sexta-feira, junho 24, 2011

A intolerância dos evangélicos

Gilberto Dimenstein escreve (muito bem) para o jornal "Folha de São Paulo" aos domingos. Ele é um desses bons brasileiros que sabem pensar a educação brasileira.

Hoje, o assunto é gay e evangélico. Leia com muita atenção.

São Paulo é mais gay ou evangélica?

Gilberto Dimenstein

Como considero a diversidade o ponto mais interessante da cidade de São Paulo, gosto da ideia de termos, tão próximas, as paradas gay e evangélica tomando as ruas pacificamente. Tão próximas no tempo e no espaço, elas têm diferenças brutais.

Os gays não querem tirar o direito dos evangélicos (nem de ninguém) de serem respeitados. Já a parada evangélica não respeita os direitos dos gays (o que, vamos reconhecer, é um direito deles). Ou seja, quer uma sociedade com menos direitos e menos diversidade.

Os gays usam a alegria para falar e se manifestar. A parada evangélica tem um ranço um tanto raivoso, já que, em meio à sua pregação, faz ataques a diversos segmentos da sociedade. Nesse ano, um do seus focos foi o STF.

Por trás da parada gay, não há esquemas políticos nem partidários. Na parada evangélica há uma relação que mistura religião com eleições, basta ver o número de políticos no desfile em posição de liderança. Isso para não falar de muitos personagens que, se não têm contas a acertas com Deus, certamente têm com a Justiça dos mortais, acusados de fraudes financeiras.

Nada contra - muito pelo contrário - o direito dos evangélicos terem seu direito de se manifestarem. Mas prefiro a alegria dos gays que querem que todos sejam alegres. Inclusive os evangélicos.

Civilidade é a diversidade. São Paulo, portanto, é mais gay do que evangélica.

quarta-feira, junho 22, 2011

Contas de uma escola pública


Governo, prefeitura de Rio Branco, Assembleia Legislativa do Acre e Câmara dos Vereadores da capital acriana não são mais transparentes do que a escola Heloísa Mourão Marques.

O PT sempre propagou a ideia do orçamento participativo, mas tudo não passou de cínica propaganda.

Nessa escola, a gestora expõe o dinheiro público, e os governantes [de esquerda?] o ocultam.

Se a gestora não apresenta as contas, é cobrada, punida.

sexta-feira, junho 17, 2011

Deus não é homem!

Montagem da charmosa Thalita. O texto, meu. Dias antes da Parada Gay, postarei meu texto neste blogue e em um jornal de Rio Branco.

Agora, este pedaço:

VII - Êxodo 32:27-29, o Deus que mata

Lembro-me quando cada um cingiu a espada sobre o lado, cada um passou e tornou a passar pelo arraial de porta em porta, e matou cada um a seu irmão, cada um, a seu amigo, e cada um, a seu vizinho. Lembro-me, três mil homens assassinados a mando de um Deus vingativo para que cada um recebesse sua bênção. “Três mil homens mortos só porque ele tinha ficado irritado com a invenção de um suposto rival em figura de bezerro, Eu não fiz mais que matar um irmão e o senhor castigou-me, quero ver agora quem vai castigar o senhor por estas mortes”, pensou o personagem Caim, de José Saramago.

Após séculos sobre séculos, a Israel de Moisés ainda mata crianças palestinas na Faixa de Gaza, um campo de concentração delimitado pelo Deus dos judeus. Quando, entre 16 e 18 de setembro, o exército de Israel invadiu o Líbano em 1982, as armas de Jeová mataram 3,5 mil civis inocentes.

A Corte Suprema de Israel considerou o ministro da Defesa do país, Ariel Sharon, o responsável pelo massacre de Sabra e Chatila.
Sobre carnificinas, sobre assassinatos, sobre inocentes cadáveres, pastores acrianos calam-se; mas, quando o assunto é homossexualidade, pregam a ira do Senhor contra os que não foram, segundo eles, escolhidos por Jeová.

Dar o cu não pode. Um Deus que mata pode.

Alegres e dançantes, os meus alunos!

Penso como meu colega de trabalho, o Fernandes, um ótimo professor de matemática: "A escola deveria parar o seu cotidiano engessado para se transformar em alegria."

Compreendo a professora-gestora Osmarina, nem todos os professores vestem a camisa.

Enquanto isso, o 3º Batalhão da PM e a escola Heloísa Mourão Marques uniram-se para possibilitar momentos de alegria entre mim e a juventude do 2º C e do 2º D.

Trata-se de uma apresentação contra as drogas.

Para tanto, dançaremos Marcelo D2 e Barão Vermelho no auditório da escola. Iniciamos na terça. Quarta, feriado. Retomamos na quinta de forma diferente como os alunos se apresentaram na terça. Ficou melhor.

Ensaiamos na quinta. O melhor ficou na sexta. Sábado, ensaio final, das 8h às 11h.

Penso que uma forma de criticar o uso da droga se faz por meio da música, da dança, da poesia. O prazer das drogas combate-se com o prazer da cultura, com o prazer das relações afetivas.

Meus alunos jamais pensariam que um professor exigente, racional, sério, por exemplo, poderia ceder a uma pessoa que canta e que dança ao som de Marcelo D2 com eles.

O secretário estadual de Educação, Daniel Zen, tem o dever e a obrigação de levar às escolas públicas a mais densa e bela manifestação cultural da música, do teatro, da dança.

Zen, que veio da Secretaria de Cultura, não pode vacilar. Em 2011, sua presença na secretaria tem sido inexpressiva, típica de um burocrata. Faltam três anos. Se, nesse tempo, ele não misturar educação e cultura, receberá uma CRÍTICA à altura dos incompetentes burocratas da Frente Popular.

Espero que ele estabeleça o novo nas escolas. Já disse em outros momentos neste blogue que a escola deve se transformar em o centro de encontro da juventude para assistir a bons filmes, para ouvir música, para dançar, para ver belas peças de teatro.

Além disso, o governo deve propagar na TV e nas rádios esses grandes eventos para a sociedade.

Enquanto isso não vem - se é que virá -, eu danço com meus alunos ao som de "Sangue Bom", de Marcelo D2.

quinta-feira, junho 09, 2011

Milagre

Quando a noite ancorar a beleza do céu em meus olhos, desejarei apenas o manto de tua pele sobre a minha, desejarei apenas a minha vida intensa sobre a tua.

Sentir na carne o teu suor regando minha alegria.

Dos tantos versos que já ofertei a teus olhos, Milagre, se não for o mais intenso, é um dos.

Por isso, Mony, deixo aqui, mais uma vez, a poesia que escrevi para teus olhos, porque teu destino devolveu ao meu o sentido da vida.

Toda noite dos namorados é noite de Milagre.

Em igrejas à espera de milagres,

eu, à margem do corpo de Cristo,
entre o fim da tarde e a chuva fina,

ajoelho-me e, por teu nome, rezo a finco.

Que teu corpo nu, sem espinho, sem prego e cruz,
traga, como novo messias, à minha esperançosa carne,

o milagre de tua luz:

chama, despido corpo, me chama, e eu, safado santo,
subo ao sagrado altar, tua cama, para ser pecador feliz.

Sinto pena das igrejas, sinto tanto.

Para teus fiéis, me eternizo surdo, e tua língua nem falo.
Mas, em tua boca litúrgica, batizo-me com tua saliva.

Teu gozo, abençoada prece. Teu corpo, como não amá-lo?

E, sem crer no pão e no vinho, molho minha semente em tua fissura para germinar vida.
Entre tuas pernas, minha reza, meu clímax: Deus, eis a oferta!!!

