De Aldo Nascimento
Há muitos anos, não ouço daquela esquerda palavras de ordem contra “políticas neoliberais”. Hoje, adequada à economia de consumo neoliberal, essa esquerda não protesta contra a mais-valia na forma de uma Hilux. Ignora-se, entretanto, que o neoliberalismo permite ao indivíduo o que comunistas não permitiram na história: a liberdade de criar.
Se tivesse nascido no berço da economia de mercado, a arte de Vladimir Maiakóvski teria seguido outro destino. Os burocratas comunistas não apreciavam sua arte, por isso entre eles os choques foram inevitáveis. Em 14 de abril de 1930, Maiakóvski suicida-se com um tiro. Tinha apenas 37 anos.
Não há mais União das Repúblicas Soviéticas Socialistas (URSS), mas os versos desse fascinante poeta permanecem vivos. O Estado comunista ruiu. Maiakovski não: “Nesta vida/morrer não é difícil/o difícil/é a vida e seu ofício”, poetizou. Para quem ainda pensa que suicídio é ato de fraqueza, digo que, no caso de Maiakóvski, o suicídio foi apenas a confissão de que a existência não valia a pena em um Estado totalitário.
Devo aqui, entretanto, reconhecer que Lênin admitia que o trabalho literário “não é possível de nivelamento mecânico, de um domínio de uma maioria sobre a minoria”. Para ele, deveria haver “o máximo de espaço à iniciativa individual e às inclinações individuais, o máximo de espaço ao pensamento e à fantasia, à forma e ao conteúdo”. Para a desgraça de Maiakovski, entretanto, Lênin morre antes que seu pensamento fosse uma realidade política.
Sob a tutela de Stálin, em 17 de agosto de 1934 – pouco mais de quatro da morte de Maiakóvski -, o 1º Congresso de Escritores Soviéticos coroa, por meio de Andrei Jdanov, o “realismo socialista” como doutrina oficial, mesma doutrina com que o Partido Comunista Brasileiro (PCB) asfixiaria a liberdade de criação com as mãos rudes de uma ideologia que não admitiria a imaginação, as inquietações da forma.
Jorge Amado e Carlos Drummond de Andrade, por exemplo, não suportaram a pressão do PCB e, como resposta, arrancaram as mordaças da anticriação literária. Outro dissidente foi Graciliano Ramos. Em 1935, o autor de Vidas Secas envia uma carta ao crítico Oscar Mendes, dizendo: “Acho que transformar a literatura em instrumento de propaganda política é horrível. Li umas novelas russas e, francamente, não gostei.”
Sem imaginação, preso à objetividade, o realismo socialista de Andrei Jdanov fechou a palavra em si mesma, evitando a polissemia ou enfraquecendo-a por meio de um discurso autoritário. Assim, sem pluralidade, o monólogo panfletário de comunistas sacramentou um jogo parafrásico a fim de sepultar a ficção.
Por que domesticar a imaginação? Por que comunistas identificaram-se com o realismo? Por que eliminar a ficção? Em um pedaço de jornal, impossível responder. Posso, isso sim, deixar esta ótima dica para quem deseja (des)cobrir essa caça ao texto ficcional: A Trilogia do Controle, um denso livro do professor Luís Costa Lima.
Boa leitura!!!
Há muitos anos, não ouço daquela esquerda palavras de ordem contra “políticas neoliberais”. Hoje, adequada à economia de consumo neoliberal, essa esquerda não protesta contra a mais-valia na forma de uma Hilux. Ignora-se, entretanto, que o neoliberalismo permite ao indivíduo o que comunistas não permitiram na história: a liberdade de criar.
Se tivesse nascido no berço da economia de mercado, a arte de Vladimir Maiakóvski teria seguido outro destino. Os burocratas comunistas não apreciavam sua arte, por isso entre eles os choques foram inevitáveis. Em 14 de abril de 1930, Maiakóvski suicida-se com um tiro. Tinha apenas 37 anos.
