quinta-feira, abril 30, 2009

Os primeiros de maio serão os últimos

De Aldo Nascimento

Meu alimento sobre esta mesa
confessa
que não é meu trabalho
em si
que me alimenta.











Ouço vozes: são caroços de feijão.

Bem negros e pobres,
eles dizem que não é o meu trabalho
em si
que me alimenta:

dependo de mulheres
de crianças
de homens
que estão à mesa neste lar.












De outra forma,
estão no prato:

MARIAS
SILVAS
SEVERINOS
JOSÉS
DOLORES
CHICOS











Semea(dores) de terra,
boias-frias
em meu prato quente de comida.

Tantos cabem neste espaço fundo de louça
que meu garfo
orgulhoso
suspende a nação

e sente o peso de mãos para o terçado
de dedos para a marmita
de corpos para o latifúndio
de choros ressecados em rostos rachados de exploração imensa
de filhos não deitados em nenhum berço esplêndido.

Esta (re) feição
denuncia a história
(sem) feição
de uma gente.

Agora compreendo:
não é meu trabalho
em si
que me alimenta:

são estes resíduos de Nação
entre meus dentes.

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