sábado, fevereiro 23, 2013

Minha família


O espírito humano edifica-se por meio do Amor e da Dor familiar. A família é o lugar, ao mesmo tempo, do encontro e do exílio, lugar em que as palavras silenciam-se também por medo.

O Amor de minha mãe manteve-me vivo, e a Lei (injusta e vazia) de meu pai me provocou para o futuro.

Cresci no meio da contradição; criei-me na casa-exílio de meus pais durante 23 anos.

Hoje, após tanto tempo, o passado é o mais sólido silêncio, porque nada nele pode ser tocado pela palavra. O que passou, sabemos, passou.

O corpo de meu pai é todo despedida. Sobre ele, o peso do tempo faz tombar todo orgulho de sua Lei.

Meu pai, gradualmente, vê suas normas se declinarem, e eu não poderia tirar proveito desse momento, porque a sua condição humana fala acima de tudo, muito acima de um passado (re)visitado por palavras pretensas a acusar.

O que passou encontra-se petrificado como memória. Para que o barulho não nos atormente no convívio de hoje, a pedra não será quebrada por minha palavra.

Que Deus!!! dê a mim não a salvação, mas me dê sabedoria e brisa leve e fresca a meu espírito para eu compreender as contradições da vida a ponto de amar meu pai até o final de sua presença com a mansidão de meu espírito.

Dessa forma, preciso e quero me reclinar diante do tempo e retirar de minha alma qualquer presunção de verdade que faça quebrar a pedra.

"Pai, amanhã, se o tempo estiver bom, vamos passear de barco na lagoa com a Mony, o Ânderson e a mãe."

"Filho, a meteorologia informou que choverá amanhã no Rio e a chuva vai durar um bom tempo."

"O jeito é ter paciência. Se esperei 20 anos para passear de barco com o senhor, o jeito agora é apreciar a chuva."

Meu pai foi a primeira injustiça que conheci nesta vida; porém Deus me ofertou um espírito que sempre cresceu na adversidade.

Devo ao meu pai - sem ele saber - a minha mão firme impedir o fogo entre dedos de cair no chão de pólvora.

Sua injustiça fortificou-me,  e eu o amo por isso.     
  

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