sexta-feira, junho 19, 2015

Constantino Kaváfis (1863-1933)



O que esperamos na ágora reunidos?
É que os bárbaros chegam hoje.
Por que tanta apatia no senado?
Os senadores não legislam mais?
É que os bárbaros chegam hoje.
Que leis hão de fazer os senadores?
Os bárbaros que chegam as farão.
Por que o imperador se ergueu tão cedo
e de coroa solene se assentou
em seu trono, à porta magna da cidade?
É que os bárbaros chegam hoje.
O nosso imperador conta saudar
o chefe deles. Tem pronto para dar-lhe
um pergaminho no qual estão escritos
muitos nomes e títulos.
Por que hoje os dois cônsules e os pretores
usam togas de púrpura, bordadas,
e pulseiras com grandes ametistas
e anéis com tais brilhantes e esmeraldas?
Por que hoje empunham bastões tão preciosos
de ouro e prata finamente cravejados?
É que os bárbaros chegam hoje,
tais coisas os deslumbram.
Por que não vêm os dignos oradores
derramar o seu verbo como sempre?
É que os bárbaros chegam hoje
e aborrecem arengas, eloqüências.
Por que subitamente esta inquietude?
(Que seriedade nas fisionomias!)
Por que tão rápido as ruas se esvaziam
e todos voltam para casa preocupados?
Porque é já noite, os bárbaros não vêm
e gente recém-chegada das fronteiras
diz que não há mais bárbaros.
Sem bárbaros o que será de nós?
Ah! eles eram uma solução.

terça-feira, junho 16, 2015

Crime e Biologia

Franz J. Gall, pai da frenologia

A palavra frenologia foi registrada pela primeira vez no dicionário, em 1836, como doutrina segundo a qual cada faculdade mental se localiza em uma parte do córtex cerebral, sendo, portanto, uma teoria que reivindica ser capaz de determinar o caráter, as características da personalidade e o grau de criminalidade pela forma da cabeça. Foi o médico alemão Franz Joseph Gall (1758-1828) que desenvolveu, por volta de 1800, a frenologia. Quem mais defendeu essa “ciência” e quem ficou mais famoso com ela foi Cesare Lombroso (1835-1909), criador da antropologia criminal e, de suas ideias, nasceu a Escola Positiva de Direito Penal. Em 1895, Lombroso publicou Antropologia criminal, onde associa características craniofaciais ao tipo de criminoso. Primo de Charles Darwin, Francis Galton (1822-1911), antropólogo e matemático, cunhou o conceito de eugenia em 1883, cujo significado é melhorar determinada espécie por meio da seleção artificial. Em 1964, o psicólogo britânico Hans Eysenck (1916-1997) editou Crime e personalidade, onde o delito é o resultado de uma interação entre condições do ambiente e características do sistema nervoso. Em 2002, a alemã neurocientista Terrie Moffitt publicou o primeiro estudo que relaciona fatores genéticos ao comportamento criminoso. O neurocientista e criminólogo britânico Adrian Raine foi um dos pioneiros a estudar o cérebro de criminosos violentos e, até 2013, pretendia fundar a disciplina “neurocriminologia”.
A sequência desses nomes no período de 213 anos aproximadamente é a permanência fixa no tempo de uma episteme pós-kantiana, cuja razão, sem poder conhecer a substância ou a essência do real, afirma o que é verdade por conhecer o fenômeno, a aparência do real. Um dos fundamentos de Lombroso encontra-se no positivismo de Auguste Comte (1798-1857), e, a fim de alicerçar a relação entre características da personalidade, grau de criminalidade e forma da cabeça, Franz Joseph Gall leu contornos, o exterior, a superfície, enfim, a razão pós-Kant leu a aparência de protuberâncias na cabeça para, após mapeá-la, sentenciar o que é a natureza personalidade-crime-fenômeno.


quinta-feira, junho 11, 2015

Quando o ódio é democrático

Na democracia, fala-se o que quiser, e o que é pior: fala-se o que nem entende. 

Quando se fala o que nem entende, não é para pensar, mas para agredir.

Quando se fala o que entende, fala-se não para agredir o adversário; porém, quando se fala sem entender, inventam-se inimigos políticos a fim então de odiá-los.

Uma forma de democracia serve a isso e se mantém assim por causa disso.

A última eleição presidencial foi a mais agressiva de qualquer outra anterior, ou seja, foi uma campanha para não pensar ideias para o país.

Ataques pessoais serviram para desviar a atenção do que é essencial à democracia: as ideias.

Assim, enquanto ideias não foram pensadas por causa do ódio pessoal, mentiras foram propagadas.