Olhe no meu olho, Amada, olhe, veja-nos e sinta!!!



terça-feira, junho 07, 2011

Eles paralisaram as aulas, mas eu lecionei

Hoje, mais um dia de paralisação na rede pública de ensino estadual, e eu lecionando na escola Heloísa Mourão Marques.

O Sindicato dos Professores Licenciados do Acre (Sinplac) não aceitou a proposta do governo, 15% em três vezes. O sindicato exige um acordo de 20%, dividido em quatro vezes: julho, janeiro de 2012, abril de 2012 e outubro de 2012.

Na sexta-feira, dia 10, outra paralisação para definir se os professores cruzarão os braços por tempo indeterminado caso o governo não aceite a porcentagem do corpo docente. Fonte do governo afirmou que não abrirá mão dos 15% para todos os servidores. "É isso ou nada", disse um membro de governo.

Até agora, os professores da escola Heloísa Mourão Marques irão repor três dias de aula; eu, dois dias.



sexta-feira, junho 03, 2011

Um outro modelo de sala


Quando desejamos ouvir a palavra, precisamos desta essência: o silêncio. O pequeno príncipe e o piloto dialogam no deserto. Nesses meus quase 15 anos de escola pública acriana, não me lembro de ter ficado no deserto para que a palavra fosse lida, pensada, percebida em uma narrativa, em um drama ou em uma poesia.

As escolas são barulhentas, não há nelas um lugar-leitura, isto é, um deserto onde possamos ouvir a palavra desenhada e pintada pela poesia ou por um belo romance. Uma vez em sala, a palavra literária é corrompida pelo ruído, pelo tumulto de corredores.

Na escola Heloísa Mourão Marques, por exemplo, edificaram as salas perto da rua. Assim, quando um carro passa com a excrescência de um Calcinha Preta, calo-me em sala porque não posso competir com os ruídos da rua, além dos ruídos de corredores, de outras salas.

Ainda sim, de alguma forma, sempre busquei ler ótimos autores ficcionais na escola pública. Sempre. Após tantos anos, finalmente, o aconchegante silêncio na escola Heloísa Mourão Marques. Agora, podemos ler no deserto.

A responsável por isso, soletre: OS-MA-RI-NA, a diretora. Ela possibilitou uma Sala de Leitura, a única do estado para o ensino médio. Mais: a única escola de ensino médio onde obras literárias são lidas.

Com essa sala, com esse deserto, com esse lugar-leitura, poderemos ouvir a palavra literária de um Drummond, de um Dino Buzzati, de um Kafka, de um Castro Alves, de um Raduan Nassar.

Desejo ver meus alunos nessa sala deitados, sentados no chão, só lamento não ser possível colocar belas redes para eles se balançarem. Nela, há dois tapetes - haverá mais -, existem duas mesas para alunos, assentos confortáveis, um chão limpo para os pés ficarem descalços, há dois ventiladores silenciosos embora a sala seja arejada naturalmente.

Trata-se de um lugar-leitura para que possamos nos esquecer daquelas salas que incomodam o conhecimento, o saber. Nesse deserto, a palavra literária encontra-se em paz, silêncio.

quarta-feira, junho 01, 2011

Prazer

De Aldo Nascimento


Criado para ser encontro, o Corpo sussurra na pele do ser apaixonado a mais profunda carência. Sozinho, o corpo seria triste porque negaria sua própria natureza, que é se sentir, sentindo-se, em outro corpo. O Prazer nos alegra!

E é assim que a desejo e é assim que, aos poucos, me aproximo. Em gestos delicados, condenso agora toda emoção em um toque, mas, antes que eu a tocasse, precipitei-me em suor. As mãos gelaram-se. Meu Corpo, orgulhoso, estremeceu-se. Ao te tocar, perceba: fragilizo-me.

Sim, eu sinto. Mais: por meio de ti, eu me sinto. Se não fosse você, sozinha, eu desconheceria a desmedida de minha felicidade, que é, sob os desvios de tuas carícias, sentir minha carne suavizar-se.

Tua pele... na minha... minha carne, já molhada e febril, confessa: ofereces a mim o prazer de estar onde sempre desejei estar – em teu Corpo, lugar-carne que me acolhe; extrai de mim a certeza de que estou viva, imensa, alegre. Quase infinita.

Perceba. Sou oferenda entregue a essa humana carência de ser desejada por ti. Feliz carícia que desliza. Fragiliza-me. Retira-me da solidão. Por causa de ti, faço-me presente para não mais, a mim, pertencer. Olhe, escute-me, eu o amo!

Imerso em suor e entre gemidos, eu, também, a amo, mais ainda quando meu Corpo está em transe, mais ainda quando minha carne se declara insana. Corpo que se contorce. Agiganta-se. Foge ao controle. Rebela-se. Transpira. Geme. Grita. Exagera.

Já pressinto o gozo, sensação de que irei, por alguns segundos, me desencarnar. Minha carne já pode sentir o sabor suado dessa vertigem. Quando gozamos, tenho a impressão de que somos lançados ao não-lugar, restando a essa breve viagem fechar os olhos e... hummmmmmmm! Deus, Deus, milagre!

Agora, após o êxtase, meu Corpo, cansado e feliz, tomba sobre o teu, e, ao teu ouvido, sussurro que, sem você, eu jamais poderia sentir, sozinho, o que senti em minha carne e em meu espírito. Tu foste o caminho por onde cheguei, mais sensível, a mim mesmo. Por meio de ti, sou devolvido a mim muito mais feliz. Só o Outro, você, essa minha diferença, possibilitou o excesso.

Saboreando tua carne, movimentando-me ao seu bel-prazer, vivi a alegria de não mais a mim pertencer. Fui teu. Saborosamente, teu.

terça-feira, maio 31, 2011

A poesia do beijo

Extrair do comum, do natural, o deslumbramento poético. O beijo, sabemos como ele é. Não sabemos, isso sim, ofertar a ele as devidas palavras.

No texto abaixo, meu, já postado neste blogue, minhas palavras foram uma tentativa de renomear esse encontro entre lábios, oferecendo a ele o incomum. Leia-o!

Em sua insana consciência, o Amante jamais pensa como beijará o ser Amado porque o que é vital no beijo é o não pensar. Uma vez nele, uma vez entre lábios e língua, entre a saliva e o céu da boca, já não queremos ver mais nada, por isso fechamos os olhos para somente sentir.

Desejamos tão somente sentir o movimento incerto da carne para partir... e, fechados os olhos, a Alma se sente cair no abismo de uma breve viagem. Deixar ir.

Nada no beijo é exato, preciso ou calculado. Quanto mais errado, quanto mais a língua escapa, foge, escorre, quanto mais os lábios se jogam, a boca só deseja se perder, mais ainda, na boca Amada.

Mas quem disse que o beijo são só os movimentos da carne? Antes de eu ter minha boca de volta, antes de eu ir embora, pouco antes de minha partida, deixei na tua não só o pecado molhado da saliva, mas meu sopro... meu sopro de vida.

quinta-feira, maio 26, 2011

Cative-me!

Para interpretar, meu olhos, antes, observaram a Expo-Acre por três anos.

Certa vez, meus olhos testemunharam uma criança com a família. O pai segurava a câmera, e a mãe ajeitava a pose da menina.

O local era uma baia. Ao lado da inocente, um boi também saiu na foto.

Muitos, em dia de Expo-Acre, saem de suas casas para contemplar bovídeos. Dizem que as crianças adoram, dizem.

Mas, no lugar de bois, imagino o governo da Frente Popular criar um espaço imenso somente para as crianças, um lugar de alegria autêntica, ingênua; no lugar de quadrúpedes, teatro infantil, leitura, parques, contadores de estórias, cinema.

No Acre, quando falamos de (contra)cultura infantil, a terra é árida, principalmente, nas periferias. Não há representações desse mundo nem nas escolas públicas, o que há são caricaturas do mundo infantil, deformações.

CATIVAR

A mãe conta estória para a filha dormir, mas, para mim, a Literatura Infantil deve despertar as crianças, abrir seus olhos para o belo, o sensível, o universal. "O Pequeno Príncipe", de Antoine de Saint-Exupéry, pertence a uma literatura que não adormece crianças.

Nessa obra, as palavras transcendem o dicionário porque receberam dramatização. "Cativar", por exemplo, só tem sentido - mais do que significado - porque aprendemos com ela que esse verbo só pode ser conjugado a dois. Cativar é encontro e, onde pulsa o encontro, onde existe o eu, existe o drama. Deixamos de ser indivíduos isolados.

No entanto, quando vejo no filme a raposa no trigal, percebo que "cativar" é também "ficar só". A raposa, uma vez cativada, não pode evitar uma marca do destino [humano], a perda. Um dia, seja pela morte, seja por outra partida, a vida é a perda física de quem nos cativou, nesse caso, o pequeno príncipe.

No trigal, sozinha por causa da ação do verbo cativar, a raposa sabe que "o essencial é invisível aos olhos", isto é, ela não se serve mais da presença física do pequeno príncipe, mas só ela, sozinha, vê os cabelos do menino na forma de trigo. Só ela vê o invisível.

Crianças deveriam ser proibidas de entrar na Expo-Acre.

quarta-feira, maio 11, 2011

Por que Cruz e Sousa?

Não sou homem musculoso, meu corpo não foi modelado por exercícios físicos. Minha academia, outra. Eu sei, no entanto, que, sem esforço, músculos não se avolumam. O peso exige de mim superação.

A poesia "Grande Amor" é pesada demais para os "músculos do cérebro". Para entendê-la, para interpretá-la, é preciso suar muito, é preciso malhar para o cérebro ficar "tanquinho". Ler Cruz e Sousa é atividade aeróbica de alto impacto.

Leram uma vez. Duas. Leram três vezes. Quatro. Não entenderam, ou seja, o entendimento de sua poesia não se encontra na superfície do texto. Nesse lugar, parte externa, o leitor desprevenido se perde e confessa que "tudo está confuso".

Não sempre, mas gosto de, por meio do literário, deixar meu alunos perdidos. Achem-se! Sozinhos, não se acham no texto. Por causa disso, leio, releio, interpreto. Entro com eles no labirinto do "Grande Amor" para encontrar a saída.













segunda-feira, maio 09, 2011

Cruz e Sousa




Hoje, um calor que deputados e vereadores não sentem em seus gabinetes incomodou a leitura e a interpretação de uma belíssima poesia de Cruz e Sousa, "Grande Amor".






Grande amor, grande amor, grande mistério

que as nossas almas trêmulas enlaça...
Céu que nos beija, céu que nos abraça
num abismo de luz profundo e céreo.

Eterno espasmo de um desejo etéreo
e bálsamo dos bálsamos da graça,
chama secreta que nas almas passa
e deixa nelas um clarão sidéreo.

Cântico de anjos e de arcanjos vagos
junto às águas sonâmbulas de lagos,
sob as claras estrelas desprendido...

Selo perpétuo, puro e peregrino
que prende as almas num igual destino,
num beijo fecundado num gemido.

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Até a terceira estrofe, colocamos na ordem sintática direta, fomos ao dicionário, criamos imagens para as palavras e interpretamos os versos desse negro de Santa Catarina.


quarta-feira, maio 04, 2011

Todo mês tem leitura

4 de maio, 2011. Uma manhã muito agradável para ler fora da sala de aula. Ficamos atrás do auditório, um local silencioso para a leitura ser ouvida por todos. Aqui, não havia ruídos de outras salas. Não se trata de um espaço perfeito, mas, mesmo assim, bem melhor do que salas quentes.

Ler nas escolas públicas acrianas é desconforto. Conforto mesmo só na Assembleia Legislativa do Acre ou nas escolas particulares dos filhos de deputados.















Estamos lendo "O Deserto dos Tártaros", de Dino Buzzati. Sinto na faces de alguns alunos que ler é "um saco": significado de palavras, compreender o que está escrito, interpretar, vírgula, pronome oblíquo, aposto. Entretanto, embora contrariados, a leitura segue seu destino.

Por que esse livro? No segundo ano do ensino médio, os professores decidiram que o texto estudado nesse período deve ser descritivo, por isso "O Deserto dos Tártaros". Essa bela obra literária é senhora de um narrador que, ao ver a aparência da realidade, oferece a essa mesma realidade profundidade.

Seu narrador compõe o profundo por meio da superfície.














Fora a superfície, o narrador apresenta Drogo, um personagem que viverá no forte Bastiani. Nesse local, lugar marcado pela solidão, pela rotina, ele ainda espera por algo; mas, enquanto algo não chega, é preciso dar à vida isto: sentido.

Depois, em outro momento da leitura, quando estivermos mais adiante, leremos trechos deste livro de Albert Camus: "O Mito de Sísifo". Se Drogo vive o absurdo, saberemos que, mesmo no absurdo da vida, é preciso encontrar um sentido.

Na igreja mais simples, o pastor lê a Bíblia para seus fiéis, porque na igreja mais simples quatro palavras existem: o conforto do silêncio.

Na escola pública acriana, lugar nocivo às páginas de uma obra literária, predomina o incômodo das salas de aula - elas permanecem as mesmas como há 50, 100 anos.

terça-feira, maio 03, 2011

Ele, o Livro

Fala-se tanto de o aluno ler na escola. Fala-se muito, "os alunos precisam ler". O que nasceu primeiro, o Livro ou o computador? A resposta, óbvio!, ele, "o Livro".

Embora seja muito mais antigo, muito mais velho que a máquina, o Livro, essa entidade espiritual rara entre estudantes, jamais foi destinado a ele uma sala [confortável] de leitura.

Não há sala de leitura nas escolas estaduais do Acre; porém, mesmo surgindo no mundo séculos depois, ao computador, reservaram-se salas e mais salas, todas climatizadas. A tecnologia tem lá suas suas vantagens sobre coisas antigas, velhas, seculares.

Leio para meus alunos há anos, desde 1990, quando comecei na escola Souza Marques, em Madureira, Rio de Janeiro. No Acre, de uma forma ou de outra, o ato da leitura, até hoje, é difícil por causa de uma realidade escolar oposta à leitura em sala.

Hoje, na escola Heloísa Mourão Marques, sem domínio de sala, um profissional da educação permitiu que alunos exercem o "direito" de incomodar minha aula com gritos, com falatórios. Eu lia "O Deserto dos Tártaros".

Sala quente, sem ar-condicionado, ruídos pelo corredor, professor que incomoda outro professor, tudo para o Livro não ser lido na escola. Formas de impedimento.

No planejamento pedagógico, não consigo nem mais marcar um dia para ler no auditório ou na sala de vídeo, porque, como outros planejamentos são marcados antes do meu, professores já deixam agendadas suas aulas nesses locais marcados pelo silêncio.

Eu soube que, em outros anos, professores reclamavam de mim porque eu ocupava a sala de vídeo para leitura. "Sala de vídeo não é lugar de leitura", sentenciavam uns babacas, uns imbecis desqualificados.

Osmarina construirá um espaço para leitura ainda neste ano, longe de professores que não colocam limites em seus alunos.

Enquanto esse lugar não existe ainda, eu continuo, mesmo em local impróprio, em uma sala de aula, a ler.

Tenho inveja dos computadores.

sábado, abril 23, 2011

Saliva



Vida,
eis um bom encontro:

entre o olhar que me come
e o gozo que me consome,

o instante, este momento:
saliva marcada

por teu nome.

quinta-feira, abril 14, 2011

A cada quatro anos, Sulivan é vítima de bullying


Massacre de Columbine:

Eric Harris (apelido ReB), de 18 anos,

e
Dylan Klebold (apelido VoDkA), de 17 anos.















Massacre da Universidade de Virgínia:

Cho Seung-Hui, 23 anos.














Massacre de Realengo:

Wellington Oliveira, de anos 23.


















Massacre da Assembleia Legislativa do Acre, a Aleac:

Professor Sulivan, de 68 anos













quinta-feira, abril 07, 2011

Sepultaram a senhora Gramática

Por meio de um burocrata da Secretaria Estadual de Educação, ouvi que não se estuda mais na escola gramática, conhecimento ultrapassado. No lugar dela, gêneros textuais. Ando sem tempo para escrever neste blogue sobre tamanha sandice.

Como (in)consequência, elaboram-se provas sem a presença da gramática. Ando sem tempo para escrever. Deixo então uma breve crítica de Marildes Marinho, fragmento de seu artigo "A Língua Portuguesa nos Currículos de Final de Século".

Seu pensamento sobre essa questão é resultado de trabalho realizado por uma equipe do Centro de Alfabetização, Leitura e Escrita da FaE/UFMG. Foram analisados currículos de 19 estados, com a finalidade de oferecer ao MEC subsídios para a elaboração de parâmetros para o ensino da língua materna no Brasil.

Eis:

"(...). O risco que se corre, quando se toma o gênero ou o tipo de texto como o elemento orientador da prática de produção escrita, é o de privilegiar o produto em detrimento do processo. Ao se focalizarem as característica e/ou estratégias de modelos prototípicos de textos (sem se considerar para quem, o quê, por quê o autor está escrevendo), pode-se estar deslocando o foco da gramática normativa da frase ou a nomenclatura gramatical para uma gramática normativa do texto ou uma nomenclatura textual. (...)."

Seu artigo encontra-se no livro "Os currículos do ensino fundamental para as escolas brasileiras", organizado por Elba Siqueira.

Retirar a gramática da disciplina Língua Portuguesa assemelha-se a retirar o cálculo da Matemática.

quinta-feira, março 31, 2011

Vou apertar e vou acender agora

Há uma semana, no centro de Rio Branco, um cheiro forte entrou pelas narinas. O relógio nem marcava meio-dia.

Eles, à sombra de uma árvore, puxavam maconha. Tudo numa boa, na paz.

segunda-feira, março 21, 2011

Milagre

Quando o tempo joga a favor, gosto de parar para (re)organizar as palavras. Pensá-las. Senti-las. "Milagre" é uma dessas poesias minhas em que o ritmo das horas permitiu poetizar a vida.

Milagre

Em igrejas à espera de milagres,

eu, à margem do corpo de Cristo,
entre o fim da tarde e a chuva fina,

ajoelho-me e, por teu nome, rezo a finco.

Que teu corpo nu, sem espinho, sem prego e cruz,
traga, como novo messias, à minha esperançosa carne,
o milagre de tua luz:

chama, despido corpo, me chama, e eu, safado santo,
subo ao sagrado altar, tua cama, para ser pecador feliz.

Sinto pena das igrejas, sinto tanto.

Para teus fiéis, me eternizo surdo, e tua língua nem falo.
Mas, em tua boca litúrgica, batizo-me com tua saliva.

Teu gozo, abençoada prece. Teu corpo, como não amá-lo?

E, sem crer no pão e no vinho, molho minha semente em tua fissura para germinar vida.
Entre tuas pernas, minha reza, meu clímax: Deus, eis a oferta!!!

Olhe no meu olho, Amada, olhe, veja-nos e sinta!!!

sábado, março 05, 2011

Marcos Vinícius e seu Carnaval

Há anos na Fundação Garibaldi Brasil, Marcos Vinícius, carioca formado em História que acredita que revolução é conflito bélico entre dois países, também acredita que Carnaval é o que ele diz.

Quando vai à tevê, só fala em organização, porém nunca disse sobre a importância simbólica dessa festa popular.

Marcos organiza a escolha de Momo, entretanto ignora o que seja a história simbólica desse rei. Como presidente da Fundação Garibaldi, sua função deveria ser nobre quando o período carnavalesco chega. Deveria.

Como porta-voz da cultura popular, sua boca não se abre na TV Aldeia para colocar na devida ordem os significados das palavras que pertencem ao reino de Momo. O problema é que a TV Aldeia não sabe, como emissora de cultura, falar do Carnaval, muito menos Marcos.

É como eu digo: em dias de Momo, o presidente da Fundação Cultural Garibaldi Brasil deveria fazer um retiro espiritual ou então fazer isto: calar a boca.

segunda-feira, fevereiro 28, 2011

Cansaço

Ando cansado de tudo. Do meu umbigo. E do tumulto. Só não ando cansado da chuva. De algo noturno. Ando à espera de um milagre.

Ando cansado do tempo.

quinta-feira, fevereiro 17, 2011

Sinplac

Reclamamos do governo, mas não nos olhamos no espelho. O Sinplac, Sindicato dos Professores Licenciados do Acre, está condenado a ser o mesmo, não se importando com o passar do tempo.

Acreditei que a atual direção fosse criar um jornal independente, um jornal ético, imparcial, algo destinado à educação, revelando a real situação dos professores e as contradições do governo. O Sinplac é obreiro.

Eu e minhas ilusões.

terça-feira, dezembro 28, 2010

Quando chegarmos...

à Região dos Lagos.

Em Maricá, Rio de Janeiro, as ondas e as areias - menos em Ponta Negra - exibem imagem selvagem.

Em certos trechos, sentimos o cheiro da solidão. Gosto de suas praias por ficar diante do deserto do mar e no deserto da praia.

Igual a uma igreja, o silêncio de Maricá é sagrado. Limpa-me.

Muitas vezes, nessas praias, juramos Amor Eterno, mas nem o mar é eterno. Nada se eterniza no que é humano. Se você me disser que Abelardo e Heloísa, que Romeu e Julieta e que Tristão e Isolda são eternos, digo-lhe apenas que esses casais nunca viveram juntos o peso das horas.

O movimento romântico do século 19 os idealizou porque a morte os separou antes do convívio, antes de surgirem os erros, as decepções. Eles podem até atravessar a moldura do tempo, mas isso ainda não é eterno, até o Deus do Novo Testamento não é igual ao Velho.

Eu te decepcionei, mas você também me decepcionou. Somos mortais. Nesses anos, des-cobrimos nossas falhas, e o eterno tornou-se menor. Talvez agora, quem sabe, o Amor dê sinais de vida nesse espaço menor, tamanho dos erros humanos.

Será que seremos capazes? Será que pulsa em nós tamanha força? Me responda quando as ondas de Maricá molharem nosso cansaço.
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No dia 30 de janeiro, retornarei a este blogue. Que em 31 de dezembro, à meia-noite, você erga um brinde à vida recomeçada.

terça-feira, dezembro 21, 2010

Tenho de ir!

Última postagem deste ano. Quando retornarei, ainda não sei. A única verdade é que tenho de me ausentar por um longo tempo. Silêncio.

Mas, antes, deixo a teus olhos os versos de um poeta que me fascina pelo vigor desobediente de sua inquieta juventude. A poesia chama-se "Minha boêmia".

Lá ia eu, de mãos nos bolsos descosidos;
Meu paletó também tornava-se ideal;
Sob o céu, Musa, eu fui teu súdito ideal,
Puxa vida! a sonhar amores destemidos!