Não há mais União das Repúblicas Soviéticas Socialistas (URSS), mas os versos desse fascinante poeta permanecem vivos. O Estado comunista ruiu. Maiakovski não: “Nesta vida/morrer não é difícil/o difícil/é a vida e seu ofício”, poetizou. Para quem ainda pensa que suicídio é ato de fraqueza, digo que, no caso de Maiakóvski, o suicídio foi apenas a confissão de que a existência não valia a pena em um Estado totalitário.
Devo aqui, entretanto, reconhecer que Lênin admitia que o trabalho literário “não é possível de nivelamento mecânico, de um domínio de uma maioria sobre a minoria”. Para ele, deveria haver “o máximo de espaço à iniciativa individual e às inclinações individuais, o máximo de espaço ao pensamento e à fantasia, à forma e ao conteúdo”. Para a desgraça de Maiakovski, entretanto, Lênin morre antes que seu pensamento fosse uma realidade política.
Sob a tutela de Stálin, em 17 de agosto de 1934 – pouco mais de quatro da morte de Maiakóvski -, o 1º Congresso de Escritores Soviéticos coroa, por meio de Andrei Jdanov, o “realismo socialista” como doutrina oficial, mesma doutrina com que o Partido Comunista Brasileiro (PCB) asfixiaria a liberdade de criação com as mãos rudes de uma ideologia que não admitiria a imaginação, as inquietações da forma.
Jorge Amado e Carlos Drummond de Andrade, por exemplo, não suportaram a pressão do PCB e, como resposta, arrancaram as mordaças da anticriação literária. Outro dissidente foi Graciliano Ramos. Em 1935, o autor de Vidas Secas envia uma carta ao crítico Oscar Mendes, dizendo: “Acho que transformar a literatura em instrumento de propaganda política é horrível. Li umas novelas russas e, francamente, não gostei.”
Sem imaginação, preso à objetividade, o realismo socialista de Andrei Jdanov fechou a palavra em si mesma, evitando a polissemia ou enfraquecendo-a por meio de um discurso autoritário. Assim, sem pluralidade, o monólogo panfletário de comunistas sacramentou um jogo parafrásico a fim de sepultar a ficção.
Por que domesticar a imaginação? Por que comunistas identificaram-se com o realismo? Por que eliminar a ficção? Em um pedaço de jornal, impossível responder. Posso, isso sim, deixar esta ótima dica para quem deseja (des)cobrir essa caça ao texto ficcional: A Trilogia do Controle, um denso livro do professor Luís Costa Lima.
Boa leitura!!!
4 comentários:
Evidentemente não é o socialismo de um país em guerra e cercado pelo nazismo, de um lado, e pelo imperialismo, de outro, a origem do totalitarismo que condena gerações inteiras à condição de párias e excluídos.
Não é o socialismo da URSS que produz os jovens que lotam as escolas públicas acreanas.
Não é o realismo soviético, enclausurado numa Guerra Fria (disputa por zonas de influência IDEOLÓGICA), a realidade que hoje impede a "liberdade" não de uma pessoa, mas de bilhões em todo o mundo.
Não é a ética bolchevique a origem de uma ordem social excludente, de uma política plutocrática, de uma subjetividade tão avassaladora que força o ser humano a berrar de desespero nas igrejas evangélicas.
Não é a utopia comunista a responsável pela crise, econômica, existencial, espiritual e ética, que vivemos hoje. E que em seu caminho mata, mutila, marginaliza, destrói.
Fofinho Josafá, Andrei Jdanov existiu, e ele representou uma época no Brasil que inibiu a criação literária de Drummond, de Jorge Amado, só para dar dois exemplos. É fato histórico.
O que escrevi não nenhuma relação com escola pública acreana. Não tem nada a ver. Escrevi sobre a literatura na URSS e no Brasil. Sua comparação não cabe.
Aldo, então de repente o "fato" deixou de ser um "aspecto secundário da realidade"?
Comentei o seu texto no meu blog, veja lá: www.blogdojosafa.blogspot.com
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