pra ter medo?”, pergunta Deusa Oliveira - é ela! - , uma das líderes da comunidade.

Deusa Bárbara, como apelidara Altino, vai dormir hoje com um esquema de vigilância revezada. Aliás, vai participar dele. Medo e coragem na madrugada.

O medo não existia antes da intervenção policial. Só coragem para trabalhar. Um dos motivos é que, antes da ocupação, as famílias procuraram informações sobre a área. Descobriram que, além de ser realmente improdutiva, não havia impedimentos legais à ocupação.

A Justiça discordou. Veementemente. Pela sentença judicial, a área pertence a herdeiros de um terceiro e deve ser devolvida a eles. Saliva a boca do leviatã.

Ordem e progresso

Um grupo de instituições, como o Ministério Público Estadual (MPE), a Secretaria Estadual de Justiça e Direitos Humanos e o Instituto de Terras do Acre (Iteracre) busca encontrar o elo perdido. A preocupação procede. Como pode haver democracia onde cidadãos não têm direito à moradia, direito constitucional?

“O MPE propôs uma ação de suspensão da liminar de reintegração de posse para defender os interesses das famílias que moram na área há mais tempo. No entanto, isso vai depender de um levantamento prévio, pois soubemos que alguns moram há mais de 10 anos.

A nossa preocupação é garantir o direito de posse dessas famílias”, explica o atormentado secretário estadual de Justiça e Direitos Humanos, Henrique Corinto de Moura.

O secretário explica que o governo é contra a ocupação de terras porque a mesma Constituição garante o direito à propriedade privada. Mas há questões paralelas, como o direito à posse e o direito ao usucapião das famílias que ocuparam antes - nesses casos as ocupações tornam-se legais, mas só porque a lei quer.

“Quanto às demais famílias não beneficiadas pelo tempo de posse e em situação de risco social vamos propor uma medida de gestão. Mas isso também vai depender da análise da situação de cada família para ver se elas se enquadram em algum programa de assistência. Daí podemos descobrir qual o perfil delas e como o Estado poderá atendê-la, dentro da lei”, finaliza.