O meu único par de calças tinha furos.
- Pequeno Polegar do sonho ao meu redor
Rimas espalho. Albergo-me à Usa Maior.
- Os meus astros no céu rangem frêmitos puros.

Sentado, eu os ouvia, à beira do caminho,
Nas noites de setembro, onde senti qual vinho
O orvalho a rorejar-me a fronte em comoção;

Onde, rimando em meio a imensidões fantásticas,
Eu tomava, qual lira, as botinas elásticas
E tangia um dos pés junto ao meu coração!

Aprecio esses versos por causa de sua vertiginosa liberdade ("Albergo-me à Ursa Maior"). Sob estrelas, hospeda-se. Esse é o maior bem de um ser humano, a liberdade. Mas quem pensa que ela significa fazer o que bem entende... engana-se.

Somos livres para haver o encontro, porque, se muitas vezes não sabemos explicar, pelo menos sentimos na pele que o outro nos liberta. Penso que a liberdade só possui esse sentido. Quando estamos sozinhos, estamos presos a nós mesmos, angustiados por grades que não vemos.

É o outro que nos oferta o gozo. Rimos porque estamos com alguém. Rir sozinho é loucura. Ausência de liberdade implica o que o Espírito não pode realizar, e uma das maiores realizações é se comover no momento de um encontro. Ser afetado. Afetar alguém.

Mas, depois, no final de tudo, estaremos sozinhos. A velhice virá. A dor brotará em nós. Não se negocia com a morte. No final, sempre perdemos nas esquinas solitárias, nas multidões que não nos enxergam.

No leito de um hospital, sempre perdemos os amigos. Em nossa própria casa, perderemos nossa mãe. No final, já disse, sozinhos ficaremos diante da tevê ou da tarde chuvosa.

Mas que o fim não nos desanime. Se a liberdade nos deu os encontros que agora pulsam em nós como boas lembranças, deixemos nos lábios a doçura do sorriso porque tudo, tudo mesmo, foi liberdade.

Para conhecer melhor o autor dos versos de "Minha boêmia", assista ao filme "Eclipse de uma paixão". Arthur Rimbaud fascina.

Agora, tenho de ir para o silêncio de minhas lembranças.

segunda-feira, dezembro 20, 2010

Muita calma nesta hora

"Professor, queremos informar ao senhor que em seu pagamento deste mês haverá uma quantia menor", telefonou uma funcionária da Secretaria de Educação.

"Quanto?"

"Não sabemos."

Na sexta, vi meu contracheque. A secretaria depositou menos R$ 670.

Feliz Natal!

quinta-feira, dezembro 16, 2010

O Deus que ofertei aos olhos teus

Havia teus seios erguidos. Havia tua bunda sorrindo. Havia tua vulva escondida. Havia tuas coxas indo...

Mas a felicidade de um encontro mais íntimo não habita em tuas partes "sem-vergonhas". Eu desejava tão somente me erguer acima de teus montes firmes, de teu ventre suado, de tua relva úmida.

Eu desejava tão somente contemplar a paisagem de teu rosto. Era teu rosto que eu desejava, porque nele, naquele momento de transe, eu fixei a verdade de meus olhos nos teus para dizer...

abençoada seja a vida, meus Deus, nesta hora em que meu gozo me salva da vulgaridade do mundo.

E, quando minha carne se alargou mais ainda sobre a tua, no momento-luz de meu libertário gemido, arregalei minha visão para, em meu êxtase, evocar o nome do meus Deus na cama.

Deve haver algo de Espírito Santo no orgasmo de quem se ama.

Aprendi contigo que o que menos importa na cama é o corpo. Era teu rosto que eu desejava para ofertar o meu Deus aos olhos teus.







quarta-feira, dezembro 15, 2010

"O Pequeno Príncipe"

Ficou tão fácil transar. As ofertas, muitas. Tantos corpos no mercado. A demanda, imensa. Nesses tempos de vulgaridade alegre, falta aquele ser humano único.

Ficou tão fácil transar. Difícil ficou “entrelaçar”. Ficou difícil “criar laços”.

Porque sempre estão à sua caça, ela foge dos humanos. Mas fugir aqui significa mais do que não ser apanhada; representa não ser tocada. Assim, para fugir, a caça despista os caçadores, engana-os. Mente para viver. Sua liberdade, portanto, é não se expor ao outro.

Até que...

"O Pequeno Príncipe" surge para ela. Inicia-se um dos mais belos diálogos para crianças, jovens e adultos.

- Tu não és ainda para mim senão um garoto inteiramente igual a cem mil outros garotos. E eu não tenho necessidade de ti. E tu também não tens necessidade de mim. Não passo a teus olhos de uma raposa igual a cem mil outras raposas. Mas, se tu me cativas, nós teremos necessidade um do outro. Serás para mim único no mundo. E eu serei para ti única no mundo...

Como ser único? de que forma ser para o outro o incomum? como não ser igual a cem mil outros?

- Minha vida é monótona. Eu caço as galinhas e os homens me caçam. Todas as galinhas se parecem e todos os homens se parecem também. E isso me incomoda um pouco", e a raposa dá a resposta definitiva. "Mas, se tu me cativas, minha vida será como que cheia de sol. Conhecerei um barulho de passos que será diferente dos outros. Os outros passos me fazem entrar debaixo da terra. Os teus me chamarão para fora da toca, como fossem música. E depois, olha! Vês, lá longe, os campos de trigo? Eu não como pão. O trigo para mim não vale nada. Os campos de trigo não me lembram coisa alguma. E isso é triste! Mas tu tens cabelos dourados. Então será maravilhoso quando me tiveres cativado. O trigo, que é dourado, fará com que eu me lembre de ti. E eu amarei o barulho do vento no trigo...

A única resposta dada pela raposa: cativar. Transar ficou tão fácil. Difícil é "criar laços", isto é, cativar, ser cativante.

Dessa forma, o Pequeno Príncipe, o ser que cativou, será, por causa de seu cabelo dourado, recordado quando a raposa olhar o campo de trigo.

Última...

Ontem, por meio da fotógrafa Talita, conheci as palavras do blogue "Confraria dos Últimos Românticos". Gostei. É uma juventude que sabe pensar. Em tempos de crise do romantismo, esse blogue escreve sua própria fragilidade.

Recomendo aos que não são vulgares.

terça-feira, dezembro 07, 2010

De volta ao futuro [da escola]

Ontem, ao colocar os pés na escola, alunos colocaram em mim seus afetos. Escola. Há 20 anos, dedico minhas palavras a ela como um sacerdote prega a palavra em uma igreja, só que eu sou uma comunhão entre o sagrado e o profano, a obediência e a desordem.

Hoje, após tantos anos, aprendi a contragosto que a igreja ensina mais [e pior] do que a escola. Se no templo o preconceito contra homossexuais é questão de fé, a escola não sabe educar para que o homossexualismo seja humanizado. Escola pública é lugar onde não se aprende.

Aprende-se na igreja. O fanatismo nos educa. A Bíblia é nosso único livro. Na escola, não se lê; só os pastores [ sem muita ilustração] leem e seduzem a massa de fiéis à ignorância.

A vida, que é absurdo, não passa de inutilidade. Somos como Sísifo: estamos condenados a carregar a pedra ao topo do monte para deixar a pedra rolar, para levá-la outra vez ao topo do monte.

A vida, tamanho de pedra, não tem sentido; Albert Camus, no entanto, nos ensina que, embora seja pedra, devemos dar a ela sentido. Quando levamos a pedra, nesse momento, devemos dar sentido ao nosso ato.

Por isso, recebo o afeto de meus alunos porque, nesses 20 anos, ainda consigo dar sentido à palavra que pulsa na sala de aula. Confesso, contudo, que minhas palavras andam cansadas de mim.

