domingo, março 09, 2014

O lugar autêntico da palavra

Texto referente à epígrafe de Lewis Carroll:

“Cuidai do sentido, e as palavras irão por si mesmas ao lugar certo.”

    Ao escrever “cuidai do sentido”, penso onde as palavras não são cuidadas. Antes, no entanto, uma pergunta: o que é cuidar? No dicionário Houaiss, o primeiro significado é meditar com ponderação. De um, fomos para dois termos. Então, quais os significados originais de meditar e de ponderar? Aquele vem de medir; e este, de peso. Quem medita mede e quem pondera pesa. Ora, quando medimos, marcamos o limite, e, por causa do peso, vamos a fundo. Cuidar é, pois, isto: “marcar o limite com a profundidade do sentido”.
   
  Mas onde as palavras não têm limite e muito menos profundidade? Não leio outro termo a não ser este: vulgaridade. Com seu visgo, o vulgar gruda-se ao significante para disseminar significados inautênticos, dando ao senso comum a segurança do imediato, e o imediato, o prático, sabemos, opõe-se à reflexão.  A linguagem ordinária, por ser bruta, por ser coisa, por ser útil, não cuida da palavra a fim de que ela, a própria palavra, dê a nós sentido.
    
    Onde então as palavras são cuidadas? onde elas, uma vez cuidadas, irão ao lugar certo? Digo que estão neste lugar onde se marca o limite com a profundidade do sentido, qual seja, na poesia.

Nenhum comentário: