domingo, maio 01, 2016

A luta dos professores do Paraná não é exemplo



            Em 29 de abril deste ano, o confronto entre policias e professores da rede estadual de ensino do Paraná completou um ano. Na Praça Nossa Senhora de Salete, no Centro Cívico, em Curitiba, Língua Portuguesa, Filosofia, História, Física, Química, Sociologia, enfim, as disciplinas escolares fecharam seus livros para lutar na rua contra o governo de Beto Richa, do PSDB.
  
            Livros foram lidos na faculdade durante anos para que, uma vez formado, o professor enfrentasse policiais muito bem armados em um campo de batalha. O professor que se formou em Sociologia, por exemplo, paralisou a escola para dizer na rua que “a luta continua”.


  
            Médicos jamais saíram às ruas para gritar palavras de ordem e muito menos para apanhar de policiais militares, mesmo porque o conceito de greve se encaixa perfeito no hospital. Se uma unidade hospitalar para de funcionar, o sofrimento se materializa rapidamente, causando colapso na sociedade. Esse colapso ocorre porque o médico, bem diferente do professor, não vive da palavra, ou seja, não vive da abstração. Sendo assim, o conceito de greve é muito adequado, visto que a natureza do trabalho em hospital materializa-se no corpo, não em ideias. E mais: caso pare sua atividade profissional, o médico não precisará repor suas consultas.

            Uma pergunta: será que o professor pode chamar de “greve da educação” sabendo que suas aulas serão repostas? Não seria mais lógico chamar de “férias antecipadas”? Mais uma pergunta: se o ato de falar em sala de aula se distingue do ato de agir em um consultório médico, pode a palavra de um professor parar a cidade? Ora, quando o médico para de examinar seus pacientes, ele consegue parar a cidade; no entanto, quando o professor para a escola, sua palavra não causa nenhum colapso na cidade. E nós sabemos que a origem do conceito de greve, que é anarquista, tem como finalidade última parar a cidade.


  
            Dois representantes do pensamento anarquista que executaram muito bem o conceito de greve foram Mahatma Gandhi (1869-1948) e Martin Luther King (1929-1968). Com esses dois exemplos históricos, um nos Estados Unidos e outro na Índia, o professor, antes de paralisar suas atividades escolares, deveria abrir livros sobre a história do pensamento anarquista para aprender que paralisar uma escola não é fazer greve. Paralisar uma escola é, antes e acima de tudo, antecipar as férias para depois ainda ter de repor o tempo das férias antecipadas.


  
            No caso dos professores do Paraná, houve ainda um adicional: apanharam feio de policiais. O que houve há um ano com esses profissionais não representa nenhum exemplo de luta pelo motivo de essa luta estar completamente errada como luta da educação. O corpo docente encontra-se muito doente por causa do “parasita sindical”. Esse corpo precisa se curar primeiro dele; precisa recuperar sua força original de pensar a natureza de seu trabalho.  Assim, uma vez curado desse parasita, o corpo docente deve se levantar para que seus movimentos criem formas apaixonantes de intervenções inteligentes e sensíveis no espaço urbano.               
      
Aldo Bourdieu (língua.portuguesa@uol.com.br) é professor de Filosofia, de Sociologia, de Literatura, de Religião e de Língua Portuguesa.

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