Elas querem ir embora de minha alma. Confesso que restam poucas forças para mantê-las em mim. Algumas partiram em uma noite fria, chovia. Outras se mataram com o punhal da descrença nos homens. Sinto que não posso salvá-las.

Sinto que, sem elas, morro aos poucos. Mas ainda tenho afetos de meus alunos. Afetos, palavra que ainda permanece viva, não foi embora.

Professor Josenir Calixto

Ontem, na Secretaria de Educação, eu soube que o atual diretor do ensino médio, professor Josenir Calixto, poderá lecionar em 2011 na escola Heloísa Mourão. Mais: poderá se candidatar a gestor da escola.

O que penso sobre isso?

Bem, se eu não cometer suicídio antes, se eu não pedir licença-prêmio antes, se eu não pedir afastamento sem ônus antes ou se eu não ir embora do Acre antes, o professor Josenir Calixto terá meu irrestrito apoio, e olha que eu consigo alguns votos.

Espero que ele venha.

domingo, novembro 28, 2010

O Rio que passa pelo Acre


O governo da Frente Popular importa umas boas merdas do Rio de Janeiro. A última bosta que boiará no rio Acre chama-se Latino; ele infectará o solo acriano com alienação.

De quem partiu a ideia de gastar dinheiro público com o excremento "Festa no Apê?"

Por que não contrataram O Rappa? Por que não contrataram Gabriel, o Pensador? Por que não contrataram o AfroRegge? Por que não contrataram Negra Ly? Por que não contrataram Túlio Dek? Por que não contrataram Marcelo D2? Por que não contrataram Fernandinha Abreu?

Será que nesta merda tem o dedo do Dudê?

Seja quem for do governo, eu penso que deveria morar no Rio de Janeiro durante uns meses para conhecer a autêntica música popular. Um pessoal alienado que está no governo deveria, primeiro, deixar de ser alienado para, depois, importar a boa cultura musical do Rio de Janeiro.

É uma gente deslumbrada com a Cidade Maravilhosa e que não entende porra nenhuma de cultura popular. Se gostam tanto de Latino, ouçam seus ruídos em suas casas. O povo do Acre merece algo melhor.

Uma dúvida: se o Acre exportou as belas e inteligentes letras do grupo Los Porongas, por que importar do Rio de Janeiro as fezes de Latino?

quinta-feira, novembro 25, 2010

Orai e vigiai... armado!

Nesses últimos dias, Jesus Cristo desarmado no Rio de Janeiro é inútil.

Só a fé não remove favelas e só as armas removem traficantes.

segunda-feira, novembro 22, 2010

Sobre tua face



De todas as montanhas,
De todas as planícies,
De todos os mares,

aqui, eu, nu sobre teu corpo,
instantes antes de meu gozo,
contemplo a mais bela paisagem:

teu rosto.

domingo, novembro 21, 2010

Jormais retalhados

1)
Entre todos os estados, o Acre fica na terceira posição como o mais dependente do Fundo de Participação dos Estados, o FPE.

O primeiro é Amapá (60,9%). O segundo, Roraima (57,9%). O Acre fica com 52,6% de dependência, ou seja, de cada R$ 100 das receitas do estado, R$ 52,6 são do FPE.

Hoje, 85% do fundo destinam-se às regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste. A Constituição de 1988 determina que 21,5% da receita do IR e IPI sejam repassados aos estados.

O governo da Frente Popular estima que os cortes do FPE atingiram R$ 400 milhões nos últimos quatro anos, sendo R$ 200 milhões só em 20010.

2)
Hoje, Ferreira Gullar, poeta, escreveu em "O Globo" que não aceita na arte o vale-tudo. Literatura é arte, isto é, nem todos são escritores. No final, ele afirma: "As pessoas são iguais em direito, mas não em qualidades."

3)
Temos uma noção errada de elite. Pois bem, essa elite ameaça o futuro do governo de Dilma Rousseff com greve. Alega-se baixo salário. O salário dessa elite gira em torno de R$ 12,7 mil.

Boa parte desse pessoal está entre os 5% mais ricos do país. O nome dessa elite? Servidores da Justiça.

4)
Em São Paulo, sindicalistas desviam dinheiro de contratos de planos de saúde da categoria. No Acre, Sinplac e Sinteac não realizam auditorias em suas contas. Não sei o que fazem com o meu dinheiro.

sexta-feira, novembro 19, 2010

Deuses negros


Ao dia da Consciência Negra, ofereço minhas palavras.

Bendita seja a cor negra de deuses que dançam, cantam e riem. Se no passado o deus dos brancos chicoteava a carne negra na senzala com a verdade bíblica, bendita seja hoje a cor de teus antepassados que não leram a Tábua de Moisés.

Os terreiros são mais alegres que as igrejas.

Se não havia o corpo de Cristo como hóstia, havia o tronco. Se não havia o sangue de Cristo como vinho, havia o suor da escravidão.

Se não havia sermão, havia gemido. Se não havia castiçal, havia grilhões. Se não havia missa, havia macumba. Se não havia Jesus, havia orixás.

Se não havia o perdão, havia o negro a cantar e a bailar.

Os terreiros são mais alegres que as igrejas.

quinta-feira, novembro 18, 2010

Uma [re]vista do que somos

O professor-doutor Carlos Alberto (foto), diretor das Faculdades Euclides da Cunha, idealizou a revista "Visões Amazônicas". Mas não existe só a idealização. "Visões Amazônicas" tem capital para sua independência.

A maioria de suas páginas, porém, carece ainda de palavras porque as pessoas não escrevem. Há mais de três meses, eu enviei a um professor universitário quatro questões e, até o momento, não li as respostas.

Temos independência e verba, mas não temos autores para escreverem seus artigos, suas matérias, suas monografias.

Colocar em páginas palavras questionadoras e inquietantes sobre o Acre, longe do lugar comum dos políticos e da padronização jornalística local, por isso uma [re]vista do que somos nesta parte da maior floresta do mundo, por isso "Visões Amazônicas".

Quantas monografias de recém-formados, quantas dissertações de mestres e quantas teses de doutores permanecem sepultadas em bibliotecas nunca visitadas pela maioria da população? Quantos saberes sobre o Acre conservam-se em páginas jamais lidas por uma gente simples?

As Faculdades Euclides da Cunha acreditam que monografias, dissertações e teses possam se transformar - sem que percam a qualidade - em textos simples para que sejam lidos por mais pessoas em vários locais da cidade, porque esse saber não pode ser demarcado somente pelas paredes de bibliotecas. Esse saber precisa estar também em consultórios médicos e dentários, em salões de beleza, em grades de supermercados, em clínicas de estética, em comércios da periferia.

Além de uma produção acadêmica adequada a uma revista popular, "Visões Amazônicas" edita textos jornalísticos desobedientes a padrões anacrônicos, por exemplo, página policial e entrevista. A página policial não tem o direito de marginalizar indivíduos conforme o boletim de ocorrência da delegacia. O repórter de "Visões" precisa transcender os fatos a ponto de inverter, por meio de investigação, a relação de valores entre marginal e autoridade. No caso da entrevista, o entrevistador da revista não pode manter um monólogo com o entrevistado. Um jornalismo comprometido, portanto, não com a verdade do senso comum, mas capaz de revelar a mentira que há por trás dessa verdade.

No Acre, precisamos de ideias, de outras falas. Precisamos de visões.

Resposta a Josafá

Meu amigo, se você estivesse no Rio de Janeiro durante um mês lendo jornal, teus olhinhos, que não são azuis, ficariam arregalados com as informações. Hoje, houve tiroteio na avenida Rio Branco, detalhe, em plena luz do dia. O PM morreu no local. Um pedestre foi mantido como escudo. O marginal foi executado por outros PM.

A Cidade Maravilhosa não é lugar para trabalhar, tudo aqui cheira a engarrafamento. Outra: quando comparam a violência em Rio Branco à do Rio de Janeiro, eu rio, eu rio, eu rio.

Claro que o Acre tem seu lado ruim, por exemplo, ausência de um bom cinema com filmes autorais, teatro fora do circuito nacional e pagamento em 20 vezes nas Casas Bahia; mas, para trabalhar, eu gosto muito, porque não há engarrafamento, meu deslocamento ainda é rápido.

Também não espero que as coisas melhorem mais ainda no Acre, faço minhas críticas neste blogue sem esperança de ver uma Frente Popular menos burra, de ver um PT menos viciado pelo poder. Na vida, Josafá, não existe esperança, só existe a morte, o fim de todas as esperanças.

A minha vida no meu Acre é tranquila, calma. O Rio, há muito tempo, deixou de ter paz. O Cristo Redentor, meu amigo, se não for cínico, é indiferente. Além disso, mesmo com o custo de vida mais caro no Acre, professor na terra de Galvez recebe melhor.

Agora você me dá licença, porque uma bala perdida atingiu minha fé nos homens.





domingo, novembro 14, 2010

O tempo, as compras, Mony e as notícias

Região dos Lagos, Rio de Janeiro. Chove em Maricá. Pela manhã, comprei os jornais "O Globo" e "Folha de São Paulo", tudo por R$ 8.

No Acre, não há "O Globo", e "Folha de São Paulo" custa aos domingos R$ 7. Tudo é mais caro.

Ontem, comprei verduras e fruta para a minha amorosa mãe. Pela "Folha de São Paulo", adicionei à minha biblioteca "O Livro Vermelho", de Mao Tsé-Tung.

No dia 24, meu pai irá ao médico para saber o grau da vista direita.

Hoje, mais uma vez, almoçamos em paz. Meu irmão, à esquerda; e minha amada esposa, Mony, à direita. Na cabeceira, meu pai; diante de mim, Dilma, o espírito da casa. Depois das conversas, eu e Mony fomos dormir.

Às 17 horas, fomos assistir na sala ao belíssimo filme "O escafandro e a borboleta", do diretor Julian Schnabel, premiado em Cannes, em 2007. Filmes devem provocar a inteligência e sensibilizar, por isso essa película de Julian.

Amar também significa (com-par)tilhar momentos agradáveis à alma, por exemplo, filmes. Mony é este amor eterno com quem divido meu destino. Aprendemos o sabor de viver quando assistimos a filmes que educam.

Nesses quase seis anos de amor-paixão-amizade, muitos são os filmes.

Também dividimos as leituras de jornais. Destaco algumas:

A Frente Popular deveria aprender com o PMDB

1) No Rio de Janeiro, capital, a Unidade de Polícia Pacificadora não se compara ao que o PT acriano pensa sobre segurança pública. Na terra do Cristo Redentor, segurança não se limita a policiais.

Uma união entre governo, empresários e população tem transformado a realidade social das favelas. No jornal "O Dia" de hoje, uma foto destaca um PM tocando violão com jovens, isso quer dizer que policiais militares promovem encontros culturais.

Trata-se do projeto "Vozes & Acordes", com aulas gratuitas sob a batuta do soldado Fausto Oliveira da Cunha. No Acre, o PT, com uma concepção de segurança pública pífia, até hoje, após 12 anos, ignora a relação entre cultura e quartel.

O PT acriano é atrasado porque ainda pensa que segurança é caso de polícia.

Doze anos de pobreza

2) Leio na "Folha de São Paulo" que o Acre é um dos estados da Região Norte que mais precisam de dinheiro para acabar com a miséria. Ocupa a segunda posição. Por cada acriano, são R$ 9,55 por mês para a terra de Galvez e R$ 9,63 para o Amapá.

Será que as pensões dos ex-governadores ajudariam?

No Norte, temos 1,4 milhão de indigentes (renda familiar per capita de R$ 70) e 2,3 milhões de pobres (renda familiar per capita de R$ 140).

sexta-feira, novembro 12, 2010

Uma troca literária entre dois professores

Gleyson Moura, professor da escola estadual Leôncio Carvalho, realiza um projeto literário nesse espaço escolar, em Rio Branco, Acre. Ele pediu para eu comentar sobre o projeto depois de ler a matéria no sítio ac24horas. Li e questionei o projeto.

Depois, meu colega de profissão enviou algumas apreciações. Vamos a elas com meus comentários.

Há tanto por dizer que nem sei se caberá nesse espaço. Vamos, então, ao bom e velho sistema de enumeração.

1. Sempre gostei de um bom debate sobre literatura. Respeito as suas idéias e inteligência, por isso as provocações;

Gosto muito de uma boa provocação para que, neste caso, a realidade literária na escola seja repensada.

2. Concordo que o grau de teorização sobre literatura em nossas escolas é muito baixo, existem degraus pelos quais é preciso ascender. Mas, para isso, é necessário pensar estratégias que desenvolvam nos alunos o gosto pelo texto literário. Trazer para a sala de aula pessoas apaixonadas por literatura para compartilhar conosco dessa paixão, falar sobre seus textos (consagrados ou não), suas relações com nosso espaço vivido e sobre o processo de composição, pareceu-me uma boa estratégia. É um começo.

A leitura na escola acriana inexiste, professor não lê para seus alunos. Há anos, desde quando lecionava no Rio de Janeiro, de 1990 a 1992, eu lia bons romances para meus alunos. Após 20 anos de sala de aula, aprimorei minha forma de lecionar literatura. Hoje, realizo uma comunhão entre ótimos filmes e ótimos textos literários. E para isso, Gleyson, não basta só a paixão, é fundamental uma sólida e flexível base teórica.

Toinho Alves e outros que se acham escritores podem ser apaixonados, mas isso não basta, é pouco. Sem leitura de autores básicos, como Roland Barthes, Blanchot, Iser, Deleuze, Antônio Cândido, Anazildo Vasconcelos, Luís Costa Lima e outros, a paixão é vazia.

Imagine Toinho falar sobre medicina ou direito, imaginou? Se ele não está credenciado para falar sobre direito, por que estaria para literatura?

Outra questão. Para aluno apreciar a leitura, alguém deve ler para ele, é preciso haver uma referência. Para muitas classes sociais, a única referência como leitor é o pastor da igreja. Além de o professor ler em sala, em uma lugar adequado, ele deve partir de alguma escolas ou escolas literárias para manter sua interpretação.

Na escola Heloísa Mourão Marques, eu leio no auditório, onde existe o conforto do silêncio. Se desejamos despertar nos alunos paixão por leitura, por exemplo, ficcional, a escola deve exercitar a leitura em sala, e não alguns escolhidos de forma não muito criteriosa falarem sem base teórica sobre literatura.

Por que a Secretaria de Educação não realiza seminário entre autores consagrados e alunos? Toinho Alves faz parte do poder, é amigo do poder, ele poderia viabilizar isso, mas... Agora entenda: realizar encontros bienais.

3. Nesse ponto, pergunte aos seus alunos o que eles pensam a esse respeito.

Posso saber o que pensam, mas eu queria que a SEE possibilitasse escritores nacionais na escolas públicas. Construir viadutos custa mais caro.

4. Aliás, se estiver na cidade, gostaria de contar com sua participação, em nosso projeto, como avaliador, entre outros avaliadores que estou convocando (data provável em 06 de dezembro, ainda por definir); Senão, como visitante. Também gostaria de levar dois ou três grupos para apresentar para os seus alunos, como uma forma de treino;

Olha, deveria entrar, na avaliação escolar, apresentação de filmes relacionados à literatura. Depois, debates entre alunos e professores. A escola poderia ser um espaço para o cinema-livro. Quanto à minha participação, não sou o mais indicado. Quanto a meus alunos receberem algum grupo, tudo bem.

5. Obviamente, uma interpretação subjetiva deve ser apoiada por argumentos que a comprovem, e isso não tem deixado de acontecer no projeto que estou ajudando a coordenar;

Você diz mas creio que tais não têm base teórica. Li o que Toinho Alves fala de poesia, e eu só lamento.

6. Não se trata de nivelar ou de banalizar a literatura. Trata-se da fruição do texto literário, independente do autor pertencer ou não à grande literatura. Como disse Octávio Paz, "as redes de pescar palavras são feitas de palavras.";

Só pesca bem quem sabe pescar. Precisamos pescar, primeiro, teóricos literários para depois fisgar as palavras corretas, adequadas, apropriadas.

7. É necessário primeiramente conhecer o texto, para só então poder-se avaliar seu mérito ou desmérito. Seu valor literário independe da maneira como foi publicado;

É preciso haver o reconhecimento nacional para colocar tais autores no currículo escolar. Para eu conhecer o Acre, não preciso de pseudoescritores acrianos; posso entender o Acre por meio de Mário de Andrade, de Ariano Suassuna, de Milton Hatoum.

8. Sobre Gilles Deleuze, ainda estou lendo "A ilha deserta". depois falaremos sobre isso;

Não li "A ilha deserta". Sobre literatura, li alguns livros dele, por exemplo, "Proust e os signos".

9. Por fim, concluo que está na hora de ter o meu próprio blogue e parar de ocupar tanto espaço nos blogue dos outros.

Nada disso. Penso ser muito bom você colocar suas experiências profissionais. Quando ele estiver pronto, me avise para eu colocar no meu blogue.

Depois de minhas críticas, saiba que penso ser positiva a sua ideia. Discordo, mas respeito muito a sua iniciativa. Embora Toinho Alves não seja a pessoa mais indicada para falar de literatura para alunos, ainda sim, é válido.

quinta-feira, novembro 11, 2010

Meu colega de profissão Gleyson Moura (2),

não deixe que teus olhos leiam minhas palavras com (anti)patia, porque ideias devem estar muito acima de nomes. Recortarei teu texto e, uma vez assim, colocarei minhas apreciações.

"Na verdade, Toinho Alves não afirmou que Carlos Drummond de Andrade é romântico. Se assim pareceu, isso se deve a uma falha de redação do jornalista que publicou a matéria. Mesmo que tivesse afirmado isso, seria uma interpretação pessoal, subjetiva (o que também interessa ao projeto)."

Se eu admitir teu pensamento, um aluno poderá afirmar que Castro Alves é realista porque prevalece a interpretação pessoal. Ora, para interpretar, para criar um discurso, o falante deve dominar categorias analíticas ou conceitos. Se afirmo que Castro Alves é romântico, eu tenho de dominar os conceitos que habitam sua poesia.

Quero dizer com isso que não existe "interpretação pessoal", mas busca, por exemplo, por conceitos. Evidente que Drummond não é romântico; ele pode ser também romântico em uma poesia. Na escola, professores e livros didáticos afirmam que Olavo Bilac é poeta parnasiano. No entanto, já li poesia de Bilac com toda densidade romântica.

Gleyson, a interpretação precisa de base teórica. Existem estudos antes de minha opinião vazia sobre Carlos Drummond de Andrade.

Sobre o conceito "subjetivo", não pense que essa categoria significa o falante estar separado do conceito "universal". Oposta ao parnasianismo, a escola romântica é subjetiva, mas sua subjetividade cria uma ponte para o universal.

"Para alguém que defende o espírito livre e a subjetividade, você parece muito preso aos cânones da 'Grande Literatura'."

Espírito livre não quer dizer a afirmação do meu eu como se eu fosse um ser desagregado. Sou livre e subjetivo para buscar conceitos universais. Sim, defendo os clássicos na escola pública. Entre a escritora Clarice Lispector e o alfabetizado Alan Rick, meu aluno, para o bem de sua alma, deve ler Clarice Lispector. Entre o alfabetizado Toinho Alves e o escritor Raduan Nassar, meu aluno deve ler "Lavoura Arcaica".

Não sou simpático à ideia de que tudo se nivela, de que tudo é literário. Não é. Raduan Nassar é consagrado pelos críticos nacionais e internacionais. Até o relativismo tem seu limite. Literatura não é vale-tudo.

"Penso que a literatura é algo de todos, do cotidiano, de todos os lugares, a cada instante; deste lado da vida 'que amávamos com uma paixão insaciável que o senhor não se atreveu nem sequer a imaginar, com medo de saber o que nós estávamos fartos de saber que era árdua e efémera, mas que não havia outra, senhor general, porque nós sabíamos quem éramos'. (Gabriel García Márquez, O Outono do Patriarca). Agora, uma pergunta: Qual a sua concepção de literatura, professor?"

Eu tenho leituras ao logo de minha vida. E saiba: não li o suficiente. Meu limite me envergonha. Minha concepção parte de autores consagrados, eles me ensinam - Deleuze, um deles; outro, Blanchot; mais, Barthes.

O livro "Proust e os signos", de Gilles Deleuze, defende uma concepção de literatura que me seduz por sua fina inteligência. Minha concepção de literatura encontra-se em Virgínia Woff, Oscar Wide, Clarice Lispector, Raduan Nassar, Rimbaud, Mallarmé, Cruz e Sousa, Ariano Suassuna.

Não o li ainda, mas Proust é outro.

Publicar [com dinheiro público] um ou dois, ou três, ou quatro, cinco livros no Acre não justifica eu dizer que sou escritor ou poeta. A arte exige mérito, e não amigos do poder.

quarta-feira, novembro 10, 2010

Meu colega de profissão Gleyson Moura,

você pediu para eu comentar sobre o projeto de literatura da escola pública Leôncio de Carvalho. Pois bem, estou aqui para não ser simpático. Como início, destaco o texto do sítio www.ac24horas.com:

"Talvez o grande problema de ensinar a literatura na escola esteja na garantia dos alunos conhecerem as obras literárias. Para vencer esse desafio, uma iniciativa dinâmica, liderada pelo professor de Língua Portuguesa, Gleisson Moura, trouxe para sala de aula, escritores como Mauro Modesto, Antônio Alves e Nilda Dantas."

Como o grande problema de ensinar literatura na escola é garantir aos alunos leitura de obras literárias, o projeto da escola traz escritores como Antônio Alves, Modesto de Abreu e Nilda Dantas.


Mais abaixo, leio "os escritores Alan Rick e Silvio Martinello. A proposta é trazer para a sala de aula, além da literatura universal, as experiências dos autores acreanos, suas formas de pensar, escrever e observar o mundo. Foi nesse contexto que o escritor e jornalista Antonio Alves [o Toinho] viajou, falando da literatura romântica de Érico Veríssimo, Carlos Drumond de Andrade e ouvindo seus próprios textos, escritos no blog Tempo Algum".

Além de Alan Rick ser escritor, além de Silvio Martinello ser escritor, Toinho afirmou que Carlos Drummond de Andrade é romântico. Aí você pede para eu comentar sobre esse projeto.

Devo ser simpático?

Mais tarde, quem sabe, escreverei sobre essa "literatura" em sua escola. Agora, o que tenho a dizer é que esse projeto merece um boletim de ocorrência. Não se trata de literatura. Trata-se de um crime contra a literatura. Esse projeto é caso de polícia.